O povo ficou feliz
Se Karl Marx fosse vivo, aposto que depressa trocaria a religião pelo futebol – O futebol é o ópio do povo! Talvez a religião e o futebol se toquem. Doses suficientes de fanatismo ou paixão não lhes faltam. Mas se a religião tem bastantes atributos, a começar pelo trabalho desenvolvido nos países pobres, já o futebol tem o atributo de nos meter à volta de uma mesa, regados com tinto e lambidos com entrecosto.
Tudo o resto é negócio, do pior, irracionalidade, pancadaria, very-lights e enxames de políticos submissos. Tenho consciência, caro leitor, que estou a exagerar um pouco. Irracionalidade qb também nos sossega a alma e faz desopilar o fígado. Já políticos submissos vivemos bem sem eles. Vou ao futebol à paisana. Sem bandeira nem cachecol. Apesar de achar que não é necessário puxar muito pela massa encefálica para estabelecer o 4x3x3, gosto de saltar que nem uma mola quando o esférico bate nas malhas. Também gosto de vez em quando de rebaptizar o árbitro.
Acompanhei o Euro 2020 realizado em 2021. Portugal não era o meu favorito. Não gosto de uma equipa que tem o Cristiano Ronaldo e mais dez. A Dinamarca encheu-me as medidas. Pelo círculo construído por verdadeiros camaradas na hora de estabilizar o coração de Christian Eriksen, e bolas, jogavam como ninguém a lembrar o ano de 1992 quando passaram de patinhos feios a campeões europeus. Eles sim, para mim são os campeões.
Mas acabou. O troféu Henri Delaunay sentiu as mãos e o peito dos italianos. Na arena de Wembley uns choraram outros riram. Outros fizeram contas à vida. Mario Draghi esfregou as mãos de contente. O povo vai-se distrair por uns tempos. Regados com Bellini e lambidos com carbonara, o povo, as praças e as ruas encheram-se de gritos, de abraços e de gotículas voadoras. Prognósticos só no fim do jogo. A pandemia segue dentro de momentos. É a vida e o povo ficou feliz.