Marcos Foz: um OVNI na poesia portuguesa

Não se dirá aqui que a poesia portuguesa é isto ou aquilo. Todos os diagnósticos são inconstantes e provisórios. Dir-se-á antes que Vaca Preta, de Marcos Foz, é um objecto voador não (antes) identificado. Talvez lhe faça justiça uma apreciação tão simplista, talvez seja dizer quase nada. Porque um livro marcante, como este, existe, possivelmente, para que ninguém tenha sobre ele a palavra derradeira. É um objecto intransitivo — qualquer acrescento pode considerar-se indesejável ou desnecessário.

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Há um conselho clássico: não publicar antes dos 30 anos. Não foram poucos os que o sugeriram, como André Gide. Marcos Foz (1994) ignorou esse preceito e publicou Arca e Usura (Ed. Autor, 2019) antes dos 25 anos. Regressa com Vaca Preta, e ainda não cumpriu 27. Mande-se o axioma pré-30 para o lixo, por uma vez (?), e saúde-se o regresso em (enorme) força de um poeta de 26 anos e a publicação de um livro que desfaz para construir, que ergue para encontrar uma nova forma de arquitectura do texto poético. Marcos Foz optou, no seu segundo livro de poesia, por construir um volume que começa, numa breve sequência, com um conjunto de versos dispostos de forma canónica e que, inclusive, nos recordam Arca e Usura — mas depois nada será igual. A prosa substitui a poesia (salvo num escasso retorno, quase a encerrar Vaca Preta), e dentro daquela as modalidades expandem-se, por abarcarem o memorialismo, que o não é em sentido estrito; a narrativa, que impossibilita a concreção absoluta de um registo ficcional que estabilize aí mesmo; o ensaio, que é uma provocação ao género, à pose, aos tiques e às brechas dessa investida da escrita. Uma revoada de géneros, portanto? Em parte, sim, mas não completamente. E, por certo, não será essa acção a principal desta escrita. Tudo poderá servir para uma tentativa de compreensão do fenómeno poético, para complementar o exercício da poesia com os referentes que o alimentam, as construções paralelas que ela alimenta, os discursos, afins ou remotos.

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