Afeganistão 20 anos depois – um imenso mar de desgraças
As autoridades governamentais do Afeganistão que assentavam a sua estabilidade na presença militar dos EUA e da NATO estão agora na mira dos taliban. É caso para perguntar: foi para isto que se fizeram estas guerras?
Foi recentemente anunciada a retirada das tropas dos EUA do Afeganistão, quase vinte depois de terem iniciado a guerra (outubro de 2001) sob o comando de George W. Bush, após os ataques terroristas de 11 de Setembro de 2001.
Vinte anos é tempo suficiente para saber o que resultou desta guerra. Antes de mais cabe perguntar - a tal estrondosa vitória na ocasião sobre o terrorismo como se reflete hoje naquele país?
Os EUA derrubaram o poder dos taliban, alegadamente expulsando a Al Qaeda do país, mas a retirada das suas tropas daquele país foi negociada com os taliban... os derrotados há 20 anos.
As autoridades governamentais do Afeganistão que assentavam a sua estabilidade na presença militar dos EUA e da NATO estão agora na mira dos taliban, como se pode constatar pelos seus ataques no Norte do país e fuga das tropas governamentais para o Tajiquistão.
Os talibans, uma organização que contou sempre com o apoio do Paquistão, cujos interesses naquele país vêm de longe, foram aliados especiais dos EUA que os apoiaram até com armamento sofisticado como os célebres mísseis Stinger na guerra contra a invasão soviética.
Barack Obama e Donald Trump negociaram continuamente ao longo destes anos com os talibans para encontrar saídas do atoleiro em que se envolveram tal como no passado ingleses e soviéticos.
O mais curioso é que tudo leva a crer que fizeram uma guerra que causou muitas dezenas de milhares de mortos entre militares e civis, aumentou assustadoramente a miséria e a fome no país, fragmentou ainda mais as diversas etnias, para voltar a colocar no poder os talibans. As negociações que conduziram à saída dos soviéticos foram apresentados como uma vitória das forças que iriam fazer a transição para a democracia, a qual foi interrompida pela vitória militar dos taliban e imposição de um regime fascista clerical terrorista escudado numa interpretação do Islão completamente retrógrada, medieval e brutal.
A invasão somou horrores ao horror, logo seguida da do Iraque (2003). As duas guerras causaram centenas de milhares de mortos, milhões de refugiados, acrescentaram miséria e transformaram aqueles países em viveiros de guerras sectárias.
A lei das tribos substitui a dos Estados e das nações e os interesses étnicos voltaram a sobrepor-se a todos os demais.
O Afeganistão, tudo leva crer, aproxima-se de um novo banho dos fundamentalistas contra as populações e da imposição do terror contra os direitos democráticos. É caso para perguntar: foi para isto que se fizeram estas guerras? O mundo ficou bem pior do que estava antes destas invasões. Os arquitetos destas loucuras vão desaparecendo de acordo com as leis da vida e da morte e ninguém lhes pedirá contas.
Joe Biden quer festejar o dia da Independência e não ouvir falar de coisas tristes. Tudo certo. Mas quem fabricou toda aquele imenso mar de tristeza, miséria e morte?
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico