Lone Star recusa divulgação pública dos contratos de venda do Novo Banco
Tirando “aspectos de natureza comercial confidenciais”, o “contrato, do lado de Portugal, podia ser conhecido”, reagiu hoje Vitor Constâncio na audição parlamentar
A Nani Holdings, accionista do Novo Banco ligada à Lone Star, recusou esta sexta-feira a divulgação pública dos contratos de venda e de capitalização contingente relativos ao banco, de acordo com carta enviada ao parlamento.
Numa missiva enviada à comissão parlamentar de inquérito sobre o Novo Banco, a que a Lusa teve acesso, a Nani Holdings “lamenta informar que não pode conceder o pedido de levantamento de confidencialidade solicitada, e que os contratos permanecerão confidenciais e serão tratados como confidenciais”.
O pedido de levantamento da confidencialidade, respeitando restrições relativas ao nome de devedores do Novo Banco e a matérias de segredo comercial, tinha sido feito pelo grupo parlamentar do PSD.
Após o surgimento da resposta do accionista detentor de 75% do Novo Banco, o deputado do PSD Alberto Fonseca, durante a audição parlamentar ao antigo governador do Banco de Portugal Vítor Constâncio, considerou a postura da Nani Holdings como “profundamente lamentável”.
Alberto Fonseca aproveitou a ocasião para questionar Vítor Constâncio sobre se não entende que o contrato deve ser tornado público.
“Admito que haja sempre aspectos de natureza comercial confidenciais, reflectidos no contrato, que devam ser riscados”, disse o também antigo vice-presidente do Banco Central Europeu.
“Tirando esse aspecto, acho que o contrato, do lado de Portugal, podia ser conhecido”, aditou.
Alberto Fonseca afirmou que “a Nani Holdings prefere continuar a manter este regime de opacidade e de desconsideração pelos portugueses, o que só vem aumentar ainda mais a desconfiança dos portugueses neste negócio de venda”.
O deputado disse também que o partido não vai “desistir desta divulgação”, que entende como “mais do que legítima, até porque o PSD tem um projecto de lei que obriga à divulgação dos contratos que já foi aprovado na generalidade”.
BdP usou “persuasão moral” em 2009 face à exposição ao GES
No parlamento durante a manhã desta sexta-feira, o antigo governador do Banco de Portugal disse que o supervisor actuou em 2009 face à exposição da holding financeira do GES à parte não financeira, usando “persuasão moral”.
“Em Janeiro de 2009, indo além do que estava na lei e usando a persuasão moral – instrumento de último recurso dos bancos centrais – o Banco de Portugal escreveu uma carta à Espírito Santo Financial Group [ESFG], estabelecendo e solicitando um plano de redução das exposições [à parte não financeira] com vista a assegurar inexistência de qualquer excesso até final de 2012”, disse Vítor Constâncio no parlamento.
O também antigo vice-presidente do Banco Central Europeu (BCE) respondia ao deputado Duarte Alves (PCP) em audição na Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao Fundo de Resolução.
O antigo governador foi também questionado por Cecília Meireles acerca do mesmo tema, tendo referido que o supervisor seguiu os procedimentos legais e até “actuou além do que estava na lei” em 2009.
Vítor Constâncio tinha anteriormente explicado que nos anos anteriores à crise financeira de 2008, apesar do constante aumento de exposição da parte financeira à não financeira do Grupo Espírito Santo (GES), esta era legal e constantemente coberta com capital.
“Qualquer excesso – era um direito estabelecido por força da lei – que os bancos podiam usar, qualquer excesso em relação aos 20%, era abatido ao capital. E o resto do capital só se podia abater até ao rácio de capital ficar no mínimo legal”, explicou.
Segundo Vítor Constâncio, a ESFG “nunca esteve abaixo dos 8%”, tirando num trimestre em que esteve nos 7,74%, valor que foi corrigido.
“Devo dizer que durante todo o período em que fui governador [do BdP] nunca me foi chamado à atenção, com significado, que havia, por essa razão, problema com esta exposição, uma vez que a lei era clara, e por força da lei esse abatimento era feito e dada uma protecção de 100% sobre eventuais perdas em relação a esse excesso”, detalhou.
Vítor Constâncio salientou ainda que a exposição nunca existiu no BES, mas sim na holding ESFG.
“Tudo mudou em 2008, e esse excesso teve um aumento significativo no ano da crise, que atingiu o tipo de actividades não financeiras do grupo: construção, hotéis... tudo o que o grupo tinha em termos de real estate [imobiliário]”, lembrou.
Posteriormente, e apesar de algum alívio temporário do cumprimento de regras devido ao contexto de crise, o BdP comunicou em 2009 à ESFG a necessidade de reduzir a exposição à parte não financeira.