O general de Bolsonaro na Saúde vai enfrentar a prova de fogo da CPI
O depoimento de Eduardo Pazuello, que passou dez meses à frente do Ministério da Saúde, é uma peça crucial para os senadores que investigam a conduta do Governo durante a pandemia.
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado brasileiro que está a apertar o cerco ao Governo, expondo a má-gestão do combate à pandemia da covid-19, vai receber esta quarta-feira um dos depoimentos mais relevantes. Mas, mais do que o que o ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, possa dizer aos senadores, serão os seus silêncios que vão ser seguidos de forma atenta.
O Palácio do Planalto fez de tudo um pouco para evitar que Pazuello marcasse presença perante a CPI. Inicialmente, estava agendado que o general fosse ouvido na primeira semana dos trabalhos da comissão, quando também foram ouvidos os seus antecessores na pasta da Saúde. No entanto, Pazuello pediu um adiamento, alegando que manteve contactos com duas pessoas infectadas com a covid-19 e, por isso, deveria ficar em quarentena.
O adiamento permitiu que Pazuello procurasse uma forma de evitar ser chamado a depor. A imprensa brasileira dava conta de um processo muito árduo de preparação do general e relata sessões de media training, em que eram ensaiadas as perguntas e as respostas à comissão, que acabavam com o general em pânico.
Sem poder contrariar a competência da CPI de convocar as testemunhas que desejar, o Planalto mudou de táctica. Foi accionada a Advocacia-Geral da União – um órgão de defesa jurídica do Governo federal – para apresentar um pedido de habeas corpus junto do Supremo Tribunal Federal para que Pazuello pudesse permanecer em silêncio durante o depoimento.
O juiz Ricardo Lewandowski deu razão ao pedido, mas apenas parcialmente: Pazuello poderá negar-se a responder apenas a perguntas que possam servir para o incriminar pessoalmente, mas terá de responder a todas as outras – se mentir poderá ser acusado de perjúrio e ser preso.
A decisão de Lewandowski faz uma ressalva importante, uma vez que o ex-ministro está a ser investigado formalmente pelo seu papel na gestão da crise que levou ao colapso do sistema de fornecimento de oxigénio em Manaus, no início do ano. Em causa, está a hipótese de Pazuello, que era então ministro, ter sabido de antemão da escassez de oxigénio nos hospitais do Amazonas e nada ter feito.
Pazuello assumiu o Ministério da Saúde há cerca de um ano, depois da passagem relâmpago de Nelson Teich pelo cargo. Inicialmente, o general do Exército – sem qualquer formação clínica – foi apresentado como uma solução interina, mas acabou por manter-se como ministro durante dez meses, batendo o recorde de longevidade num cargo marcado pela instabilidade ao longo da pandemia.
Como tal, os senadores que compõem a CPI olham para o testemunho de Pazuello como crucial para traçar a conduta do Governo em alguns dos momentos mais decisivos da expansão da pandemia e dos esforços de vacinação. Ao contrário dos seus antecessores, Pazuello nunca pôs em causa a fórmula de Bolsonaro para enfrentar a pandemia, rejeitando medidas de confinamento ou de paralisação das actividades económicas, e mostrando-se como um defensor da prescrição de medicamentos para tratar a covid-19, como a hidroxicloroquina.
Um dos pontos que os senadores pretendem abordar será precisamente a expansão dos esforços do Ministério da Saúde durante o mandato de Pazuello no fabrico e fornecimento desta substância pelo país.
Uma segunda linha de análise da CPI tem sido a averiguação do papel do Governo na aquisição de vacinas contra a covid-19. Na semana passada, o ex-director da Pfizer no Brasil confirmou que foram feitas várias propostas para a compra de milhões de doses desde Agosto de 2020 que foram ignoradas por Brasília, numa altura em que Pazuello estava à frente do Ministério da Saúde.
Na véspera de uma jornada que se espera tensa, o advogado de Pazuello dizia que o ex-ministro estava “pronto” para o depoimento e dedicou o dia “ao descanso da mente e do corpo”.