Polícia multado em 84 euros por se recusar a lavar carro-patrulha
Hierarquia diz que violou o dever de aprumo e de obediência. Processo disciplinar continuou a decorrer durante período de suspensão dos prazos judiciais – uma violação da lei, diz o Sindicato Nacional da Polícia.
Um polícia que pertence ao comando distrital de Castelo Branco foi multado em 83,78 euros pela PSP por se ter recusado a lavar o carro-patrulha. A hierarquia diz que violou o dever de aprumo e de obediência.
A situação está a mobilizar o Sindicato Nacional da Polícia (Sinapol), até por o processo disciplinar ter continuado a decorrer enquanto estavam suspensos os prazos judiciais e similares. “Os polícias não são lavadores de automóveis”, insurge-se o presidente do sindicato, Armando Ferreira, acrescentando que a lavagem de viaturas não faz parte do conteúdo funcional destes profissionais. O mesmo dirigente sindical admite, porém, que se trata de uma prática há muito instalada na PSP, muito embora a polícia também recorra, em menor escala, à contratação de empresas de limpeza para o efeito. A lavagem tanto é feita por polícias como por civis.
“Aos comandantes da PSP também não é pedido para varrerem e lavarem os seus gabinetes”, compara Armando Ferreira. O Sinapol pondera agora a apresentação de uma queixa-crime contra a direcção nacional da PSP, por abuso de poder na sequência da alegada emissão de ordens ilegais.
Os factos remontam ao final de Outubro passado, altura em que o polícia, a quem aparentemente nunca tinha sido pedido nada do género, se recusou a sujar a farda de serviço para proceder à lavagem do veículo. Com 58 anos de idade, o agente encontra-se perto da idade da reforma, que nas forças de segurança é aos 60 anos, menos seis do que no regime geral por se tratar de uma profissão considerada de desgaste rápido. Foi notificado da acusação em Janeiro, já com os prazos judiciais e equivalentes suspensos por causa da pandemia.
O presidente do Sinapol explica que o colega não teve oportunidade de exercer sequer a sua defesa por o sindicato ter entendido que só o podia fazer depois de descongelados os prazos judiciais, o que só veio a suceder no passado dia 6 de Abril. Só que quase um mês antes, logo a 10 de Março, o polícia foi informado de que lhe ia ser aplicada uma multa equivalente a dois dias de serviço, no valor de 83,78 euros.
A lei que Armando Ferreira diz ter sido violada suspende os prazos para a prática de actos em procedimentos contra-ordenacionais (multas), sancionatórios e disciplinares que corram termos em serviços da administração directa, indirecta, regional, autárquica e demais entidades administrativas.
O dirigente sindical diz que existem na PSP mais casos com contornos similares e que, quando tentou informar-se das razões do sucedido, lhe foi explicado que para beneficiarem desta lei os polícias visados por processos disciplinares tinham de a ter invocado expressamente na sua defesa, segundo o entendimento do gabinete de deontologia e disciplina que funciona junto da direcção nacional da corporação.
Contactado pelo PÚBLICO, o gabinete de imprensa e relações públicas da PSP confirma ter sido recentemente decidido um processo disciplinar com estes contornos. “Aos polícias cumpre responder com prontidão e zelo a todas as ordens recebidas em serviço por parte da hierarquia. O incumprimento dessas ordens implica a responsabilização disciplinar, sujeita às regras em vigor”, alega a PSP. Quanto à suspensão de prazos, “constitui uma faculdade legalmente prevista mas não uma prerrogativa que impeça o desenvolvimento processual”.