De Lola Flores a Almodóvar, a Espanha de C. Tangana é um mundo

O músico madrileno reinventa-se e reivindica a canção popular espanhola em intersecção com o património da música da América Latina, inscrevendo-as no presente. Um triunfo.

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A audácia de quem sabe que a música tradicional não é para ser tratada como arqueologia

É uma das cenas mais deliciosas do filme Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos (1988), de Pedro Almodóvar: o “mambo táxi” de um motorista que destoa totalmente dos seus colegas de profissão, com assentos forrados a tecido tigresse, garrafas de gin à disposição dos clientes e uma selecção musical de meneio latino que “tem de tudo”, do mambo à música rock, da cumbia ao flamenco, da salsa ao tecno-pop. É mais ou menos como o novo álbum de C. Tangana, que poderia ser uma versão daquele táxi em 2021, com os mesmos padrões tigresse mas mais bling-bling; mais Prada ou Gucci com um pouco de Loewe. Ou mais Demasiadas Mujeres, o videoclipe de um dos singles de El Madrileño que tinha tudo para ser o teaser de um filme de Almodóvar, tal como o vídeo da canção Ingobernable: as cores e os símbolos identitários, os figurinos e os cenários, as personagens femininas e como elas são filmadas. Tudo com Espanha estampado na cara.

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