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As mulheres na política: uma competição desigual

Já não basta que o modelo do poder seja sempre o masculino, com séculos de história atrás. Há muitos outros exemplos de discriminação que só não sentiu quem nunca andou por lá.

Num excelente livro de Caroline Criado Perez, As Mulheres Invisíveis, recentemente publicado em português (Relógio de Água), mostra-se como os dados configuram um mundo feito para os homens, como o desenho de dispositivos de segurança não têm em conta as medidas das mulheres.

Como seria de esperar, mostra-se ainda que a participação política das mulheres está aquém do desejável, e que as mulheres nesse campo ainda não competem em condições de igualdade.

Talvez seja mesmo uma das partes mais interessante deste livro, aquela que se refere à discriminação sub-reptícia, disfarçada, às decisões que homens tomam nos bastidores onde formam redes de trocas de favores, em espaços seguros. Ou à distribuição de lugares nos Parlamentos, por exemplo, naquele onde estou: na Comissão de Igualdade de Género quase só há mulheres, mas a situação inverte-se na Comissão dos Negócios Estrangeiros onde supostamente se discute a política que conta.

Pior ainda é a forma como as mulheres são avaliadas no exercício de funções políticas ou de direção por homens e, infelizmente demasiadas vezes ainda, também por outras mulheres.

Já não basta que o modelo do poder seja sempre o masculino, com séculos de história atrás. Há muitos outros exemplos de discriminação que só não sentiu quem nunca andou por lá.

Se uma mulher é assertiva é apelidada de autoritária, mandona, exagerada, insensível, insuportável e outras frases que por decoro não reproduzo aqui. Livrem-me dela, ou “tenha calma minha querida”, a forma paternalista como David Cameron se dirigiu a uma deputada do Partido Trabalhista.

Um homem com exatamente o mesmo comportamento é um líder nato, seguro do que quer, determinado, capaz de atingir os seus objetivos, quando muito talvez estivesse hoje um bocadinho menos bem-disposto, mas seguramente cheio de razão!

Se uma mulher aspira um cargo superior é demasiado ambiciosa. Não foi disso que acusaram Hillary Clinton quando se candidatou à presidência, até dentro da esquerda do seu próprio partido? Tem uma “ambição extraordinária, irracional e avassaladora” (Anne Applebaum), demasiada para ser a primeira mulher presidente.

Mas, alguém poderia candidatar-se àquele cargo sem o ser? O que teve Barack Obama se não uma grande ambição quando partiu para a campanha? Leiam a sua magnífica biografia e verão que foi assim. Contudo, o que para Hillary era um defeito incontornável, para Obama sempre foi um fator de admiração, uma vantagem de um homem que é capaz de arriscar para ser o primeiro Presidente afro-americano dos EUA.

Precisamos de ser muito mais vigilantes na forma como a politica, que foi sempre masculina, continua presente por aí na violência dos comentários, incluindo online, nas pequenas referências e, sobretudo, nos comportamentos menos visíveis. Precisamos não só de mais mulheres na politica e em cargos de direção, mas também que depois de lá chegarem compitam em condições de igualdade. 

A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico

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