Covid-19: Bolsonaro diz que confinamento nunca resultou enquanto Brasil bate recorde de mortes
Em termos relativos, já morrem diariamente mais pessoas no Brasil do que nos EUA. Projecções apontam para mais de três mil mortos por dia nas próximas semanas.
O número de mortes causadas pela covid-19 no Brasil está a bater recordes consecutivos esta semana. Na quarta-feira, o número de óbitos num só dia por milhão de habitantes superou o que foi registado nos EUA, o país mais atingido pela pandemia a nível mundial.
Morreram 1840 brasileiros na quarta-feira, o número mais elevado até ao momento desde o início da pandemia da covid-19. O recorde batido era apenas da véspera (1726) e a subida confirma as piores suspeitas das autoridades sanitárias – o Brasil está a enfrentar uma escalada no número de infecções e casos sem saber quando irá voltar a inflectir a curva de contágios.
A imprensa brasileira notava a ultrapassagem do número relativo de mortes no Brasil face aos EUA. As 1840 mortes no país sul-americano representam 6,3 por cada milhão de habitantes, enquanto nos EUA, que registaram 1924 óbitos, essa média fica em 5,8. Apesar de se manterem elevados, o número de infecções no país mais atingido pela pandemia está em fase descendente, ao contrário do que acontece no Brasil.
O professor da Universidade de Duke (EUA), Miguel Nicolelis, que aconselhou vários governos estaduais no combate à pandemia, prevê que nas próximas semanas o Brasil possa superar a marca de três mil mortes diárias e, numa entrevista ao El País Brasil, diz que deve ser decretado um confinamento a nível nacional. “Nós podemos ter a maior catástrofe humanitária do século XXI nas nossas mãos”, afirmou o especialista.
No entanto, não parece provável que as orientações de Brasília se alterem. O Presidente Jair Bolsonaro tem sido um dos líderes mundiais que mais tem negado a eficácia das medidas de isolamento da população para conter a propagação do vírus que, apesar da magnitude, desvalorizou em diversas ocasiões. Na quarta-feira, Bolsonaro garantiu que, no que depender dos seus poderes, não haverá mais nenhum confinamento, uma medida que, disse, “não deu certo em lugar nenhum do mundo”.
A rejeição de Bolsonaro às medidas de isolamento físico da população e encerramento dos estabelecimentos comerciais não-essenciais contraria as recomendações que têm sido feitas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e que reúnem um consenso muito alargado de epidemiologistas e especialistas em saúde pública em todo o mundo.
Sem apoio do Governo federal, vários estados estão a adoptar novas medidas para tentar combater a propagação do vírus SARS-CoV-2 nos seus territórios. Entre eles está o mais populoso do país, São Paulo, onde o governador João Doria decretou um confinamento total até 19 de Março, com o encerramento de toda a actividade não-essencial. Em Minas Gerais também foram anunciadas medidas semelhantes para uma parte do estado, assim como no Ceará e Pernambuco, entre outros. No entanto, para além destas medidas, a enorme mortalidade nos hospitais das maiores cidades está a obrigar as autoridades a adoptar medidas para aumentar a capacidade para armazenar cadáveres. Em Recife e Porto Alegre, foram instalados contentores frigoríficos no exterior de hospitais para aliviar a pressão nas morgues.
A nova vaga da pandemia no Brasil é produto do alívio das restrições em várias partes do país na época das festividades de Natal e do Ano Novo, mas também da propagação de uma nova variante detectada pela primeira vez em Manaus, no Amazonas. Os estudos preliminares indicam que esta estirpe, que está a circular livremente no território brasileiro, é potencialmente mais contagiosa do que a regular.
O Brasil teve esta quinta-feira um dos seus piores dias desde o início da pandemia, ao contabilizar 1699 mortes e 75.102 infecções pelo novo coronavírus nas últimas 24 horas, informou o Ministério da Saúde. Este é o segundo dia com mais mortes devido à covid-19 no Brasil, após o recorde de 1910 óbitos batido na quarta-feira, segundo o último boletim epidemiológico difundido pelas autoridades de saúde do país.