Cautela é a palavra de ordem nos desconfinamentos europeus
Governos europeus tentam gerir expectativas de reabertura, mas muitos decidiram parar no alívio das restrições que já tinham planeado.
Enquanto parte da Europa começa cautelosos desconfinamentos, outra enfrenta uma terceira vaga da covid-19. Se há quem reabra mesmo com “nervosismo”, como a Holanda, há quem, como a Bélgica, lance “um banho de água fria” sobre as expectativas de reabertura, e ainda quem, como a Grécia, tenha tido de dar passos atrás.
Comparações são sempre difíceis porque os países estão em graus diferentes da pandemia, mas seguindo um índice que avalia quão restritivas são as medidas dos países feito no site Our World in Data, da Universidade de Oxford, Portugal está no segundo grau de maior severidade, junto com países como Espanha, Países Baixos, Hungria, Polónia, Grécia, Áustria ou Noruega, e atrás dos mais estritos como, por exemplo, o Reino Unido – que é a excepção nos planos de desconfinamento, tendo apresentado um com base em datas (e algumas metas).
A maioria dos países tem mantido as escolas abertas, pelo menos do 1.º ciclo e as creches, e os planos de desconfinamento prevêem também em muitos casos que as escolas estejam entre os sectores prioritários na reabertura – como tem dito que acontecerá em Portugal o primeiro-ministro, António Costa.
A cautela tem sido a palavra de ordem na maioria dos países, com surtos localizados a avançar com muita rapidez desde Dunquerque, em França, a avisos de aumentos dramáticos na Polónia ou República Checa, que estão em plena terceira vaga.
Alemanha
Não há planos para reabrir lojas não essenciais, restaurantes, bares, nem centros de lazer até pelo menos 7 de Março na Alemanha, e o facto de a taxa de infecção permanecer estagnada, e não descer, faz pensar que as medidas deverão continuar em vigor. Neste momento, as escolas primárias estão abertas em mais de metade dos 16 Estados federados, e há restrições de contacto – cada agregado familiar que viva junto só pode contactar com um outro. Por outro lado, está prevista a abertura de cabeleireiros em breve (uma das razões era porque havia muitos a ir a casa, sem cumprir regras de segurança, e havia ainda pessoas a viajar até países vizinhos como o Luxemburgo para cortar o cabelo).
A chanceler, Angela Merkel, quer um desconfinamento lento para evitar um novo confinamento (tem repetido que não é desejável “confinamento yo-yo”) se o número de infecções aumentar. A prioridade será o levantamento das restrições entre agregados familiares, seguido das escolas e de actividades desportivas.
O Governo planeia distribuir gratuitamente testes rápidos, que podem ser feitos pelas próprias pessoas em casa, e fazer testagem em larga escala. Neste momento é obrigatório o uso de máscaras cirúrgicas ou FFP2 em lojas e transportes públicos.
Áustria
Áustria, que já é um dos países do mundo com mais testagem, quer apostar em fazer ainda mais testes para poder seguir com o desconfinamento.
As escolas estão abertas com testes duas vezes por semanas aos alunos. Cabeleireiros, estúdios de tatuagem e algumas estâncias de esqui estão abertas e acessíveis a quem apresentar um resultado negativo de teste antes de entrar. Museus, galerias de arte e jardins zoológicos também.
O Governo considera a hipótese de abrir cafés e restaurantes no próximo mês com a mesma base, a de apresentação de um resultado negativo de teste. Para já, funcionam apenas em regime de take away.
Actualmente, é obrigatório o uso de máscaras FFP2 nas lojas e transportes públicos. Está ainda em vigor um recolhimento obrigatório das 20h às 6h.
Bélgica
A Bélgica anunciou na sexta-feira que não vai levar a cabo a flexibilização de restrições que esperava. “Não tomámos as decisões que tínhamos pensado tomar”, reconheceu o primeiro-ministro, Alexander De Croo. O número de casos, estável nos últimos três meses, está a subir, assim como as hospitalizações, com a variante identificada no Reino Unido a ser responsável por metade dos novos casos. “Temos de ser cuidadosos”, sublinhou De Croo. “É difícil dizer isto agora”, admitiu. “É como um banho de água fria.”
As escolas estão abertas, embora os estudantes do secundário apenas tenham aulas presenciais a meio tempo. Está em vigor um recolher obrigatório das 22h às 6h, mas as lojas, cabeleireiros e piscinas reabriram. Cafés e restaurantes estão fechados desde finais de Outubro, e o teletrabalho é obrigatório sempre que possível.
O Governo avaliará de novo a situação na próxima semana, e o primeiro-ministro já deixou claro que os números de novos casos, hospitalizações e mortes serão a base para mais decisões sobre o desconfinamento, que não será feito com base em datas.
Dinamarca
A Dinamarca vai permitir a reabertura de lojas não essenciais e escolas em partes do país, mas avisou logo que isso terá um custo em hospitalizações. “Mais actividade também quer dizer mais pessoas infectadas e, por isso, mais hospitalizações”, que podem mesmo triplicar, declarou o ministro da Saúde, Magnus Heunicke, numa conferência de imprensa.
Para tentar diminuir o risco nas escolas, os alunos serão testados duas vezes por semana. As lojas que poderão abrir são as que têm menos de 5 mil m2 e será possível ter actividades ao ar livre com um limite de 25 pessoas.
O país tem tido uma das mais baixas taxas de infecção da Europa, tendo respondido com o encerramento de muitos sectores ao aparecimento da variante mais contagiosa primeiro identificada em Inglaterra. Quem entra tem de apresentar um resultado negativo de teste e isolar-se dez dias.
O ministro das Finanças, Nicolai Wammen, sublinhou que a abertura das lojas vai ter um grande contributo para a economia, mas também avisou: “Vimos que outros países reabriram muito depressa e perderam o controlo da infecção. Este é um cenário que temos de evitar.”
Espanha
Entre as medidas nacionais em Espanha estão o recolher obrigatório das 22h/23h às 5h/6h até pelo menos ao início de Maio e a obrigatoriedade do uso de máscara por maiores de seis anos nos transportes públicos e espaços interiores, que são obrigatórias em muitas regiões para qualquer pessoa que saia de casa.
Das 17 regiões, dez continuam com bares e restaurantes encerrados, enquanto outras sete, incluindo Madrid, permitiram a reabertura (fechando mais cedo, o que em muitas regiões significa que os restaurantes apenas servem almoços).
O responsável da Agência de Saúde Pública, Fernando Simon, avisou, no entanto, que não há ainda espaço para aliviar significativamente as restrições.
França
Em França continuam fechados bares, museus, cinemas, teatros, ginásios e estâncias de esqui, e restaurantes funcionam apenas em take-away, e há ainda um recolher obrigatório em todo o território das 18h às 6h.
As escolas mantêm-se abertas com testes extra (os que são feitos apenas com uma amostra de saliva), regras estritas e uso de máscaras para crianças com mais de seis anos.
O país está a introduzir medidas ainda mais restritivas em locais com grande crescimento de infecções, como na Riviera, incluindo Nice e Cannes, e também Dunquerque, no Norte, onde houve um grande crescimento no número de infecções (a taxa de transmissão é nove vezes superior à média do resto do país).
Cerca de dez das 102 zonas do país estão numa “situação muito preocupante”, disse o porta-voz do Governo, Gabriel Attal.
As fronteiras com todos os países fora da UE estão encerradas (entradas permitidas apenas por razões urgentes), e o país aumentou os controlos da fronteira com a Alemanha, exigindo teste negativo à entrada.
Grécia
Em Janeiro, o país começou a aliviar um confinamento começado em Novembro, mas no final do mês a subida de casos levou a novas medidas em zonas “vermelhas”, de maior risco, que incluem a região de Atenas, onde só estão abertas lojas essenciais e voltaram a encerrar escolas, cabeleireiros e salões de beleza que tinham reaberto.
Em Atenas, Salónica e Chalkidiki está em vigor um recolher obrigatório das 21h às 5h durante a semana e das 18h às 5h no fim-de-semana; nas restantes “zonas vermelhas”, a obrigação de recolher começa sempre às 18h. É necessário (como em confinamentos anteriores) enviar um SMS a indicar que se vai sair, por exemplo, para ir às compras, e tem-se então uma janela de duas horas para estar fora de casa.
O Governo admitiu, esta semana, que a reabertura programada para Março (que incluiria, por exemplo, as escolas secundárias) não vai acontecer. “O grande aumento de casos” de terça-feira tornou logo isso claro, disse o primeiro-ministro, Kyriakos Mitsotakis.
Hungria
O primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, alertou esta sexta-feira, o dia que foram registadas 4669 novas infecções, que o país pode ter de apertar de novo as restrições quando se espera um “aumento drástico” do número de casos. O chefe de gabinete de Orbán já tinha avisado que as próximas duas semanas serão “extremamente difíceis”.
O Governo estendeu um confinamento parcial, que dura desde Novembro, até 15 de Março, com todas as escolas secundárias encerradas, assim como hotéis e restaurantes (que podem servir comida para fora). Temendo o aumento de infecções, o sindicato de professores PDSZ pediu entretanto ao Governo que feche creches e escolas primárias.
A Hungria está a fazer um grande esforço para ter mais vacinas, sendo o primeiro país da União Europeia a comprar a vacina russa Sputnik V e a chinesa Sinopharm, não aprovadas pela autoridade reguladora europeia. Mas, na Europa, é o país com menor percentagem de doses administradas relativamente às recebidas (menos de 50%). Portugal, por exemplo, está em oitavo lugar neste indicador.
Itália
O país continua a ter um recolher obrigatório das 22h às 5h, proibição de viagens entre as regiões pelo menos até 27 de Março (esperava-se que terminasse a 25 de Fevereiro), e uso obrigatório de máscara em espaços interiores e nos exteriores caso não seja possível garantir distanciamento.
O país tem restrições diferentes conforme a situação (há quatro níveis). Algumas regiões, incluindo Roma, começaram a permitir que bares e restaurantes sirvam clientes no local até às 18h.
As escolas estão abertas, incluindo os liceus, fechados desde Outubro e reabertos recentemente com os alunos divididos em grupos para que a ocupação das salas seja menor.
O Governo do novo primeiro-ministro, Mario Draghi, continuou as restrições a visitas de familiares e amigos: apenas dois adultos podem visitar a casa de outra pessoa na mesma altura. Cinemas e teatros continuam fechados em todo o país.
Irlanda
A Irlanda vai manter a maior parte das restrições do confinamento, com lojas não essenciais a continuarem encerradas, bares, ginásios e até construção civil, até pelo menos 5 de Abril. A excepção são as escolas primárias e as creches, que vão reabrir esta semana, e há a ideia de passar a permitir o trabalho em obras a partir dessa data.
As deslocações não essenciais estão proibidas e para fazer desporto estão limitadas a uma distância de 5 km de casa.
Estão proibidas visitas a casas de outras pessoas, mesmo que seja no jardim; casamentos podem ter seis convidados e funerais dez.
O chefe de Governo, Micheál Martin, reconheceu que o país estava “física e mentalmente exausto pelas restrições”, mas acrescentou que o país só reabrirá quando o número de novas infecções descer e houver mais pessoas vacinadas.
Países Baixos
O primeiro-ministro holandês, Mark Rutte, admite que o executivo está a tomar uma decisão que o deixa “nervoso”: relaxar algumas medidas de confinamento quando os números não chegaram ao que seria considerado ideal.
A partir de 1 de Março, alunos do secundário voltarão pelo menos um dia por semana às aulas, e poderão reabrir cabeleireiros, por exemplo. O país fechou escolas e lojas em Dezembro, dois meses depois de encerrar bares e restaurantes. Adolescentes e jovens até aos 27 anos vão poder fazer desportos de equipa no exterior, e há lojas que poderão abrir por marcação.
Vai manter-se, no entanto, o recolher obrigatório das 21h às 4h30 pelo menos até 15 de Março. As escolas e lojas fecharam em Dezembro.
“O relaxamento de medidas não deixará de ter custos, e não é irreversível”, avisou logo Rutte. “Se as infecções subirem, voltam a estar em cima da mesa todas as opções de restrições.”
Polónia
A Polónia tinha começado a relaxar algumas medidas do confinamento, abrindo estâncias de esqui, cinemas, hotéis e teatros, mas as autoridades estão a preparar-se para reintroduzir algumas delas.
Um surto na região de Warminsko-Mazurskie, conhecida pelos seus lagos, fez com que as autoridades decretassem um confinamento local, durante pelo menos duas semanas.
“Decidimos dar um pequeno passo atrás”, lamentou o ministro da Saúde, Adam Niedzielski. A Polónia atravessa a terceira vaga da covid-19, e o ministro estima que esta seja “mais pequena” que as anteriores, e que o pico aconteça entre o final de Março e início de Abril.
Reino Unido
O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, apresentou na segunda-feira um plano de reabertura para Inglaterra com base em datas, começando pelas escolas já esta semana, e passando por lojas não essenciais, cabeleireiros, ginásios e bares ou restaurantes ao ar livre, para chegar finalmente à meta, que é não ter restrições a 21 de Junho.
O optimismo excepcional em Londres, que contrasta com a abordagem mais cautelosa na Europa, tem a ver sobretudo com o avanço na vacinação.
Cada etapa tem um espaço de várias semanas entre si, e só se passará à seguinte se houver condições, medidas em vários indicadores: o ritmo da vacinação, a verificação da descida das hospitalizações e mortes por causa da vacinação, redução da taxa de infecções e a ausência de ameaça por parte de novas variantes do vírus. Boris Johnson disse esperar que a reabertura seja “cautelosa e irreversível”.
República Checa
O Governo da República Checa, que tem estado no lugar cimeiro da taxa de infecções em relação à população, tenta que as medidas de confinamento continuem quando a oposição se recusa a prolongar o estado de emergência. O Governo minoritário de Andrej Babis tem feito apelos cada vez mais dramáticos, dizendo que se aproximam “dias infernais”, e parte da oposição parece convencida que, com as novas variantes de transmissão mais fácil, é melhor aprovar mais medidas. Neste momento já estão fechadas lojas não essenciais, restaurantes, entretenimento, e apenas as creches e dois anos da primária estão a ir às aulas.
“O que precisamos agora é que as pessoas, que estão frustradas, e que querem ter as suas vidas de volta, o que precisamos é que se comportem nas próximas três semanas do modo que fizeram em Março de 2020”, declarou. Em Março, a República Checa teve um confinamento rigoroso, e foi um dos países europeus a passar com sucesso a primeira vaga. Tanto sucesso que se tornaram um destino favorito de turismo, e que as pessoas se tornaram complacentes, cumprindo menos as regras, e foi dos países mais afectados na segunda e terceira vagas.
Suécia
“Podemos evitar uma terceira vaga se mantivermos a distância”, disse o primeiro-ministro sueco, Stefan Löfven, quando o Governo anunciou que quer reduzir o horário de restaurantes, bares e cafés, que fecharão às 20h30. Os restaurantes e bares já não podiam vender álcool a partir das 20h. A estratégia sueca baseia-se sobretudo em recomendações, mas em Janeiro o Governo aprovou legislação que permite intervenção de modo mais directo. Agora vai ainda limitar o número de pessoas que podem entrar nas lojas e suspender competições desportivas para maiores de 15 anos.
Apesar de as empresas permanecerem abertas, o teletrabalho é incentivado e será a regra (já era relativamente comum antes da pandemia) e parte das aulas para alunos com mais de 16 anos estão a ser dadas online. Também há restrições a viagens internas e também para quem chega; as viagens para o estrangeiro são desaconselhadas.
Em Portugal, para comparação: