A Cultura em tempos de pandemia
Devemos ter em conta um juízo de distancia – aquilo que vai ficar depois de a pandemia terminar ou estar controlada. Não gerir bem, não proteger, esta área, terá um impacto muito para além do momento presente.
A Cultura representa muito da identidade de um país, ou de uma área mais vasta como é o caso da Europa. Contudo, a Cultura representa também pessoas, profissionais, que estão a ser fortemente afetados na presente pandemia. Trata-se de um sector que anteriormente representava um valor com algum significado na economia portuguesa e europeia.
É difícil, se não mesmo impossível, fazer contas relativamente a valores imateriais. A Cultura, em algum sentido, mostra o papel da pessoa no mundo, e pode permitir algum equilíbrio entre os projetos individuais e os coletivos.
Os seres humanos são eminentemente culturais – necessitam da cultura como alimento, como alimento para o espírito. É algo que não se esgota, que não se destrói, e que se encontra permanentemente em construção.
O fogo da cultura não serve para preparar alimentos, nem para aquecer nos dias frios, mas serve, isso sim, para iluminar, para projetar a vista para mais longe.
A falta de recursos financeiros que se faz sentir no momento presente, entre nós como fora, gera a necessidade de pensar na sobrevivência imediata, negligenciando aquilo que aparentemente não é imediatamente necessário a essa mesma sobrevivência.
É o momento do ventilador, não do livro – cuja venda foi, aliás, não proibida, mas dificultada. Contudo, sem cultura, não honraremos o passado, não viveremos bem o presente nem construiremos o futuro nos moldes mais adequados.
Ousar pensar – reconhecer o pensamento livre como algo indispensável –, aqui está um desafio que permitirá, espera-se, que nos excedamos, que consigamos engrandecer a civilização que herdamos.
A Cultura é inimiga da ditadura, de um qualquer regime totalitário – ainda que, por hipótese, sanitário. No confinamento fica definido o papel essencial – que não é o da partitura.
Importa defender a Democracia, mas uma Democracia que seja justa – e que não constitua uma sobrecarga excessiva para as minorias. Uma Democracia que seja, na verdade, uma República, e que não distribua a cicuta aos menos úteis do momento – agora estes, amanhã, aqueles.
Muitos atores na área cultural são trabalhadores independentes – porque acreditam no seu trabalho – e acabaram a ser menos bem tratados durante a pandemia. As escolhas são do Estado democrático, são dos nossos representantes legítimos, e são, de alguma forma, compreensíveis.
Contudo e sem prejuízo disso, é necessário um sobressalto cívico – que permita algum tipo de solução para este como para outros tipos de casos.
Estamos perante uma nova realidade – uma realidade que veio para ficar. É necessária uma adaptação à nova realidade. É necessária uma estratégia, porque precisamos da cultura e a cultura precisa de nós. Uma estratégia que tenha em conta, designadamente: que não vamos voltar tão cedo às condições anteriores; que no Verão a pandemia vai estar mais bem controlada que no Inverno, permitindo o regresso de muitas atividades, neste ano como nos seguintes, se for o caso; que os espaços ao ar livre são mais vantajosos que os espaços fechados; que a mudança na psicologia das pessoas se vai manter muito para além dos vírus do momento.
Devemos ter em conta um juízo de distancia – aquilo que vai ficar depois de a pandemia terminar ou estar controlada. Não gerir bem, não proteger, esta área, terá um impacto muito para além do momento presente.
Susbcritores
Pedro Abrunhosa
Carlos Abreu Amorim
Filipe Basto
Pedro M. Froufe
Miguel Guimarães
Paulo de Morais
José Pedro L. Nunes
Luís Rocha
Maria de Belém Roseira
Nuno Ferreira da Silva
Orlando Monteiro da Silva
João Almeida e Silva
(memorando do grupo de reflexão “Dez da Noite”, fevereiro de 2021)
Os autores escrevem segundo o novo acordo ortográfico