Dia Internacional da Criança com Cancro: Um dia para não comemorar
Não comemorando o dia, façamos, em nome dos que não sobreviveram, o trabalho necessário aos que exigem ter uma vida apesar do cancro.
O Dia Internacional da Criança com Cancro foi instituído há 20 anos e o seu objectivo sempre foi o de sensibilizar. Em Portugal, a Acreditar assinala este dia, desde a sua instituição e sempre chamando a atenção para as questões que, em cada momento, mais preocupam esta comunidade.
Começando pelas boas noticias nacionais:
- O cancro pediátrico tem tratamento em cerca de 80% dos casos diagnosticados;
- Os hospitais de referência para o cancro pediátrico são verdadeiros centros de excelência onde se faz, não só o melhor do ponto de vista médico como humano, com equipas de pessoal de saúde, educação, apoio social, psiquiatria e psicologia, bem como pessoal auxiliar que são do melhor que tem o nosso país;
- Existe uma vontade e energia real para a investigação nacional, sobretudo da parte de clínicos, mas também por parte de outros profissionais e organismos dedicados à investigação;
- A sociedade mobiliza-se para esta temática, sempre que conhece casos concretos que a sensibilizam.
E passando às más noticias:
- Ainda existem 20 % de casos em que a crianças e jovens não resistem à doença;
- Existe uma elevada percentagem de sobreviventes com sequelas (segundo alguns de 50% e segundo outros de 2/3). As sequelas podem ser físicas ou psicológicas e em muitos casos são mesmo incapacitantes;
- A investigação em cancro pediátrico é incipiente e é evidente a falta de financiamento e de tempo protegido para dedicar à investigação;
- Os sobreviventes são discriminados na sociedade e isso é evidenciado no acesso ao emprego, aos seguros e no direito a um seguimento médico consequente e planeado;
- As famílias de crianças com cancro sofrem de redução de rendimentos relevantes;
- Os cuidados paliativos pediátricos são quase inexistentes;
- O apoio psicológico às famílias é escasso;
- A situação dos doentes dos PALOP que vêm para Portugal, ao abrigo de acordos de cooperação, é muito difícil e podemos citar os diagnósticos muito tardios, a falta de apoios gritante, que deixa estas famílias sem suporte, e a falta de acompanhamento no repatriamento, que faz com a que a maioria queira permanecer em Portugal para apoiar os seus filhos.
A posição da Acreditar, associação que há mais de 26 anos se dedica a esta temática, é a de aproveitar as boas condições que o país tem nas áreas identificadas anteriormente, para melhorar de forma decisiva o prognóstico de cura, as sequelas e a qualidade de vida dos sobreviventes.
Por estarmos a falar de números relativamente pequenos (cerca de 400 novos casos por ano em Portugal), podemos fazer a diferença com investimento relativamente modesto e com a determinação de um plano de intervenção bem articulado.
Propomos:
- Que rapidamente seja consolidada a informação estatística sobre o cancro pediátrico que permita conhecer com detalhe esta realidade para que sobre ela se possa actuar mais certeiramente;
- Que o cancro pediátrico seja uma prioridade nacional, tal como passou a sê-lo a nível europeu, com a inclusão da pediatria no plano europeu de combate ao cancro. A actual situação de pertença da pediatria oncológica à “terra de ninguém” não serve os interesses dos doentes nem o planeamento eficaz desta área;
- Que os valores dedicados ao combate ao cancro a nível europeu (4 mil milhões de euros) sejam usados prioritariamente em Portugal para fomentar a investigação e melhorar o acesso dos sobreviventes a consultas de seguimento universais;
- Que as associações de doentes sejam ouvidas e que sejam parte da solução dos problemas. O repositório de experiência acumulada determina que sejam parceiros em igualdade dos organismos que se dediquem a esta matéria e aqui incluo os hospitais.
- Que rapidamente se aprove a Lei do Esquecimento, a qual permitirá a sobreviventes de cancro poderem fazer a sua vida em igualdade de direitos com todos os que não tiveram cancro;
- Renegociação das condições para a cooperação com os PALOP com a intervenção dos profissionais que melhor conhecem esta realidade e das associações de doentes que os acompanham.
E assim, não comemorando o dia, façamos, em nome dos que não sobreviveram, o trabalho necessário aos que exigem ter uma vida apesar do cancro.