Lista de resoluções agora que recomeçou o ensino online
Indignei-me pela milionésima vez com a dificuldade de acesso ao subsídio de Apoio Extraordinário aos pais, e angustiei-me com a situação de todos os que estão a recibo verde ou com contratos precários e que nem se atrevem a exprimir alto o inferno que estão a viver.
Querida Mãe,
Fiz uma lista para mim mesma das coisas de que não me posso mesmo esquecer agora que recomeçou o ensino online.
Partilho-a aqui porque:
a) inclui alguns pedidos para os avós,
b) a mãe pode querer emprestá-la a outras mães,
c) pode ser-lhe útil se eu der em doida e fugir de casa, e a mãe for forçada a substituir-me.
Aqui vão os meus mantras:
- Quando os teus filhos te responderem torto nos minutos antes de entrar num Zoom é só porque estão stressados. Respira fundo e deixa passar.
- Explica aos miúdos que quando tu responderes torto, minutos antes de começares uma reunião por Zoom, é só porque estás stressada. Diz-lhes para respirar fundo e deixar passar.
- Não é preciso culpares a escola, os teus filhos ou a ti própria, sempre que identificares um problema, e quiseres arranjar uma alternativa. É impossível a criança aguentar 80 minutos de Zoom? Com calma, expor, explicar e trabalhar para em conjunto encontrar uma solução.
- Não te sintas julgada nem pelas outras mães, nem pelos avós, nem pelos professores. Há 90% de hipótese de que estejam tão inseguros e baralhados como tu.
- Não inventes desculpas, nem incentives os teus filhos a fazer o mesmo — diz com franqueza e sem medo “Não conseguimos”, “Estava a ser difícil demais”, “Estamos demasiado cansados”. Convida os professores a também mostrarem essa vulnerabilidade.
- A inflexibilidade de pensamento dos teus filhos, não se resolve com a tua inflexibilidade. Ensina a flexibilidade pelo exemplo.
- Estamos todos a fazer o melhor que conseguimos. TODOS. Incluindo os miúdos.
- Lembra os teus pais que vais ligar a refilar e a queixar-te, mas que só precisas que te oiçam e não tentem resolver nada. Diz-lhes para te lembrarem dos filhos maravilhosos que tens.
- Lembra-te que a casa e a arrumação vão ter que descer na lista de prioridades, e que não faz mal.
- Lembra-te que vale mesmo, mesmo, a pena forçar um bocadinho para saírem à rua e mexerem-se.
Boa sorte, e see you on the other side!
Querida Ana,
Vou afixar a tua lista de resoluções ao lado da minha secretária, para ler e reler o ponto 8. Se é extremamente difícil ter filhos nesta modalidade de escola online, só com muito esforço é que uma mãe/avó consegue ouvir as queixas dos filhos sem oferecer conselhos e soluções. Mas prometo que vou guardar a caixa dos pensos rápidos e tentar resistir a oferecer-me para te por Betadine nos arranhões e Herodoide nas nódoas negras.
Quanto aos avós, acho que a nossa lista tem só um ponto: “Não me vou preocupar tanto.” Acredita que quando estamos longe ainda é mais difícil (embora apesar de tudo o sono ande mais em dia). A bruxa da história da Casinha de Chocolate ainda podia apertar o dedo do Joãozinho para ver se estava bem vivo e um bocadinho mais gordinho, mas queria ver o que teria acontecido se a tivessem obrigado a avaliá-lo por telefone, ou mesmo Facetime? Aposto que transformava toda a gente em sapos, e é exactamente isso o que uma mãe/avó stressada é tentada a fazer.
Li no PÚBLICO uma reportagem sobre mães em teletrabalho, nomeadamente em call centres e imagino o estado de nervos em que as mães delas estão. Indignei-me pela milionésima vez com a dificuldade de acesso ao subsídio de Apoio Extraordinário aos pais, e angustiei-me com a situação de todos aqueles pais — sobretudo mães, não vale a pena fazer um discurso igualitário quando não corresponde à realidade! — que estão a recibo verde ou com contratos precários e que nem se atrevem a exprimir alto o inferno que estão a viver.
Ana, que a vacina nos liberte rapidamente deste inferno e os avós possam voltar a ajudar os filhos e os netos, missão que tanto sentido lhes dá à vida. Vocês os cinco já estão vacinados (pelo menos por uns meses), mal tiverem alta, saltem cá para casa. Ao menos isso.
No Birras de Mãe, uma avó/ mãe (e também sogra) e uma mãe/filha, logo de quatro filhos, separadas pela quarentena, vão diariamente escrever-se, para falar dos medos, irritações, perplexidade, raivas, mal-entendidos, mas também da sensação de perfeita comunhão que — ocasionalmente! — as invade. Na esperança de que quem as leia, mãe ou avó, sinta que é de si que falam. Facebook e Instagram.