Eduardo Batarda e o Atelier do Corvo são os vencedores dos Prémios AICA
Júri distinguiu a persistência e o trabalho contra o desânimo e a letargia do atelier de Miranda do Corvo e a notável e virtuosa carreira do pintor.
O pintor Eduardo Batarda e o Atelier do Corvo são os vencedores da edição deste ano dos Prémios AICA, no valor de dez mil euros, cada, atribuídos esta sexta-feira pela Secção Portuguesa da Associação Internacional de Críticos de Arte.
A decisão foi tomada por um júri reunido por vídeo-conferência, presidido por Sandra Vieira Jürgens, crítica, editora e historiadora de arte, e completado por Ana Anacleto, curadora do Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia (MAAT), Bárbara Silva, arquitecta, curadora e professora universitária, e Pedro Baía e Luísa Soares de Oliveira, estes últimos respectivamente críticos de arquitectura e de arte e colaboradores do PÚBLICO. Ambos os premiados foram escolhidos por unanimidade.
O Atelier do Corvo, escritório de arquitectura com sede em Miranda do Corvo, foi fundado em 1996 por Carlos Antunes (Coimbra, 1969) e Désirée Pedro (Porto Amélia, actual Pemba, Moçambique, 1970). A dupla de arquitectos tem vindo a desenvolver “uma prática singular no campo partilhado entre a arquitectura e as artes plásticas”, diz a acta do júri, salientando o modo como “procuram reflectir e estruturar o pensamento sobre a noção de espaço e a sua relação com o indivíduo e com a experiência estética”.
Em Eduardo Batarda (Coimbra, 1943), o júri da AICA teve em conta “não só toda a uma carreira associada à pintura com um virtuosismo ímpar”, como disse ao PÚBLICO, no final da reunião, Sandra Vieira Jürgens, mas principalmente a exposição Great Moments. Eduardo Batarda nos Anos Setenta, que o artista apresentou no ano passado na Fundação Arpad Szenes-Vieira da Silva, em Lisboa.
A presidente do júri realçou, de resto, que o Prémio AICA distingue a carreira dos visados, mas sobretudo aquilo que os artistas e criadores fizeram no ano imediatamente anterior. “Aqui tivemos em conta que 2020 foi um ano muito sui generis, com uma capacidade expositiva muito limitada para os artistas, mas quisemos manter esse aspecto”, acrescentou, referindo-se aos trabalhos então realizados tanto por Eduardo Batarda como pelo Atelier do Corvo.
Questionar a cidade e o território
No caso da dupla Carlos Antunes-Désirée Pedro, o júri relembra um percurso que se cruza com a direcção e programação artística no Círculo de Artes Plásticas de Coimbra e na Bienal de Arte Contemporânea de Coimbra, e que “reflecte um questionamento constante em torno da cidade e do território, num confronto produtivo entre a arquitectura, as artes, a cultura e o património”.
Em 2020, o Atelier do Corvo destacou-se “pela sua capacidade de resistência e urgência experimental”, diz o júri, citando o lançamento, no próprio atelier da dupla em Miranda do Corvo, do projecto Senso. Galeria efémera para dias de clausura, onde a dupla expôs obras de arquitectura e de artistas convidados “num acto simbólico contra o desânimo e a letargia”. Um trabalho que a AICA considera “essencial para que a arquitectura seja divulgada ao público, e entendida como uma disciplina que pode, e deve, ser mostrada não apenas através de obras construídas, mas também de pensamentos, reflexões e relações com outros campos disciplinares onde sempre está inserida”.
A distinção teve também em conta o facto de, no mesmo ano de 2020, este atelier ter concluído a obra das Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus, em Condeixa, com a remodelação e ampliação do edifício Bento Menni e a construção do novo edifício administrativo, um trabalho que “afirma e consolida o reconhecimento da sua práctica projectual”.
Um discurso crítico e corrosivo
Sobre Eduardo Batarda, o júri recorda a sua formação em Lisboa, na Escola Superior de Belas Artes, e também em Londres, no Royal College of Arts, a que se seguiu “uma carreira notável de pintor”, além da actividade distinta de professor na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto. O artista recebeu em 2007 o Grande Prémio EDP e, em 2019, o Grande Prémio Amadeo de Souza-Cardoso.
Com um extenso currículo de exposições, tanto em Portugal como no estrangeiro, o pintor apresentou em Great Moments. Eduardo Batarda nos Anos Setenta “uma extensa série de obras com um domínio virtuoso da técnica que servia um discurso crítico, irónico, corrosivo, politicamente engajado, cruzando um conjunto de referentes oriundos tanto dos universos da cultura popular quanto da cultura erudita”, sublinha a acta.
Em ambas as escolhas, acrescenta Sandra Vieira Jürgens ao PÚBLICO, o júri fez questão de “relevar a continuidade e a resistência de artistas” que, independentemente da sua idade e das circunstâncias que estamos a viver, decidiram “continuar a trabalhar e a desenvolver as suas carreiras de uma forma muito persistente”.
Os Prémios AICA de Artes Visuais e Arquitectura são atribuídos anualmente, desde o início da década de 1980, numa parceria com o Ministério da Cultura (por via da Direcção-Geral das Artes) e, desde 2012, também com a Fundação Millennium BCP, a “duas personalidades das respectivas áreas, cujo percurso profissional seja considerado relevante pela crítica e cujo trabalho tenha estado particularmente em foco, no ano a que o prémio diz respeito”.
No ano passado, os distinguidos foram o artista Silvestre Pestana e o arquitecto Bartolomeu Costa Cabral.