Responsabilidade dos cônjuges pelas dívidas contraídas durante o casamento

A questão de determinar se uma dívida, contraída apenas por um dos cônjuges, é, ou não, da responsabilidade de ambos pode assumir relevância em várias situações, como por exemplo quando se mostre necessário determinar quais os concretos bens que respondem por essa dívida.

Dispõe o artigo 1960.º do Código Civil que qualquer um dos membros do casal tem legitimidade para, sem o consentimento do outro, contrair dívidas e, nos termos do artigo 1961.º do mesmo Código, essas dívidas serão consideradas da responsabilidade de ambos, nomeadamente, se tiverem sido contraídas (antes ou depois do casamento) para ocorrer a encargos normais da vida familiar ou se tiverem sido contraídas, em proveito comum do casal, após o casamento, pelo cônjuge administrador.  

A questão de determinar se uma dívida, contraída apenas por um dos cônjuges, é, ou não, da responsabilidade de ambos pode assumir relevância em várias situações, como por exemplo quando se mostre necessário determinar quais os concretos bens que respondem por essa dívida.

O artigo 1695.º do Código Civil determina que os bens comuns do casal respondem pelas dívidas que sejam da responsabilidade de ambos e que, se estes bens não forem suficientes, responderão por essas dívidas, de forma solidária, os bens próprios de qualquer um dos cônjuges (exceção feita quando o regime de bens do casamento seja o da separação de bens).

Nestas situações, importa ter presente quais os conceitos de proveito comum e encargos normais da vida familiar, na medida em que tendo, como referido, as dívidas sido contraídas apenas por um dos cônjuges (sem o consentimento do outro), serão comuns se, na origem das mesmas, estiver um destes dois conceitos.

Na determinação do que devem ser consideradas dívidas que constituem encargos normais da vida familiar, há que ter em consideração o disposto no artigo 1676.º, n.º 1 do Código Civil, nos termos do qual: “O dever de contribuir para os encargos da vida familiar incumbe a ambos os cônjuges, de harmonia com as possibilidades de cada um…

Da redação deste artigo resulta que, em determinadas situações, a contribuição para os encargos da vida comum pode não ser repartida, entre ambos os cônjuges, na proporção de metade, daqui resultando que a responsabilidade de cada um dos cônjuges nas dívidas contraídas para fazer face a tais encargos também poderá não ser na proporção de metade para cada um, existindo situações em que um dos cônjuges terá uma quota-parte de responsabilidade superior à do outro.

Assim, é importante definir o que pode estar incluído nos encargos normais com a vida familiar.

É pacífico que, nestes encargos, incluem-se não só as despesas relacionadas com o dia-a-dia da gestão doméstica, como sejam, por exemplo, a alimentação, os consumos de água, luz, gás e internet, os artigos de higiene (seja da casa, seja dos membros da família), os medicamentos, o vestuário e o calçado para toda a família, o lazer dos membros da família, mas, também, outros encargos que as família têm e que, não fazendo parte da gestão do dia-a-dia, não deixam de ser encargos normais da vida familiar, como sejam a renda de casa ou o empréstimo bancário de aquisição do imóvel, as despesas com propinas escolares dos filhos e material escolar destes, encargos com veículo automóvel da família, entre outras.

Imagine-se uma situação em que um dos cônjuges tem um rendimento muito superior ao do outro e que, por isso, conforme resulta do artigo 1676.º, n.º 1 do Código Civil, a sua responsabilidade na contribuição para os encargos da vida comum é superior a metade, e esse cônjuge contraiu uma dívida para fazer face, por exemplo, ao pagamento das propinas escolares dos filhos comuns.

O casal tem bens comuns que podem responder por essa dívida que, conforme referido, é comum, não o sendo, contudo, na proporção de metade, em face da disparidade de rendimentos.

Pode, nesta situação, questionar-se quais os bens que, concretamente, responderão pela dívida e em que proporção, podendo esta questão ser levantada pelo cônjuge com menos rendimentos, numa eventual ação que, pelo credor, seja movida contra o casal e na qual sejam penhorados bens comuns.

Em suma, quando um casal está a ser executado e estão a ser penhorados bens, sejam comuns, sejam próprios de cada um deles, importa não só analisar a origem da dívida, como a responsabilidade de cada um dos cônjuges para os encargos da vida familiar, por forma a que se possa, com segurança, determinar quais os bens que respondem pela dívida e em que proporção o fazem.

Advogadas na Rogério Alves & Associados, Sociedade de Advogados, SP, RL

As autoras escrevem segundo o novo acordo ortográfico​

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