Há 2600 pessoas que querem viver (e trabalhar) na vila nómada da Madeira
A Startup Madeira apresentou a sua vila nómada — Ponta do Sol — e a notícia correu mundo. São muitos os que aceitaram o desafio. “Nem nós estávamos à espera”, diz-nos o CEO Carlos Lopes. “Quando a situação pandémica melhorar, os nossos empresários e comunidade local poderão receber os frutos deste posicionamento”.
“Madeira, a tua nova casa” — e mais de 2600 pessoas aceitaram o desafio. Assim se apresenta o projecto Digital Nomads Madeira Islands a todos os que trabalham online e viajam a tempo inteiro, os chamados nómadas digitais que aproveitam o facto de não terem um escritório fixo para trabalhar a partir dos locais mais bonitos do mundo, com bom tempo, boa gastronomia, actividades próximas da natureza e, já agora, boa Internet. Por períodos entre um e seis meses, esses empreendedores digitais vão fazer da ilha a sua casa, vivendo como locais.
No epicentro deste projecto-piloto — desenvolvido pela Secretaria Regional da Economia através da Startup Madeira — está a Ponta do Sol, a “primeira vila nómada do mundo” onde em primeiro lugar se deverá sentir um impacto positivo na economia graças à estratégia de atracção de profissionais de diferentes áreas durante um período de tempo alargado, elevando desta forma o consumo nos negócios locais e ao mesmo tempo colmatando a redução de turistas e a sazonalidade do mercado turístico do arquipélago.
Para grandes males, grandes remédios. Foi a pensar nos danos provocados pela pandemia que a Startup Madeira, há 24 anos a fazer pela sua terra, decidiu juntar-se à FoW Portugal para dinamizar o Future of Work, um evento de dois dias (aconteceu entre os dias 3 e 4 de Setembro) sob o tema do trabalho remoto e nomadismo digital. Daí, e das sinergias criadas com Gonçalo Hall, um dos oradores, surgiu a oportunidade de criar um projecto de nómadas digitais que funcionaria como uma alavanca para o futuro do arquipélago e cuja primeira pedra foi colocada semanas depois, a 25 de Novembro com o lançamento do projecto Digital Nomads Madeira Islands. “Queríamos testar um conceito”, aponta Carlos Lopes. “Atrair nómadas para trabalhar remotamente, uma estratégia que está a dar passos largos na Europa. E a Madeira não podia ficar de fora”.
Até ao fim do ano 2020, tinham chegado à Startup Madeira mais ou menos 300 inscrições, 300 pessoas que se sentiram inspiradas pela Digital Nomad Village. Mas a notícia espalhou-se ("saiu em mais de vinte órgãos de comunicação internacionais") e fez transbordar as perspectivas mais optimistas. “Nem nós estávamos à espera”, admite Carlos Lopes entusiasmado. “Até ontem [25 de Janeiro] tínhamos recebido 2600 inscrições!”. Para se ter uma ideia mais aproximada, no último fim-de-semana a equipa de trabalho respondeu a “mais de 600 emails”, juntou Carlos, presidente da Startup Madeira, onde começou em 2005 como gestor de projectos.
Se o projecto “está a crescer mais” do que se previa, a equipa do Digital Nomads sente-se preparada para dar conta do recado — e até porque algumas pessoas não vão conseguir viajar agora devido às restrições de circulação impostas. “Se pudessem viajar todos nesta fase”, sublinha Carlos Lopes, “seria óptimo”. “A Madeira consegue receber e absorver facilmente 2600 pessoas. Basta ver o número de pessoas que aqui chega quando um cruzeiro atraca”, explica, tendo em conta que muitos dos inscritos pretendem ficar entre “dois, três meses”.
“Por todo o mundo as pessoas estão a despertar para esse novo mundo que é o trabalho remoto. É uma tendência crescente. E a Madeira tem que estar nesse mapa. Queremos que seja uma ponte entre quem já trabalha desta forma há muito tempo e aqueles que querem envolver-se agora”, define Carlos Lopes, 38 anos.
O que a pandemia trouxe foi “uma nova relação com o trabalho”, geograficamente “mais dispersa” e por isso com “sinergias que é preciso saber aproveitar”. “São oportunidades que se criam. Temos que nos preparar para esse novo mundo”.
À Madeira preparam-se para chegar pessoas de várias idades, de vários países (EUA, Canadá, Austrália, Reino Unido, Brasil, Rússia, Turquia, China...) e das mais diversas áreas. O projecto liderado por Carlos Lopes tem como objectivo “perceber” as necessidades de cada um deles, apresentando-lhes e oferecendo-lhes “aquilo que de melhor a Madeira tem”. E tem “uma oferta fantástica”, a começar no clima ("E porque não passar o Inverno cá?”).
A localização deste “projecto-piloto” não foi inocente nesse sentido. “Chama-se Ponta do Sol porque tem uma excelente exposição solar”, anota Carlos Lopes, sublinhando a localização e temperatura “fantásticos” de um município dotado de eventos culturais “com muita qualidade” — a sede está montada no Centro Cultural John dos Passos —, bem como os acessos a actividades náuticas e de montanha e de um conjunto de serviços já montado em torno da restauração e da hotelaria.
Durante os próximos meses, a Startup Madeira promoverá formação para empresários e investidores no sentido de se criarem produtos e serviços nesta área, bem como actividades para os nómadas digitais. “Criação de valor”, resume o CEO da Startup Madeira, que tem passado as últimas semanas a munir a comunidade de ferramentas. “Não estamos só a falar de turismo. Estes vêm para um período longo. Esse é um nicho de mercado a explorar”, sublinha. As pessoas que participam neste projecto-piloto “passam a ser locais”. “Vão querer voltar e vão partilhar a experiência. O que nos interessa é a comunidade.”
A Startup conta receber em Fevereiro entre 50 e 70 nómadas digitais, que poderão usar tanto o interior do Centro Cultural John dos Passos como a zona exterior circundante que estará adaptada para receber todos os que queiram trabalhar ao ar livre. Para além disso, a vila oferece condições de trabalho em diversos bares, restaurantes, hotéis e na biblioteca. “As regras de segurança serão totalmente cumpridas quer à entrada do aeroporto, quer no próprio espaço, cumprindo o distanciamento social, utilização de máscaras, desinfecção e restantes recomendações das autoridades de saúde”, garante Carlos Lopes.
“Mais do que o espaço físico, consideramos que o mais importante é construir uma comunidade que conheça e explore as virtudes do nosso arquipélago, trabalhando remotamente para o mundo. Uma comunidade que poderá partilhar experiências, actividades e interesses, mas que poderá escolher livremente onde trabalhar, relaxar, usufruir de refeições e acima de tudo aproveitar o melhor que a Madeira e Porto Santo poderão oferecer nos seus tempos livres.”
A pandemia vai impondo os limites, mas sem toldar a visão deste projecto. “Estamos cientes das limitações de voos e deslocações em todo o mundo, mas percebemos que quando a situação pandémica melhorar os nossos empresários e comunidade local poderão receber os frutos deste posicionamento.”
Neste momento, e nos próximos meses, os nómadas digitais são acompanhados por uma equipa que os ajuda em todos os processos (vistos, deslocação, alojamento, etc.), ao longo dos quais vão sendo recolhidos dados para mais tarde “tomar outras decisões”. “Este é um teste numa vila, mas queremos chegar a toda a ilha. O objectivo é crescer.” Está no site, aberto a todos os interessados: “Da Madeira para o mundo.”