Cápsulas e fantasias no debate entre Ana Gomes e Tiago Mayan
Papel dos privados na saúde dividiu candidatos. Mas os dois mostraram sintonia no procurador europeu. Ana Gomes comparou acusações de Costa a sociais-democratas aos argumentos que Orbán usa.
Não discordaram em tudo, mas fizeram questão de mostrar as profundas divergências entre as ideologias de cada um. No estúdio da TVI 24, Ana Gomes acusou Tiago Mayan Gonçalves de ter uma “visão fantasiosa” e de defender teses perversas neoliberais. O candidato a Belém da Iniciativa Liberal atirou que a concorrente às eleições de 24 de Janeiro vive “encapsulada”, colou-a ao PS e ainda lembrou os tempos em que andava “de braço dado com Sócrates.
Com a pandemia como pano de fundo, os dois candidatos mostraram coincidência de posições no que toca ao estado de emergência - ambos recusam a receita legal a que o Governo tem recorrido para enquadrar as medidas adoptadas. As diferenças entre os dois ficaram evidentes quando se falou sobre a resposta do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Tiago Mayan não retirou a “responsabilidade política” que atribuiu a Marta Temido pelas mortes de doentes não-covid, que Ana Gomes considerou “irresponsável e injusta”.
O candidato apoiado pela Iniciativa Liberal acusou também Ana Gomes de entrar numa “deriva para um projecto totalitário”, quando argumenta que parte das verbas gastas na resposta à pandemia vai para os privados no sector da saúde. E perguntou se a candidata pretende nacionalizar laboratórios e farmácias. Ana Gomes negou recusar a participação dos privados na resposta à pandemia, mas defendeu que esta tem de ser feita a “um preço de custo”. Ana Gomes acusou então Tiago Mayan de ter uma visão absolutamente fantasiosa que em lado nenhum foi aplicada “a não ser nos tempos da ditadura de Pinochet do Chile”.
No contra-ataque, o candidato liberal disse que Ana Gomes está “encapsulada numa realidade alternativa”, porque o SNS “está em colapso” e respondeu que a justa compensação dos privados “não é preço de custo”.
A corrupção foi outro tema que evidenciou diferenças, embora à partida os dois candidatos se tenham mostrado em sintonia. Ambos, se fossem Presidente da República, teriam vetado a lei da contratação pública. De resto, sobraram as divergências. Contra os “casos” de Ana Gomes, Tiago Mayan Gonçalves defendeu que o potencial de corrupção está “em cada carimbo” que o Estado põe. Ana Gomes disse que não fala apenas sobre processos e lembrou que faz “denúncias fundamentadas”. Tiago Mayan acusou Ana Gomes de “andar de braço dado com José Sócrates”, mas a socialista retorquiu que “desde muito cedo” contestou o ex-primeiro-ministro.
Ambos criticaram as acusações feitas esta quinta-feira pelo primeiro-ministro a três sociais-democratas de estes fazerem uma campanha internacional contra Portugal - a propósito da escolha do procurador europeu. “Soa-me demasiado ao tipo de argumentos que, por exemplo, Orbán usa para atacar quem o critica”, atirou Ana Gomes, acrescentando, porém, que Costa é “muito melhor” do que o primeiro-ministro da Hungria.