Portugal conquista mais duas estrelas Michelin: Ljubomir e Eneko
Guia Michelin revelou esta noite a lista de estrelas para os restaurantes da Península Ibérica: Portugal tem duas novas distinções, uma para o 100 Maneiras de Ljubomir Stanisic, outra para o basco Eneko Atxa.
São dois os novos restaurantes portugueses com estrela no Guia Michelin, ambos em Lisboa, segundo foi anunciado ao início da noite desta segunda-feira, na gala de apresentação do guia de 2021 para Espanha e Portugal. São eles o 100 Maneiras, de Ljubomir Stanisic, no Bairro Alto, e o Eneko Lisboa, do basco Eneko Atxa, que abriu portas há pouco mais de um ano no espaço do antigo Alcântara Café. Quanto ao mais, tudo como dantes.
Num ano que todos desejariam ter passado à frente, e a boa notícia já seria não haver notícia, a surpresa acaba por ser até o facto de os novos estrelados se concentrarem na capital, um deles com sotaque gastronómico até pouco português e com um historial de apenas alguns meses até ao início da pandemia que colocou a actividade literalmente de pernas para o ar. A estrela será, por isso, mais consequência do currículo e historial de Eneko Atxa em Espanha, onde detém um restaurante (Azurmendi) com a distinção máxima do guia, as três estrelas, e outros dois com uma estrela, todos no País Basco.
Quanto a Ljubomir Stanisic, passa-se precisamente o contrário. Depois de vários anos apontado como candidato ao estrelato, ainda na versão original do 100 maneiras, podia pensar-se que o mediático chef teria passado ao lado das opções dos inspectores do guia. Mais vale tarde que nunca, dirão agora os mais cépticos em relação aos critérios de avaliação.
“O trabalho dos inspectores em Espanha e Portugal deu os seus frutos, já que, tratando-se de um ano tão complicado para a hotelaria, continuamos a encontrar jovens valores e espaços inovadores que, cada vez mais com base no produto local e de proximidade, são capazes de nos oferecer autêntico prazer gastronómico”, disse Gwendal Poullennec, o Director Internacional dos Guias Michelin, na abertura da gala, que foi transmitida pela internet a partir da Real Casa dos Correios, no centro de Madrid.
Poullennec falou também de uma “frutuosa simbiose entre novos e consagrados cozinheiros” e de uma nova geração de cozinheiros que defendem “um regresso às origens num evidente compromisso com a sustentabilidade, um conceito em clara lógica de progressão”.
Neste sentido, uma das raras novidades da noite foi o anúncio da inclusão no guia de uma nova classificação, a estrela verde, que neste caso não resulta da avaliação dos inspectores, mas antes da adesão dos cozinheiros aos princípios da sustentabilidade e consumo de proximidade. “É um começo, uma espécie de incentivo aos restaurantes, para que adiram e comuniquem estes conceitos. Este ano temos já 21 estrelas verdes, todas de Espanha, mas o apelo é que os restaurantes portugueses nos comuniquem também estes novos conceitos”, disse ao PÚBLICO o responsável pela comunicação do guia, Angel-Pardo Castro.
Com as duas novas adições, Portugal passa a somar um total de 28 restaurantes com estrela, sete deles com duas estrelas, mesmo que seja ainda uma incógnita se todos vão sobreviver à tempestade perfeita que se abateu sobre o sector. No caso do São Gabriel, no Algarve, Leonel Pereira comunicou já no final de Novembro do ano passado o encerramento do restaurante, como consequência da venda do edifício, que será destinado a outros fins.
A boa notícia é que entretanto o novo espaço daquele que é dos mais experientes e consistentes chefs portugueses parece estar de novo no caminho da estrela, com o CHECKin, o espaço que abriu recentemente em Faro, onde pratica uma cozinha igualmente carregada de sabor mas mais acessível. O CHECKin é um dos cinco novos restaurantes portugueses a entrar na lista dos Big Gourmand, que o guia classifica como os espaços com a melhor relação entre qualidade e preço e que em tom de brincadeira se costuma dizer que são os restaurantes que os próprios inspectores Michelin escolhem quando são eles a pagar a conta.
Entre os outros quatro, dois têm igualmente assinatura de cozinheiros consagrados, o Semea by Euskalduna, na Baixa do Porto, de Vasco Coelho dos Santos – uma espécie de frouxa consolação para quem acreditava que a estrela cairia para o Euskalduna – , e o Avista Madeira, a nova versão mais acessível dos Il Gallo d’Oro (duas estrelas) e Benoît Sinthon. Os outros dois são O Frade, em Lisboa, na Ajuda, com excelente cozinha alentejana, e O Javali, em Bragança, à saída para Montesinho, dedicado à cozinha regional transmontana, sobretudo caça.
A Michelin destaca mesmo a quantidade e qualidade dos novos Bib Gourmand (os cinco portugueses e 48 em Espanha) como prova de que a gastronomia ibérica “tem músculo, se está a regenerar e a valorizar as origens”.
Num ano que o guia considera “um ano de transição”, e sem que tenha sido anunciado nenhum novo três estrelas, há em Espanha apenas três novos restaurantes com duas estrelas e mais 19 com uma estrela, a que se juntam os dois novos estrelados lisboetas.
Longe de qualquer sorte grande para Portugal, pode dizer-se que pelo menos teve a aproximação, já que a Galiza está em claro destaque entre as novidades da noite. Tem pela primeira vez um restaurante com duas estrelas – o excelente Coller de Pau, de Javier Oleros, no Grove, uma aspiração de décadas e que teve já contornos de quase tumulto contra o guia –, e ainda mais três novos restaurantes com uma estrela: O Eirado, na zona histórica de Pontevedra; Miguel Gonzalez, nos arredores de Ourense; e o Silabário, que já esteve na eurocidade de Tui-Valença, onde teve estrela durante três temporadas, e se mudou para um atraente miradouro envidraçado em Vigo que agora reconquista o brilho estrelar. Uma aproximação que se estende também a Salamanca, com a atribuição de uma estrela ao restaurante En la Parra.
Num ano absolutamente atípico, os responsáveis do guia confidenciaram ao PÚBLICO que as avaliações começaram em Setembro de 2019, pelo que, quando em Março foi decretado o confinamento, cerca de 60% do trabalho já estava realizado. O período de paragem foi aproveitado para contactos com os restaurantes e trocas de informações entre os inspectores, que regressaram às visitas a partir de 22 de Julho.
Com todos os constrangimentos, o guia, que normalmente fecha na primeira semana de Agosto, acabou por ficar este ano concluído na primeira semana de Outubro.