Paulo José Miranda e José Luís Peixoto na RTP 1, os primeiros Herdeiros de Saramago
A série documental que retrata os escritores de língua portuguesa vencedores do Prémio José Saramago, com autoria de Carlos Vaz Marques e realização de Graça Castanheira, estreia-se nesta segunda-feira em horário nobre. E todos os episódios ficam já disponíveis na RTP Play para os mais curiosos.
Nesta segunda-feira, 16 de Novembro, em que se celebram os 98 anos do nascimento do escritor José Saramago (1922-2010), estreia-se na RTP 1, às 22h30, a série documental Herdeiros de Saramago, com autoria de Carlos Vaz Marques e realização de Graça Castanheira.
Dois dos onze episódios desta série produzida pela Midas Filmes, filmada em Portugal, no Brasil e em Angola, e que retrata a obra e o quotidiano dos 11 escritores de língua portuguesa já distinguidos com o prémio bienal que homenageia o Nobel da Literatura português, criado pela Fundação Círculo de Leitores em 1999, serão exibidos esta noite, o que se repetirá todas as semanas até 21 de Dezembro, quando passará o último.
A ordem pela qual os episódios de 25 minutos serão transmitidos respeita a cronologia da atribuição do prémio. Na estreia irão para o ar os episódios que têm como protagonistas Paulo José Miranda (recebeu-o em 1999) e José Luís Peixoto (em 2001), seguindo-se, a 23 de Novembro, a brasileira Adriana Lisboa (em 2003) e Gonçalo M. Tavares (em 2005), e, a 30 Novembro, Valter Hugo Mãe (em 2007) e João Tordo (em 2009). A 7 de Dezembro, é a vez de a brasileira Andréa del Fuego (em 2011) e o angolano Ondjaki (em 2013), a 14 de Dezembro, Bruno Vieira Amaral (em 2015) e o brasileiro Julián Fuks (em 2017), e a 21 de Dezembro, o do mais recente premiado, Afonso Reis Cabral (em 2019). Mas todos os episódios da série ficam já disponíveis a partir desta segunda-feira na RTP Play.
Pilar del Río, presidente da Fundação Saramago, na conferência de imprensa de apresentação da série lembrou que “estes jovens não são só vanguarda em Portugal, são vanguarda na literatura universal” e notou que, como se percebe na série “são pessoas em movimento” e “quando estamos em marcha é provável que cheguemos” a algum lugar.
“É engraçada essa ideia de movimento”, pegou depois na mesma ideia o director de programas da RTP1 e RTP Internacional, José Fragoso, “porque quando se pensa em programas de televisão sobre literatura temos tendência para um determinado arquétipo e o que temos neste projecto foge completamente e dá essa ideia de vida, de liberdade, até de movimentos e de acção que está em cada um dos documentários”.
Leitor antes de ser escritor
Com as mãos no volante, a viajar de carro para a vila alentejana onde nasceu, Galveias, o escritor José Luís Peixoto está a contar-nos que não faz questão de mostrar as suas tatuagens e os seus piercings. Recorda que em 2008, quando participou na Festa Literária Internacional de Paraty (FLIP), no Brasil, causou espanto ser um “escritor tatuado”, mas isso é “absolutamente irrelevante” hoje em dia. “Ser conhecido como o escritor tatuado não é o melhor cartão-de-visita, prefiro ser conhecido como o escritor que ganhou o Prémio José Saramago”, continua o autor de Nenhum Olhar, romance com que se tornou o segundo escritor com menos de 35 anos a receber o Prémio José Saramago em 2001.
“Não se aprende a escrever para se ser escritor. Mais do que um escritor sou um leitor”, confessa Paulo José Miranda, o primeiro vencedor do Prémio José Saramago, com o romance Natureza Morta, sentado numa mesa ao pé do Tejo, perto de Cacilhas. “Foi aqui que domestiquei muitos livros”, recorda no primeiro dos episódios de Herdeiros de Saramago e conta que com o dinheiro do Prémio José Saramago comprou uma câmara de filmar para a sua namorada da época, a cineasta turcaPelin Esmer, que com ela fez os seus primeiros filmes e foi premiada em 2006 no Tribeca Film Festival, bem como no IndieLisboa (em 2010), festival onde em Setembro passaram quatro episódios desta série.
Em Setembro, Carlos Vaz Marques, que foi editor da revista portuguesa Granta e dirige a colecção de viagens da Tinta-da-China, explicou ao Ípsilon o que o levou a imaginar este projecto: a escassez de documentos audiovisuais dos mais importantes escritores portugueses do século XX, de alguns só temos testemunho visual em idade avançada, muito depois do tempo em que escreveram as suas obras mais importantes. O autor e a realizadora Graça Castanheira, autora de Angst, A Casa e a Cidade ou O Tempo e o Modo quiseram “com este conjunto de filmes documentais na primeira pessoa do singular, documentar de um modo próximo — em retratos íntimos e afectivos — alguns dos escritores que estão, neste momento, a construir o futuro da literatura em língua portuguesa”. A “ousadia aqui”, disse a realizadora ao Ípsilon, foi pegar nas ideias de Carlos Vaz Marques e estabelecer “um novo modelo” de documentário biográfico, que não é cronológico e se centra no mundo de relações de cada escritor. Como cada um se relaciona “com o seu mundo de afectos: não só as pessoas, mas os seus cafés, os seus jardins, a cidade.”
Quiseram trabalhar a ideia do desejo, para se ficar a desejar conhecer melhor aquela pessoa, aqueles livros. “Os escritores parecerem muito tangíveis, muito alcançáveis; não quisemos uma coisa muito glorificada do autor. São pessoas que andam no mundo, que se inscrevem nas paisagens e escrevem livros”, acrescentou Graça Castanheira. “No fundo, é uma forma de aproximação a pessoas que têm talento, que fizeram coisas valiosas, e de que queremos aproximar-nos para conhecermos melhor também aquilo que eles escreveram”, rematou ao Ípsilon em Setembro Carlos Vaz Marques.