Eduardo Salavisa sentou os amigos todos num cadeirão — e, calmamente, desenhou-os

Eduardo Salavisa
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Vemos primeiro o cadeirão vazio. Imaginamos logo que seja reconfortante, as almofadas prontas a engolir quem tira as medidas à sala, ansioso, à espera que lhe mostrem um sítio para ficar. Estamos certos. Página a página, o cadeirão que conhecemos no início do livro enche-se de gente. Não todos em cima uns dos outros — em Caderno de Retratos - Memórias Imperfeitas, cada virar de página traz um amigo novo.

Como amigos que são, tanto chegam às 10h30 de uma segunda-feira, como às 18h de um sábado ou a muitas outras horas de muitos outros dias que Eduardo Salavisa, confesso viciado do “registo sistemático do quotidiano”, registou, escrevendo também o nome e uma pequena descrição de cada visitante. “As memórias destes momentos em que amigos meus me visitaram no momento terminal da minha vida foram registados por um desenho. Ambos, a memória e o desenho, são imperfeitos”, avisa.

No livro cabem 93 retratos de pessoas que lhe “foram aparecendo na sala” durante o Verão. São antigos alunos, vizinhos, família, amigos próximos e amigos que voltou a ver depois de muito tempo, outros urban sketchers com quem se encontra para irem desenhar. Podiam ser pessoas “que gostava que tivessem aparecido, mas não apareceram”. “Desconfio que muita gente apareceu para me dar um último abraço”, diz.

Do autor, ficamos com um retrato escrito por um dos visitantes mais frequentes, o ilustrador João Catarino, que o descreve assim: “Pernas ligeiramente afastadas, caderno A6, ponta preta 0,5, imersão absoluta, dez minutos de tensão, ansiedade controlada, mas não por prazer, desenhos para ninguém, talvez por nada, possivelmente para nada.” Estes deram um livro (Edições Afrontamento) e uma exposição.

O cadeirão mudou-se temporariamente para o Museu Bordalo Pinheiro, em Lisboa, acompanhado por alguns desenhos que ficam expostos até domingo, 8 de Novembro. “Por acaso, já sinto um vazio na sala, sem ele”, ri-se. Ficam as conversas congeladas em mais um diário gráfico, desta vez com mais quotidiano do que viagens, memórias de “amizade e cumplicidade” preenchidas a aguarela e canetas Tombow com tinta aguarável. Espera que sejam verdadeiras. “Quando a morte está próxima, as pessoas exageram sempre”, suspeita.

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