Os fãs de tatuagens no Japão estão a perder o medo de as mostrar

São impedidos de entrar nas praias, nos spas ou resorts. São associados a gangues ou drogas. Mas os japoneses estão a perder o medo de mostrar o que escondem debaixo da roupa. “Uma tatuagem fica contigo até que sejas cremado ou enterrado. Esse é o encanto.”

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Kim Kyung Hoon

Shodai Horiren fez a sua primeira tatuagem, uma cotovia, numa viagem à Austrália há quase três décadas. Agora, tatuada da cabeça aos pés, até no escalpe rapado, é uma das tatuadoras de renome do Japão. “A tua casa fica velha, os teus pais morrem, acabas um relacionamento com o teu amante, as crianças crescem e vão embora”, diz Horiren, de 52 anos, que recebe a Reuters no seu estúdio no norte de Tóquio. “Mas uma tatuagem fica contigo até que sejas cremado ou enterrado. Esse é o encanto.”

Horiren pertence uma tribo cada vez maior de pessoas orgulhosamente aficionadas por tatuagens e que desafiam os tabus que as relacionam com o crime, transformando a sua pele em vívidas paletas de cor, com desenhos elaborados por todo o corpo, normalmente retratando personagens de lendas tradicionais.

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Shodai Horiren reza em frente ao seu altar antes de tatuar um cliente no seu estúdio em Warabi. Kim Kyung Hoon

Banidos de spas, resorts, algumas praias e muitos ginásios e piscinas, os entusiastas esperam que a presença de atletas tatuados de outros países na Taça do Mundo de Râguebi e os Jogos Olímpicos do próximo ano em Tóquio — adiados devido à pandemia de covid-19 — possam ajudar a acabar com os preconceitos.

“Se vires os All Blacks a fazerem o haka com todas as suas tatuagens, o teu coração vai bater mais depressa”, afirma Horiren, referindo-se à equipa de râguebi da Nova Zelândia e à sua cerimónia antes de um jogo. “Os jogadores de basquetebol também têm muito estilo. Mas lá [na Nova Zelândia], até os pugilistas se cobrem de base.”

Hiroyuki Nemoto usa uma vestimenta tradicional japonesa, chamada "fundoshi", enquanto brinca com a sua filha. Kim Kyung Hoon
Hiroyuki Nemoto usa uma vestimenta tradicional japonesa, chamada "fundoshi", enquanto brinca com a sua filha. Kim Kyung Hoon
Hiroyuki Nemoto posa no seu local de trabalho. Kim Kyung Hoon
Hiroyuki Nemoto posa no seu local de trabalho. Kim Kyung Hoon
Pessoas no encontro anual Irezumi Aikokai (Associação de Amantes de Tatuagens). Kim Kyung Hoon
Hiroshi Yoshimura tira objectos da sua varanda em Tóquio. "Normalmente cubro-as, para que ninguém diga que eu tenho tatuagens. Mas se estou a passear, a andar de comboio, ou algo assim, a polícia para-me e pede-me para subir as mangas, para ver se estou a consumir drogas ou se pertenço a um gangue." Kim Kyung Hoon
Hiroyuki Nemoto veste um "fundoshi" com ajuda de um amigo, para participar no Irezumi Aikoka. Kim Kyung Hoon
Um homem observa tatuagens durante o Irezumi Aikoka. Kim Kyung Hoon
Hiroki Takamura no Irezumi Aikoka Kim Kyung Hoon
Mina Yoshimura, esposa de Hiroshi Yoshimura, toca na nova tatuagem do marido. "Se eu tivesse tatuagens e ele não, ele poderia ir a sítios que eu não posso. Mas uma vez que temos os dois, podemos ir a qualquer lado juntos. Acho que isso é bom." Kim Kyung Hoon
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Hiroyuki Nemoto usa uma vestimenta tradicional japonesa, chamada "fundoshi", enquanto brinca com a sua filha. Kim Kyung Hoon

As tatuagens foram associadas a criminosos por 400 anos, mais recentemente aos membros do gangue Yakuza, que têm os corpos cobertos de tatuagens até perto das mãos e dos pescoços, permitindo que fiquem escondidas debaixo da roupa. No entanto, com a popularidade da música rock ocidental e a aceitação de músicos em relação a tatuagens, este preconceito tem sido derrubado.

Em 2019, uma decisão do tribunal determinou que as tatuagens eram decorativas, e não procedimentos médicos, o que ajudou a clarificar o seu estatuto jurídico, até então tido como obscuro. Tal pode significar uma mudança de atitude — e, talvez, levar a indústria a regular-se, dando-lhe uma imagem mais mainstream.

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A utilização do nome “tatuagens”, em vez de “irezumi” — que significa literalmente “inserir tinta”, — está a tornar-se mais comum, o que pode ajudar a dar-lhes uma nova imagem.

“Algumas pessoas fazem tatuagens por razões profundas, mas eu faço-as porque as acho bonitas — da mesma forma que posso comprar uma blusa bonita”, diz Mari Okasaka, 48 anos, uma trabalhadora em part-time que fez a primeira tatuagem aos 28 anos. O seu filho de 24 anos, Tenji, está a cobrir o corpo de tinta e cor.

Uma modelo de tatuagens, Yuki, numa performance. Kim Kyung Hoon
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Uma modelo de tatuagens, Yuki, numa performance. Kim Kyung Hoon

Os devotos das tatuagens estão “a sair do armário” e encontram-se em grandes festas para partilhar os seus desenhos. “Podemos ter tatuagens, mas somos pessoas alegres”, sublinha o organizador de uma festa e trabalhador numa sucata, Hiroyuki Nemoto. Ainda assim, o surfista e criador de sets de televisão Takashi Mikajiri é parado em algumas praias e ordenam-lhe que se cubra.

Rie Yoshihara, que trabalha numa loja de quimonos, conta que o pai ainda não viu as suas costas cobertas de tatuagens, e Okasaka usa camisolas de manga comprida para levar o lixo para que os seus vizinhos não comentem. “Na América, se tens uma tatuagem, as pessoas não querem saber. Não há qualquer reacção”, diz Mikajiri. “Isso é o ideal. Seria muito bom que isso fosse algo garantido aqui.”

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Takashi Mikajiri diz: "Se eu já tive problemas nas praias por causa das tatuagens? Sim, definitivamente. Se não as esconder, não posso entrar na praia." Kim Kyung Hoon
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