Faltavam poucos minutos para que Liu Wenli, professora universitária em Pequim, fizesse a sua apresentação num webinar sobre o desenvolvimento da educação sexual na China quando soube que os legisladores do país decidiram tornar a matéria obrigatória, já a partir do próximo ano. Rapidamente adicionou um novo diapositivo à apresentação, segundo o grupo de WeChat que conta com outros investigadores, e adicionou essa informação. A inclusão da disciplina de educação sexual nas escolas é uma luta que a professora e os colegas mantêm há muito.
Em 2017, um conjunto de manuais que Liu Wenli editou foram retirados de uma escola depois de terem surgido queixas sobre conteúdo explícito e de que os livros normalizavam a homossexualidade. Agora, o Governo chinês declarou que as escolas, incluindo as do pré-escolar, devem abordar “educação sexual de forma apropriada à sua idade para a aumentar a consciencialização e capacidade de se protegerem contra o abuso e agressão sexual”, cita a Reuters.
A hashtag sobre a mudança acumulou mais de 25 milhões de visualizações na plataforma chinesa Weibo, semelhante ao Twitter. Durante a apresentação de Liu, a caixa de comentários foi inundada com mensagens que celebravam o marco, referiu um desses participantes.
Apesar de o Governo já ter apresentado políticas relacionadas com educação sexual ao longo das últimas décadas, a sua implementação tem sido limitada. Os apoiantes afirmam que o pouco que tem sido ensinado nas escolas fica aquém da ciência moderna. Alguns apelam para que se vá além da biologia e se ensine os estudantes a lidar com relacionamentos e sexualidade.
Falta saber como
Para já, mantém-se pouco claro como será implementada a lei que entra em vigor a 1 de Junho de 2021. Na visão de Li Hongyan, da Unesco em Pequim, e que tem feito pressão a favor da mudança, o Governo chinês é cauteloso no que toca a fazer alterações na educação, sobretudo quanto à sexualidade, que poderá ser vista como uma promoção da individualidade ou gerar contestação.
Assim, muitos dos apoiantes apontam para que se sigam as directrizes da Unesco. Contudo, mantém-se a discussão se devem ser adoptadas directrizes internacionais ou uma forma de “educação sexual com características chinesas”, explica Liu Chong, investigador na Universidade de Leeds, no Reino Unido.
Os resultados de um inquérito publicados este ano pela Associação Chinesa de Planeamento Familiar e pela Universidade de Tsinghua, revelam que 52% dos mais de 54 mil estudantes que participaram no estudo disseram que receberam educação sexual. Contudo, Hu Jiawei, fundador de uma associação que promove a educação sexual, revela que foi frequentemente rejeitado por escolas quando, em 2013, começou a voluntariar-se para abordar este tema com os alunos. Apesar disso, tem observado um crescimento na procura dos seus serviços, o que atribui, em parte, ao maior número de casos de abuso sexual de crianças, reportados nos últimos anos. “Com mais tragédias, naturalmente percebe-se a importância da educação sexual”, avalia.