OCDE: jovens portugueses dos mais interessados em saúde pública e pandemias
Os jovens portugueses são dos mais interessados em saúde pública e pandemias, segundo o relatório PISA, que inquiriu milhares de jovens de 15 anos de idade de 63 países. Em Portugal, 75% dos estudantes disseram seguir eventos mundiais através das redes sociais, mas o estudo da OCDE mostra que os jovens não conseguem distinguir entre factos e opiniões, quando estão a ler na Internet.
Os estudantes portugueses são dos que mais se preocupam com assuntos globais, com destaque para temas de saúde pública e para as pandemias, segundo um inquérito da OCDE feito em 2018, ou seja, muito antes de a pandemia ter trazido aqueles temas para cima da mesa. Esta é uma das conclusões do VI relatório do Programa Internacional de Avaliação dos Alunos (PISA), divulgado esta quinta-feira, que se concentrou em perceber se os jovens têm as competências necessárias para viver num mundo interconectado, através de respostas de milhares de alunos de 15 anos de 63 países.
No relatório Estarão os jovens preparados para prosperar num mundo interligado?, os investigadores procuraram avaliar o interesse dos alunos em assuntos globais, mas também interculturais e locais. Através das respostas dadas durante a realização das provas do PISA 2018, foi possível delinear um índice de consciência das questões globais. Em causa estavam sete questões: mudanças climáticas e alerta global, saúde global, migração, conflitos internacionais, fome ou desnutrição, causas da pobreza e igualdade entre homens e mulheres. Os estudantes portugueses surgem em quinto lugar na preocupação com assuntos globais, só ultrapassados pelos alunos da Albânia, Grécia, Lituânia e Malta.
Os assuntos que menos atraíam os jovens em 2018 eram precisamente os temas de saúde, tais como as pandemias, e os conflitos internacionais. Apenas cerca de 65% disseram estar familiarizados com estes dois temas. No entanto, os portugueses voltaram a destacar-se no que toca à consciencialização sobre questões de saúde pública, como pandemias. Em primeiro lugar surgiram os alunos da Albânia, seguindo-se a França, Grécia, Hong Kong (China), Lituânia e, finalmente, Portugal (mais de 70%). Já os estudantes da Argentina, Áustria, Brunei Darussalam, Indonésia, Coreia, Líbano, Arábia Saudita e República Eslovaca eram os menos cientes desta problemática.
Tendo em conta as respostas de todos os alunos, o estudo mostrou que as raparigas se preocupavam mais com estas questões, assim como foi entre os alunos de estatuto socioeconómico mais elevado que se notou mais este interesse.
A igualdade de género foi o tema que uniu mais jovens: 83% dos alunos da OCDE disseram conhecer bem ou estar familiarizados com o tema. A migração, as alterações climáticas, as causas da pobreza e fome, assim como a subnutrição em algumas regiões do mundo, foram outros dos temas com que 78% dos jovens afirmaram estar familiarizados.
O mesmo questionário foi feito aos pais, que revelaram mais preocupação do que os filhos com os problemas globais. Curiosamente, no cruzamento de dados, notou-se a influência parental nas atitudes dos jovens. O relatório revelou, aliás, que a transmissão transgeracional de atitudes tem mais força do que o estatuto socioeconómico. Os pais que se interessam em aprender sobre outras culturas, por exemplo, tendem em transmitir esse interesse aos filhos. Os casos mais visíveis desta transmissão transgeracional foram observados no Brasil, Chile, República Dominicana, Coreia, México e Portugal.
O PISA é o maior inquérito sobre educação a nível mundial, no qual participaram em 2018 cerca de 600 mil alunos de 15 anos de 79 países ou economias. E os alunos portugueses mostraram que estão entre os jovens com mais vontade de agir para o bem-estar colectivo. Defender um colega cuja dignidade está a ser ameaçada, iniciar uma campanha na escola sobre questões ambientais, divulgar um ponto de vista pessoal sobre a crise dos refugiados nas redes sociais ou tomar medidas para evitar a propagação de um vírus fatal são algumas das acções sugeridas no relatório.
Os portugueses destacam-se ao surgirem num grupo restrito de estudantes de 12 países, por estarem entre os que mais sentem fazer parte da comunidade que os rodeia e por serem os mais responsáveis pelo bem-estar dessa mesma comunidade. Além de Portugal, surgem os alunos de escolas na Albânia, Azerbaijão, Costa Rica, Jordânia, Coreia, Kosovo, Malta, Singapura, Espanha e Turquia. “Esta dimensão concentra-se no papel dos jovens como membros activos e responsáveis da sociedade e tenta perceber a sua prontidão para responder a uma determinada questão ou situação local, global ou intercultural”, refere-se no relatório.
No entanto, quando analisado o número de acções que cada estudante fez pelo bem-estar colectivo e desenvolvimento sustentável, os valores são muito baixos. Portugal fica acima da média da OCDE, mas não ultrapassa as quatro acções por aluno. A Jordânia surge em primeiro lugar com uma média a rondar as 5,5 acções por estudante. Segundo os investigadores, os alunos que desejam agir estão envolvidos na melhoria das condições de vida das suas comunidades e na “construção de um mundo mais justo, pacífico, inclusivo e ambientalmente sustentável”.
Falta uma “bússola”
Os estudantes mostraram-se mais propensos a relatar que agem em relação ao consumo de energia. A segunda actividade mais comum foi acompanhar eventos mundiais através das redes sociais. Em Portugal, aliás, mais de 75% dos estudantes disseram seguir eventos mundiais através das redes sociais, mostra o estudo, que a OCDE realiza a cada três anos, com base em inquéritos a alunos com 15 anos de idade e que mostra que os jovens não conseguem distinguir entre factos e opiniões, quando estão a ler na Internet. “Menos de um em cada dez estudantes dos países da OCDE consegue distinguir entre facto e opinião, com base em pistas implícitas relativas ao conteúdo ou fonte das informações”, revela o documento. Se, no passado, os alunos se guiavam pelos manuais “cuidadosamente seleccionados e aprovados pelo Governo e podiam confiar que essas respostas eram verdadeiras”, nos dias de hoje encontram online centenas de milhares de respostas para as suas perguntas.
E, porque a inteligência artificial (IA) é “eticamente neutra”, e por isso tanto pode amplificar as boas ideias como as más, os autores do relatório sublinham que é preciso que os jovens consigam cruzar as informações que recolhem com os seus valores e com as suas aptidões cognitivas, sociais e emocionais.
Para os investigadores do PISA, cabe à Educação o papel de ajudar: “A Educação do futuro não consiste apenas em ensinar as pessoas, mas também em ajudá-las a desenvolver uma bússola confiável para navegar num mundo cada vez mais complexo, ambiguo e volátil.”