Porque precisamos de arquitectura?

A importância da arquitectura na sociedade está longe de estar esquecida, quando a Presidente da Comissão Europeia, Ursula Von Der Leyen, referiu que a recuperação da pandemia na Europa pode passar por uma nova Bauhaus.

Foto
Tomás Reis

A pergunta pode parecer exagerada, mas podia ser mais frequente, quando se fala no trabalho em arquitectura ou no reconhecimento do valor da arquitectura na sociedade. Neste mês de Outubro, Mês da Arquitectura, num ano marcado pela pandemia, esta reflexão pode ser ainda mais relevante.

Por alguma razão, a arquitectura está presente nos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU): do acesso à habitação digna, para erradicar a pobreza e esbater as desigualdades, à construção de escolas para promover a igualdade de género e a alfabetização. O Objectivo 11 refere mesmo a construção de cidades sustentáveis. É uma tarefa imensa, que requer cooperação internacional sem precedentes, mas, felizmente, não faltam propostas de arquitectos, em Portugal e noutros países, para alcançar os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável.

A importância da arquitectura na sociedade está longe de estar esquecida, quando a Presidente da Comissão Europeia, Ursula Von Der Leyen, referiu que a recuperação da pandemia na Europa pode passar por uma nova Bauhaus, em que o desenho de “arquitectos, artistas, estudantes, engenheiros e designers” nos leve a repensar a forma como vivemos, à luz dos desafios actuais de sustentabilidade.

Como se pode imaginar, não basta pensar em objectivos globais para trabalhar em arquitectura. Existe uma constante necessidade de adaptação, dia após dia. Porque a tecnologia também altera a forma de trabalhar. De tal modo que hoje, o estirador é apenas memória, quando há apenas 20 anos, era a mesa onde se faziam os desenhos técnicos. Hoje há novas tecnologias, como o desenho paramétrico ou algoritmos que geram plantas arquitectónicas. Nesta crescente automatização, trabalhar em BIM, modelos de construção, parece ser uma aposta. Mas haverá sempre uma decisão humana, na forma como fazemos objectos, edifícios ou cidades. A diferença estará, cada vez mais, no nível de informação presente nos processos de escolha, juntando áreas tão díspares como psicologia ou ciência de materiais.

Estará a digitalização a afastar as pessoas da arquitectura? No exemplo da resposta à pandemia, o confinamento em casa e o teletrabalho recordam a importância dos espaços que habitamos para o nosso bem-estar. E agora, mais do que nunca, precisamos de espaços de encontro que sejam seguros e confortáveis. Mais do que nunca, as cidades pedem mais visitantes, nos cafés e nas esplanadas. O tempo de lazer e de exercício físico é, muitas vezes, sinónimo de ar livre e nem mesmo as marcas que vendem online prescindem de lojas e balcões, onde tenham contacto físico com os clientes. Nem mesmo a Apple, com as suas lojas desenhadas por Norman Foster.

Poderá parecer que o tempo em que estamos online, entre jogos e redes sociais, nos faz desligar do que está à nossa volta. Mas a resposta só pode passar por mais arquitectura. É certo que jogos de realidade aumentada trazem jogadores de todas as idades à rua, de telemóvel na mão. Mas também é preciso criar lugares - ou placemaking, na expressão anglófona. Se precisamos de boas razões para sair do conforto caseiro, é preciso que os lugares nos façam ir dar uma volta, ter um espaço de encontro, ou uma razão para ir ao fim da rua e voltar.

É certo que os dias são exigentes, porque a pandemia também fez mudar planos. Mas o lugar da arquitectura na sociedade, em vez de desaparecer, parece estar a mudar. Para criar lugares que “valham a pena", tudo depende da colaboração entre diferentes áreas. Afinal, todos fazemos cidade, todos fazemos território.
 

Sugerir correcção