Land Rover Defender, o renascimento de um ícone
Depois de o modelo ter feito história há quatro anos, com uma cerimónia que marcou a saída da derradeira unidade da fábrica, eis que surge uma nova vida para o Defender, menos agressiva para o ambiente e ainda mais capaz no todo-o-terreno.
Podia ter sido combinado que não calharia tão bem: um frente a frente entre duas vidas (poderia chamar gerações, mas não seria tão adequado) de um dos mais icónicos modelos do todo-o-terreno. Cereja no topo do bolo: ter por companhia alguém que fez do off-road uma forma de vida, o fundador da Revista Todo Terreno, Alexandre Correia, que também se dedica a desbravar caminhos para construir road-books.
O primeiro contacto com o Land Rover Defender fez-se sob o impiedoso sol que ilumina os caminhos entre Lisboa e Santarém, num dia em que o termómetro do carro chegou a marcar uns fustigantes (e inacreditáveis) 47 graus.
Nascido para dar continuidade à filosofia dos Land Rover series, originalmente apresentados em 1948, o Defender foi construído entre 1983 e 2016, altura em que a marca decidiu o fim da produção. O último Defender, um 90 de tejadilho em lona, saiu da linha de produção de Solihull às 9h22 de 29 de Janeiro — um momento assinalado com pompa e circunstância e acompanhado por milhões em todo o mundo.
A decisão foi tomada depois de analisadas duas questões que tornavam a produção do Defender impraticável: o tempo que cada unidade demorava a construir e as emissões de CO2 numa altura em que as regras europeias ditam multas pesadas para os mais poluentes. Porém, nunca esteve em cima da mesa o desaparecimento de tão icónico modelo. “Temos a tecnologia, a capacidade de engenharia, de inovação e de design para evoluir o Defender”, citou a Reuters na altura da produção do último modelo. E assim foi. Não há uma nova geração, mas uma nova vida — é até difícil encontrar o velho Defender neste novo. Pelo menos à primeira vista.
Por fora, o novo modelo suscita-me algum desânimo, não conseguindo pôr de lado a imagem do seu antecessor, que ocupa ainda um lugar na mente. Mais ainda quando, por uma coincidência, nos cruzamos com um familiar da antiga vida do Defender, depois de termos entrado por uma propriedade privada – algo que até há uns anos era muito comum, mas o pouco respeito de quem está de passagem acabou por ditar o encerramento de portões, mesmo quando colocados em caminhos públicos. Aqui não era o caso de estarmos a percorrer um caminho público, mas, diz-nos quem nos interpela pelo caminho, é comum entrar nestes terrenos gente a fazer pilhagem, roubando a cortiça dos sobreiros, sem muitas vezes saber como o fazer, acabando por condenar a árvore à morte.
Não só não era o nosso caso como acabaríamos por receber carta-branca para voltar sempre que quiséssemos brincar por estas terras. E, entre uma perseguição e um convite, houve tempo para colocar os dois modelos lado a lado para discorrer sobre as maravilhas de um e os prodígios de outro. Não poderia ser de outra forma entre fãs do Defender — ou, antes, do que o modelo representa.
Um carro para o pior
Em termos estéticos, já o escrevi, as linhas ultramodernas a quererem resgatar o passado não me convencem. Mas quando chegamos ao momento de testar as capacidades deste Defender tudo muda de figura. É que o revivalismo pode ser um modo de vida, mas quando se põem à prova passado e presente percebe-se claramente as vantagens de viver no segundo, não obstante todo o charme que envolve o primeiro.
E se a aquisição de um automóvel se fizesse com juras de casamento, o novo Defender, no nosso caso, um 110 P400, seria o 4x4 para ter “na saúde”, mas sobretudo “na doença”. É que é pelos piores trilhos que ele se revela mais fiel, não nos deixando duvidar por um segundo que seja que o fim da aventura será sempre marcado por um final feliz.
Para tal, contribui uma carroçaria e plataforma construídas integralmente em alumínio, reduzindo o peso e incrementando a robustez, mas também a panóplia de tecnologia, com um evoluído sistema Terrain Response, assim como as credenciais para todo-o-terreno: graças a uma suspensão pneumática independente de amortecimento variável a altura ao solo vai de 218mm a um máximo de 291mm e os ângulos atingem máximos de 38,0º (ataque), 40,0º (saída) e 28,0º (ventral), sendo a capacidade máxima de passagem a vau de 90cm.
Já ao nível mecânico, mesmo durante este curto contacto de algumas horas, o Defender 110 P400 não desapontou, ainda que chegue muito menos agressivo (dizer amigo será abuso…) para o ambiente, com emissões de CO2 de 259 g/km.
Com um motor a gasolina de seis cilindros em linha e uma capacidade de 3,0 litros, apoiado por um sistema mild-hybrid de 48 V, este 4x4 não serve apenas para andar fora de estrada e por caminhos turbulentos, revelando-se competente noutros traçados: são 400cv e um torque de 550 Nm (importante: disponível logo às 2000rpm) a admitirem uma aceleração de 0 a 100 km/h em 6,1 segundos e uma velocidade máxima de 191 km/h. De acordo com as medições WLTP, o consumo combinado médio é de 11,2 l/100 km — algo a confirmar (ou não) num ensaio mais demorado que este carro merece. É aguardar pelos próximos capítulos...