Vodafone ameaça boicotar leilão do 5G se regras não mudarem

A operadora considera que o projecto de regulamento da Anacom tem regras ilegais e a Nos concorda. Regulador rejeita as críticas e diz que está a pensar em benefícios para os consumidores. Já o Governo diz aguardar publicação do regulamento final.

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A dias de serem conhecidas as regras do leilão, aumenta a pressão das empresas de telecomunicações REUTERS/Ina Fassbender

A Vodafone está disposta a não participar no leilão das frequências para a quinta geração móvel (5G), que a Anacom conta iniciar este mês. Segundo a Reuters, o projecto de regulamento que o regulador das comunicações apresentou em Fevereiro, e cuja versão final deverá ser conhecida em breve, tem regras que a empresa de telecomunicações considera ilegais e discriminatórias.

“Perante uma significativa e injustificada discriminação contra os operadores já estabelecidos, somos obrigados a reconsiderar todas as nossas opções em Portugal, incluindo licitar menos espectro, ou não licitar de todo”, afirmou a líder executiva da Vodafone para o mercado europeu, Serpil Timuray.

“Acreditamos que a proposta de distribuição de espectro [da Anacom] é ilegal, à luz da legislação portuguesa e europeia”, disse ainda à Reuters,

Numa declaração escrita enviada a esta agência noticiosa, a entidade reguladora presidida por João Cadete de Matos rejeitou as acusações de discriminação, considerando que o regulamento está pensado para “gerar benefícios para a concorrência e os consumidores, criando condições para a entrada no mercado de operações novas e diversificadas”.

O regulador esclareceu que está a analisar os comentários ao projecto de regulamento recebidos na fase de consulta pública e que não há decisões finais. Ainda esta quinta-feira o jornal online Eco noticiou, citando fonte oficial da Anacom, que esta conta “aprovar o regulamento e dar início ao processo do leilão este mês”.

Governo espera pela Anacom

A Vodafone já se queixou à Comissão Europeia sobre a proposta de regulamento, que prevê um desconto de 25% no preço final do espectro que venha a ser atribuído a novos operadores nas faixas dos 900 MhZ e 1800 Mhz. Também reserva uma parte das frequências precisamente para as empresas que ainda não têm operações móveis estabelecidas no mercado.

Estas condições são criticadas pela Meo, Nos e Vodafone e desencadearam pedidos de esclarecimento da Direcção-geral da Concorrência da Comissão Europeia à secretaria de Estado das Comunicações, que confirmou anteriormente ao PÚBLICO estar “a analisar o tema, juntamente com a Anacom”.

Em causa pode estar a “potencial existência de auxílios de Estado que decorrem da adopção do projecto de regulamento da Anacom na redacção que foi submetida a consulta pública”, confirmou a Secretaria de Estado. Nesta quarta-feira, o gabinete do secretário de Estado das Comunicações, Hugo Santos Mendes, esclareceu ao PÚBLICO que ainda não foram enviadas a Bruxelas as respostas pedidas e que “o Governo aguarda que a Anacom publicite a versão final” do regulamento.

Numa intervenção recente, o governante salientou que o 5G será uma tecnologia “absolutamente essencial” e transformadora nos sectores da indústria e serviços e que é preciso “alinhar interesses” entre os vários actores.

“Estamos condenados a entendermo-nos”, sublinhou, referindo-se ao Governo, aos operadores e à Anacom, além dos parceiros tecnológicos e autarquias.

Obrigação “inaceitável"

O projecto de regulamento não exige aos operadores “entrantes” obrigações de cobertura e de desenvolvimento de rede e cria a obrigação, às empresas já estabelecidas e que adquiram espectro para o 5G (700 Mhz e 3,6 GHz), de garantir aos novos concorrentes o acesso negociado às suas redes.

Para a Vodafone, que investiu 1600 milhões de euros em Portugal (onde é presidida por Mário Vaz) nos últimos seis anos, esta obrigação “é completamente inaceitável” e significaria que o fardo de desenvolver a rede teria de ser suportado pelos actuais operadores, sublinhou Serpil Timuray à Reuters.

A gestora afirmou mesmo que, mantendo-se inalterado o regulamento, a Vodafone poderá reconsiderar os planos para estabelecer em Portugal um centro de investigação e desenvolvimento.

Além disso, considerou as condições estabelecidas pela Anacom um desincentivo ao investimento dos operadores em infra-estrutura e contrárias, por isso, ao objectivo do Governo.

Regras “desastrosas”, defende a Nos

“As regras do leilão, tal como as conhecemos, são absolutamente ilegais, inaceitáveis e desastrosas para o sector e para o país”, comentou a Nos, depois de serem conhecidas as queixas da Vodafone.

A operadora acredita que o regulamento proposto pela Anacom “compromete irremediavelmente a concorrência e o investimento no sector” e a “transição digital das empresas, do sector público e da população, bem como a coesão territorial e social”.

“Se as regras não forem alteradas estaremos a condenar Portugal à irrelevância na futura economia digital”, assinala a empresa presidida por Miguel Almeida.