Criado novo modelo de inteligência artificial para prever o risco de sépsis

Plataforma que alerta médicos para o risco de um doente desenvolver uma infecção generalizada já está a funcionar no Hospital Beatriz Ângelo, em Loures.

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Plataforma desenvolvida que alerta para o risco de sépsis DR

Quando uma pessoa dá entrada num hospital, são logo registados os seus dados. Se vier a ser internado, essas informações vão sendo sempre actualizadas. Agora, o Hospital Beatriz Ângelo (em Loures) tem um modelo de inteligência artificial que acompanha esses dados em doentes internados e está treinado para alertar os médicos para o risco de o doente poder vir a desenvolver sépsis – uma infecção generalizada causada pela presença de microorganismos patogénicos e que, quando evolui, pode ter consequências graves no doente, podendo mesmo levar à morte. Neste momento, o modelo está a funcionar no hospital e há médicos a receber alertas. Já foram obtidos resultados e o modelo foi validado na prática clínica neste hospital, mas pretende-se ainda publicar um artigo científico e validá-lo noutros hospitais.

Edgar Almeida, médico e director clínico do Hospital Beatriz Ângelo, começa por explicar que, quando evolui, a sépsis é uma situação de enorme gravidade do ponto de vista clínico. “Geralmente, é uma resposta do organismo à infecção. Se não for detectada precocemente, tem uma elevada mortalidade e morbilidade.” O médico destaca que é algo relativamente frequente, sobretudo em pessoas que são internadas. Um dos motivos que levou ao desenvolvimento deste novo modelo para se antecipar o risco de sépsis foi número considerável de casos de sépsis. Por dia, podem ser diagnosticados até dez casos por dia no Hospital Beatriz Ângelo.

Desenvolveu-se então um modelo de inteligência artificial com um algoritmo que prevê o risco de sépsis. Para isso, forneceu-se a esse modelo dados de doentes que contraíram e não contraíram sépsis. Ao todo, o modelo foi treinado com dados de 70 mil doentes internados, o que equivaleu a cerca de um milhão de registos. Iniciado em 2018, o projecto chama-se “SEWS – Sepsis Early Warning Score” (Modelo de Previsão do Risco de Sépsis) e está há cerca de um ano integrado na prática clínica do Hospital Beatriz Ângelo. Por agora, cerca de 20 médicos usam este modelo desenvolvido pela Direcção de Sistemas e Tecnologias de Informação da Luz Saúde (da qual faz parte o Hospital Beatriz Ângelo), pelo corpo clínico do Hospital Beatriz Ângelo, pelo centro de investigação e formação Learning Health, pela Direcção de Marketing e pela Direcção Jurídica da Luz Saúde, bem como pelas empresas Prológica e Microsoft.

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Verificação do médico após o alerta do risco de sépsis DR

Vejamos como funciona. Um doente vai às urgências do hospital e são-lhe recolhidas informações como a frequência respiratória, a pressão arterial, a frequência cardíaca ou a saturação de oxigénio. Todos esses dados são informatizados. Se o doente for internado, esses registos são feitos sistematicamente. O modelo acompanha em tempo real esses dados e detecta se há o risco de o doente vir a desenvolver sépsis. Se existir esse risco, um alerta é enviado para o processo clínico electrónico usado pelo médico, que passa assim a saber se o doente pode vir a desenvolver essa infecção generalizada.

Quanto aos resultados, verificou-se que em mais de 70% dos casos se está a acertar na identificação de sépsis, ou seja, foi correctamente identificada pelo modelo. Dentro desses mais 70%, em cerca de 30% dos casos conseguiu-se antecipar que o doente vai ter sépsis mesmo antes de o médico saber. “Isto significa que grande parte da informação é muito válida, ou seja, a informação que foi introduzida pelos milhares de utilizadores do nosso sistema informático acabou por criar um edifício bastante sustentável em termos de informação produzida”, refere Edgar Almeida, frisando que o próprio algoritmo acabou por valorizar a qualidade da introdução de dados.

Não substitui o médico

Bruno Campos, responsável pelos sistemas de informação das unidades de Lisboa da Luz Saúde, esclarece que o objectivo de um modelo como este nunca será substituir a acção médica. “A principal inovação é darmos ferramentas aos nossos médicos para que aumentem a capacidade de diagnóstico e de tratamento”, afirma. “Este modelo pretende servir como um contributo significativo para a diminuição do número de casos através de uma alarmística que avisa sobre potenciais casos em desenvolvimento.” Bruno Campos sublinha que este modelo detecta precocemente a possibilidade de desenvolvimento de sépsis, mesmo antes da avaliação clínica do médico.

Edgar Almeida reforça que este é um instrumento de auxílio e que não substitui o juízo clínico do médico. Para si, a grande vantagem é o facto de alertar precocemente que uma situação de enorme gravidade possa surgir. E até faz uma comparação: “É como se fosse o boletim meteorológico. Quando nos alertam que vai aparecer uma tempestade às tantas horas e no local x, estamos preparamos para a enfrentar. Não a impedimos, mas estamos preparados. De certo modo, é isso que este instrumento vai fazer: preparar o médico e alertá-lo de que o seu doente pode estar a desenvolver um conjunto de sintomas e sinais que, a persistir, configuram um quadro de sépsis e será necessário intervir precocemente.”

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Equipa do projecto, da esquerda para a direita: Jaime Machado (Análise Avançada da Luz Saúde), Bruno Campos (responsável pelos sistemas de informação das unidades de Lisboa da Luz Saúde), Edgar Almeida (director clínico do Hospital Beatriz Ângelo) e João Pedro Colaço (médico intensivista do Hospital Beatriz Ângelo) DR

Nos próximos tempos, pretende-se que o modelo seja avaliado por outros especialistas. Para isso, já se está a preparar um artigo científico. Quer-se ainda validá-lo noutros hospitais. “Quando houver vários sítios onde a nossa proposta foi validada, então podemos passar para a fase de validação generalizada [e ser assim usado em todos os hospitais]”, refere Edgar Almeida, adiantando que se espera vir a ter uma amostra ainda mais robusta. Bruno Campos acrescenta que o modelo está numa fase de melhoria contínua, em que se está a receber o feedback dos médicos que usam o modelo sobre os verdadeiros positivos e os falsos positivos da sépsis. “Faltam dois passos fundamentais: disponibilizar alertas a todos os médicos do internamento e maximizar o número de verdadeiros positivos [ou seja, ter uma percentagem de mais de 70%].”

A nível internacional, existem 28 projectos de inteligência artificial validados na área da sépsis, sete deles relativos ao internamento. “Comparámos os resultados e estão em linha com os que conseguimos obter no Hospital Beatriz Ângelo”, frisa Bruno Campos. A equipa desconhece outros projectos de inteligência artificial sobre a sépsis em Portugal. Há outro que aborda o risco de infecção, mas não concretamente a sépsis.

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