Dezenas de mortos, com Arménia e Azerbaijão “a um passo de uma guerra de grandes proporções”

Estes são já os piores combates entre as duas antigas repúblicas soviéticas desde 2016, último reacendimento muito grave da guerra dos anos 90 por causa da região de Nagorno-Kharabakh, enclave arménio que declarou a sua independência do território azerbaijano.

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Segundo o Governo arménio, que distribuiu a imagem, um civil é tratado depois de ser ferido nos confrontos Reuters/ARMENIAN FOREIGN MINISTRY

Não se vislumbra qualquer sinal de trégua nos confrontos entre as forças arménias e azerbaijanas na região de Nagorno-Kharabakh, o enclave de etnia arménia situado no interior do Azerbaijão. Ao segundo dia de combates, pelo menos 32 soldados separatistas arménios morreram, tal como cinco civis azerbaijanos e dois arménios – o Azerbaijão não anuncia as suas perdas militares.

Estes são já os piores confrontos desde 2016 (na altura, registaram-se mais de 200 mortos) entre as duas antigas repúblicas soviéticas que travaram uma guerra em 1991, quando o enclave arménio declarou a sua independência do Azerbaijão, em simultâneo com o colapso da União Soviética. Quando o cessar-fogo foi declarado, em 1994, havia 30 mil mortos. Já em Julho deste ano, escaramuças na região fizeram pelo menos 16 mortos.

Tudo começou com o Governo arménio a acusar o Azerbaijão de lançar um ataque aéreo e de artilharia contra o enclave, alegação a que os azerbaijanos respondem acusando a Arménia de ter atacado primeiro as suas tropas.

Estamos a um passo de uma guerra de grandes proporções”, diz Olesya Vartanyan, analista do think tank International Crisis Group, ouvida pela agência de notícias AFP. “Ao contrário do que aconteceu em Julho, este foi claramente um ataque bem preparado, que pode dar origem a uma escalada maior do que a de Abril de 2016”, escreveu a especialista em política do Cáucaso do Sul no Twitter.

Logo no domingo, a Arménia e as autoridades de Nagorno-Kharabakh declararam a lei marcial e mobilizaram os militares na reserva. O Azerbaijão impôs a lei marcial e declarou o recolher obrigatório nas grandes cidades.

O ministro da Defesa arménio disse entretanto que os combates se prolongaram por toda a noite e continuam ao longo desta segunda-feira, com o ministro da Defesa azeri a afirmar que as forças arménias atacam a localidade de Terter; o Azerbaijão garante ter capturado uma montanha estratégica em Kharabakh que permite controlar as ligações por estrada entre Erevan, a capital da Arménia, e o enclave. 

A Turquia, país aliado do Azerbaijão, diz estar em contacto com os membros do chamado Grupo de Minsk, que assegura oficialmente a mediação do conflito e que tem como co-presidentes a Rússia, a França e os Estados Unidos – o último verdadeiro esforço para chegar a uma paz duradoura entrou em colapso há dez anos.

Armas e promessas de apoio

Paris, Berlim, Roma, a União Europeia e Washington pediram o fim das hostilidades, enquanto o candidato democrata na corrida pela Presidência americana, Joe Biden, apelou à Administração de Donald Trump para tentar conseguir que mais observadores se ocupem de fazer cumprir o cessar-fogo, e exigiu à Rússia para “parar de cinicamente fornecer armas aos dois lados”.

Sabe-se que o líder russo, Vladimir Putin, já falou com o primeiro-ministro arménio, Nikol Pashinyan, e que o chefe de Estado turco, Recep Tayyip Erdogan, falou com o Presidente azerbaijano, Ilham Aliyev.

Sobre a primeira conversa, não se conhecem pormenores. A respeito da segunda, Erdogan prometeu “apoiar os irmãos azerbaijanos com todos os meios, como sempre”. Descrevendo a Arménia como “a maior ameaça à paz na região”, o Presidente turco apelou “ao mundo inteiro que apoie o Azerbaijão na sua batalha contra a invasão e a crueldade”.

Pashinyan reagiu acusando a Turquia de “comportamento perigoso” e pedindo às potências internacionais para impedirem o envolvimento da Turquia. Caso contrário, diz, “estamos à beira de uma guerra total no Cáucaso do Sul”.

O Azerbaijão desmentiu entretanto a declaração do embaixador arménio na Rússia, Vardan Toganyan, segundo qual Ancara enviou quatro mil combatentes do Nordeste da Síria para ajudar o seu aliado. Estes, afirmou Toganyan, estariam já a participar nos combates no enclave. “Rumores sobre a mobilização de militantes da Síria no Azerbaijão são mais uma provocação dos arménios e um disparate absoluto”, disse Khikmet Gadziev, assessor do Presidente Aliyev.

Oleodutos e gasodutos

De acordo com o presidente do Nagorno-Kharabakh, a Turquia está a armar “mercenários” e a enviar caças para os combates. Arayik Harutyunyan sugere que “a guerra já ultrapassou os limites do conflito entre o Kharabakh e o Azerbaijão”.

O confronto entre o Azerbaijão muçulmano e a Arménia, de maioria cristã, preocupa os vizinhos e os países ocidentais, essencialmente por desestabilizar uma região que serve de corredor para os oleodutos e gasodutos que abastecem os mercados mundiais.

Com tantos países supostamente envolvidos, o que mais inquieta a analista do International Crisis Group é “a falta de uma mediação internacional pró-activa”. Segundo Vartanyan, é esse “um dos principais motivos” para a “actual escalada”, algo que teria sido evitado se essa mediação tivesse actuado nas últimas semanas.

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