Embaixador dos EUA avisa: Portugal tem de escolher entre EUA e China
Os EUA preferiam que Portugal não tivesse qualquer equipamento da Huawei na rede de 5G. “Se não tivermos parceiros confiáveis na rede de telecomunicações portuguesa, mudará a forma como interagimos com Portugal em termos de segurança e de Defesa”, diz.
O embaixador norte-americano em Lisboa defende que Portugal tem de escolher entre os “amigos e aliados” EUA e o “parceiro económico” China, alertando que escolher a China em questões como o 5G pode ter consequências em matéria de Defesa. O Governo português já respondeu, sacudindo a pressão: “Em Portugal as decisões são tomadas pelas autoridades portuguesas competentes”, disse Augusto Santos Silva ao Expresso.
George Glass, embaixador dos EUA em Lisboa, em entrevista ao Expresso, publicada este sábado, admitiu consequências em matéria de segurança e Defesa para Portugal se o país escolher trabalhar com a China.
Segundo o diplomata, as consequências serão de âmbito técnico, como a actividade da NATO ou a troca de informação classificada, e não políticas, pelo menos para já.
“Há países que estão a trabalhar numa verdadeira parceria como aliados. Se não formos capazes de comunicar a esse nível, então haverá também reflexos na atmosfera política e nos desenvolvimentos da relação política. Por agora, é um assunto de Defesa Nacional e não de política”, afirmou Glass.
Em declarações ao mesmo jornal, e já depois desta entrevista, o ministro do Estado e dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva sublinhou que Portugal é um Estado independente em que as “decisões são tomadas pelas autoridades” competentes “nos termos da Constituição e da lei portuguesa, e de acordo com os valores nacionais com a concertação no seio da União Europeia quando pertinente e com o sistema de alianças em que nos integramos”.
Portugal no papel de vítima
O embaixador admite que Portugal é uma vítima do conflito comercial entre EUA e China ao fazer parte do “campo de batalha” na Europa, onde uma das frentes de conflito é a nova tecnologia 5G, relativamente à qual Portugal equaciona trabalhar com a chinesa Huawei, ainda que não em aspectos fundamentais da rede, mas apenas na distribuição do sinal de rádio.
Glass é taxativo ao dizer que os EUA preferiam que Portugal não tivesse qualquer equipamento da Huawei na rede de 5G.
“Se não tivermos parceiros confiáveis na rede de telecomunicações portuguesa, mudará a forma como interagimos com Portugal em termos de segurança e de Defesa. Temos feito chegar esta mensagem alto e bom som: a forma como trabalhamos com a NATO ou como trocamos informação classificada será afectada. Se tivermos confiança nas telecomunicações, seremos capazes de continuar a relacionar-nos como no passado. Se não tivermos, teremos de mudar a forma como comunicamos com Portugal”, disse o embaixador.
Há outras empresas chinesas com posições de capital em empresas portuguesas – como a China Three Gorges na EDP e a CCCC que recentemente entrou no capital da Mota-Engil, que “vendeu 30% da companhia por 30 moedas de prata” – a dificultar a relação entre Portugal e EUA, sendo que em relação à Mota-Engil o embaixador norte-americano admite a possibilidade de sanções.
Remeteu, no entanto, mais esclarecimentos para essas questões para o subsecretário norte-americano da Economia, Keith Krach, que vai estar na próxima semana em Lisboa.
Sobre a importância do “incrivelmente estratégico” porto de Sines para a distribuição do gás natural liquefeito americano, Glass disse esperar que a construção e gestão do novo terminal “não vá para os chineses”. Se for, isso compromete a distribuição, admitiu.
“Acho que tem de comprometer. Se fosse para os chineses, afectava a nossa visão daquilo que Sines se pode tornar. Vimos no passado que, se os operadores forem chineses, eles têm a capacidade de negar acesso a navios norte-americanos. Isso não pode acontecer. Sobretudo se pensarmos em Portugal como o hub de gás e centro da segurança energética europeia”, declarou.
George Glass admitiu ainda que os EUA têm trabalhado com Portugal no sentido de “guiar” o investimento estrangeiro no país e diminuir o peso do investimento chinês.
“Acho que agora são mais duros com a China. Quando cheguei a Portugal, as entidades estatais chinesas tinham 28% da EDP e agora têm 21%. Vai na direcção certa. Mas precisa de ser menos”, acrescentou.