Após dezenas de detenções, Governo de Lukashenko tira acreditações a jornalistas estrangeiros
Mais de 50 jornalistas foram detidos na quinta-feira. Dois dias depois, Governo começou a revogar acreditações, mas “a informação encontra sempre forma de vir a público”, assegurou jornalista bielorrusso ao PÚBLICO.
O Governo bielorrusso revogou acreditações a mais de uma dezena de jornalistas na Bielorrússia, proibindo-os de reportar os protestos que duram há três semanas contra Aleksander Lukashenko, que enfrenta a maior contestação de sempre desde que chegou ao poder há 26 anos. Entre as agências de notícias, jornais ou emissoras visadas estão a Reuters, a AP, AFP, a Deutsche Welle, Radio Free Europe, The New York Times, The Wall Street Journal ou BBC.
“Condenamos veementemente este sufocamento do jornalismo independente. Pedimos às autoridades bielorrussas que revoguem a decisão e permitam que os nossos jornalistas continuem a fazer o seu trabalho”, escreveu o gabinete de imprensa da BBC, depois de confirmar que dois dos jornalistas do serviço em russo da emissora britânica viram as suas credenciais revogadas, com efeito imediato.
Statement on #BBC journalists in #Belarus pic.twitter.com/xUwMaWXFDd
— BBC News Press Team (@BBCNewsPR) August 29, 2020
A medida contra os meios de comunicação social surge dois dias depois de pelo menos 50 jornalistas terem sido detidos pelas autoridades bielorrussas, com o argumento de que o Governo precisava de validar a sua documentação.
A maioria foi libertada passadas algumas horas, mas pelo menos quatro jornalistas, incluindo dois repórteres da Belstat TV, uma televisão polaca destinada à população bielorrussa, passaram a noite na prisão e compareceram em tribunal na sexta-feira. Paul Hansen, um fotojornalista sueco, foi expulso da Bielorrússia e proibido de entrar no país nos próximos cinco anos, segundo o The Guardian. Outro dos jornalistas detidos foi Steve Rosenberg, correspondente da BBC em Moscovo.
Important! Ministry of Foreign Affairs of Belarus canceled accreditations of correspondents of the Belarus Service of Radio Liberty Ales Dashchynski,Aleh Hruzdzilovich,Uladzimir Hrydzin, and Aliaksandra Dynko. Accreditations allowed them to work in Belarus. @RFERLPress @USAGMgov pic.twitter.com/nqTzeaAlns
— Franak Viacorka (@franakviacorka) August 29, 2020
“Houve ordens para que os serviços secretos fizessem algo em relação aos media e a solução que encontraram foi cancelar as acreditações”, disse ao PÚBLICO, através das redes sociais, o jornalista bielorrusso Franak Viacorka, que tem denunciado a repressão do regime de Lukashenko nas redes sociais.
“As autoridades não gostam da forma como os media estrangeiros estão a fazer o trabalho, de como estão a fotografar e a escrever sobre a violência policial e tortura”, afirmou Viacorka. Por isso, conclui, “querem assustar os jornalistas, pôr os media numa situação de autocensura”.
Na sexta-feira à noite, o ministro dos Negócios Estrangeiros do Reino Unido, Dominic Raab, condenou o ataque à liberdade de imprensa. “Condeno a detenção em massa de mais de 50 jornalistas na última noite [quinta-feira] na Bielorrússia, incluindo da BBC e media locais e internacionais”, escreveu Raab no Twitter.
#Belarus Another red line has been crossed in the media field. The authorities have withdrawn the accreditation of four @RFERL journalists,journalists with @AFP, @Reuters, @bbcrussian. These are media outlets that officially operate in Belarus,and have had accreditation for years pic.twitter.com/h14IwU4Dvd
— Hanna Liubakova (@HannaLiubakova) August 29, 2020
“Foi uma tentativa flagrante de interferir na informação honesta e objectiva. As autoridades bielorrussas devem parar de visar jornalistas e defender a liberdade de imprensa”, rematou.
"Não vai conseguir parar a informação"
Segundo o The Guardian, após as eleições presidenciais de 9 de Agosto, consideradas fraudulentas pela União Europeia, Estados Unidos e pela oposição na Bielorrússia, o Ministério dos Negócios Estrangeiros bielorrusso rejeitou a maioria dos pedidos de acreditação de jornalistas estrangeiros, depois de Lukashenko ter manifestado o seu desagrado com a cobertura feita antes das eleições.
Por isso, muitos jornalistas entraram na Bielorrússia como turistas, sem os documentos oficiais exigidos pelo Governo. Outros ficaram retidos no aeroporto de Minsk, onde lhes foi negada a entrada no país.
Women are marching from Victory square towards October square in Minsk.#LukashenkoOut#Belarus pic.twitter.com/7oRSuil4aH
— NEXTA (@nexta_tv) August 29, 2020
Num fim-de-semana em que estão previstos mais protestos contra o regime, Lukashenko volta-se contra os jornalistas, que, sem acreditações, ficam impedidos de fazer o seu trabalho.
Devastating news from Minsk: the Belarusian foreign ministry has stripped dozens of locals journalists working for foreign media of their press accreditation, affecting the entire bureaus of Reuters, AP, AFP, Deutsche Welle. 1/2
— Nataliya Vasilyeva (@Nat_Vasilyeva) August 29, 2020
“Isto basicamente significa que eles [jornalistas] podem ser presos e acusados se forem apanhados nas ruas em reportagem. É difícil processar que impacto esta decisão terá”, escreveu no Twitter a jornalista Nataliya Vasilyeva, correspondente do jornal britânico The Telegraph em Moscovo.
No entanto, sublinha o jornalista bielorrusso Franak Viacorka, muita da informação sobre a Bielorrússia circula na redes sociais, sobretudo através do Telegram, com mensagens encriptadas, um dos factores que contribuiu para que os protestos ganhassem maior dimensão.
“Lukashenko não compreende que mesmo que proíba ou detenha jornalistas não vai conseguir parar a informação. Vivemos no tempo das redes sociais e a informação encontra sempre forma de vir a público”, reiterou Viacorka.