Morreu José Quintela, o arquitecto dos centros comerciais da Sonae
O arquitecto foi chefe do gabinete de arquitectura da Sonae Sierra durante 20 anos, defenindo a paisagem urbana portuguesa.
José Quintela, o arquitecto que melhor percebeu a paixão dos portugueses pelos centros comerciais, morreu na segunda-feira de cancro do pulmão, noticiou a Lusa esta quarta-feira. Tinha 73 anos.
Quintela, um nome desconhecido do grande público e ignorado pelos círculos consagrados da arquitectura portuguesa, projectou dezenas de centros comerciais para a Sonae (proprietária do PÚBLICO), entre os quais o Centro Colombo (1997) e o Centro Vasco da Gama (1999), ambos em Lisboa. São dele também as torres São Gabriel e São Rafael, no Parque das Nações.
José Manuel Quintela da Fonseca formou-se em Arquitectura em 1970 na Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa, tendo obtido um MBA na Wharton School (1985-1986), em Filadélfia, e realizado outras pós-graduações em Harvard (2000-2001) e na LSBF de Londres (2010), segundo descreve a Ordem dos Arquitectos em comunicado. Em Angola, fundou o Sindicato dos Arquitectos, juntamente com Vasco Vieira da Costa e João do Canto Lagido.
Após o regresso de Angola, juntou-se à Sonae Sierra em 1988, onde também desenvolveu espaços comerciais de grandes dimensões para vários países, além de Portugal, de Espanha ao Brasil, passando pela Alemanha, Itália e Grécia. “Foi, e será, uma das personalidades mais importantes do desenvolvimento dos centros comerciais no nosso país. Colaborador próximo do engenheiro Belmiro de Azevedo, nos anos 80 fez parte do núcleo restrito que iniciou a caminhada que levou a Sonae, hoje Sonae Sierra, ao topo das empresas especializadas em centros comerciais em Portugal, na Europa, e mesmo no mundo”, escreveu em comunicado a Associação Portuguesa dos Centros Comerciais.
Como responsável pelo gabinete de arquitectura da Sonae Sierra, onde era membro do conselho de administração, desenhou os maiores centros comerciais do país, mega-estruturas servidas por grandes parques de estacionamento, escadas rolantes e ar condicionado, algumas definindo a paisagem das cidades portuguesas, em que a visita era vendida como uma experiência. Reformou-se da Sonae em 2012, mantendo-se como consultor externo até 2018. Entretanto, em 2013, o seu perfil no LinkedIn diz que se juntou à espanhola Temprano, onde se dedicou a projectar residências de estudantes e trabalhou até hoje.
“Se considerarmos que há três vagas principais de centros comerciais em Portugal, José Quintela da Fonseca faz parte da que levou os pressupostos das Amoreiras, de Tomás Taveira, muito mais longe em dimensão e aparato”, explica Jorge Figueira, crítico de arquitectura do PÚBLICO. “Nos anos 70, temos a vaga tardo-modernista, nos anos 80 temos o pós-modernismo de Taveira e nos anos 90 aparece o Colombo, que é um pós-modernismo levado ao estado de caricatura BD. Estes centros comerciais constroem-se à volta de uma narrativa, em que tudo é encenado. O Colombo é o epítome de uma arquitectura de papel, transformada em pura cenografia, que marca o ponto alto do consumismo em Portugal. Toda essa efabulação é assumida sem moralismo.”
No final dos anos 90, o Centro Vasco da Gama, com a mudança de gosto induzida pela Expo-98 e o arrefecimento do pós-modernismo, mostra o arquitecto a abraçar uma linguagem mais próxima de uma expressão tecnológica, comenta Jorge Figueira.
Segundo a Lusa, o funeral de José Quintela realiza-se na quinta-feira em Alcabideche, Cascais.