PS questiona Graça Fonseca sobre inclusão do Baile dos Pretos na corrida às 7 Maravilhas da Cultura Popular da RTP

Baile dos Pretos “representa a história de um grupo de escravos negros alforriados” e integra os Bailes do Corpo de Deus, em Penafiel. PS pede ao Ministério da Cultura que “reavalie” a cobertura destes prémios pela RTP. Autarquia diz que já foram suprimidas partes potencialmente ofensivas das quadras que acompanham esta “vistosa dança de fitas”.

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PS frisa que "é missão pública de quem tem o dever de informar promover eventos e iniciativas que se pautem pelo respeito e que combatam toda e qualquer prática discriminatória" LUSA/ANTÓNIO COTRIM

Esta sexta-feira, avançou a agência Lusa, os deputados Hugo Oliveira, Joana Sá Pereira, Rosário Gamboa, Bruno Aragão, Susana Correia e Cláudia Santos, do Partido Socialista (PS), perguntaram a Graça Fonseca se a ministra da Cultura sabe que o programa 7 Maravilhas da Cultura Popular, da RTP, tem entre os seus candidatos os Bailes do Corpo de Deus – Cavalhada, em Penafiel, que incluem uma dança tradicional chamada Baile dos Pretos. Esta é uma dança na qual, sugerem os deputados, “pessoas caucasianas pintam-se de negro” – o polémico blackface –, cantando quadras como “O preto é o rei dos matos/ imperador dos macacos/ não posso levar avante/ pretinho andar de sapatos”.

“Desconhecemos as razões que levaram à admissão por parte do programa da RTP de um evento cultural que é manifestamente desadequado e desajustado nos dias de hoje. O respeito pelas tradições não se pode sobrepor ao respeito que, enquanto cidadãos, temos de ter por todas as pessoas na sua enriquecedora diversidade”, sublinharam os socialistas, argumentando que o Baile dos Pretos “normaliza uma ideia de menorização que deve estar completamente ultrapassada”.

Os bailes da Cavalhada, pode ler-se no site oficial das 7 Maravilhas da Cultura Popular, correspondem a um “ritual secular que precede a celebração do Corpo de Deus em Penafiel”. A tradição data do século XVII e tem como objectivo resgatar alguns “ofícios” antigos, com bailes representativos de diversos costumes e profissões. Actualmente, precisa-se no site das 7 Maravilhas, são seis os bailes que se realizam: o dos Ferreiros, o dos Pedreiros, o dos Turcos (que “narra o combate entre cristãos e infiéis”), o das Floreiras, o dos Pauzinhos e o dos Pretos. Este último “afasta-se da tradição das danças de ofício e representa a história de um grupo de escravos negros alforriados, que apresentam uma vistosa dança de fitas”.

A RTP1 inicia na próxima segunda-feira uma programação especial dedicada às 7 Maravilhas da Cultura Popular. À nona edição, que contempla 140 candidatos regionais, o prémio contará com “20 programas de daytime em directo, a realizar nos meses de Julho e Agosto”, sendo que em cada transmissão será apurado um pré-finalista. Há também uma “Gala Finalíssima” a 5 de Setembro, igualmente com transmissão na RTP1, que elegerá sete tradições como as 7 Maravilhas da Cultura Popular. As categorias a concurso são: Artesanato, Lendas e Mitos, Festas e Feiras, Músicas e Danças, Rituais e Costumes, Procissões e Romarias, e ainda Artefactos.

“Uma vez que a emissão televisiva das 7 Maravilhas da Cultura Popular apenas se inicia no próximo dia 6 de Julho, não deveria o Ministério da Cultura instar à reavaliação da participação desta suposta manifestação cultural no programa?”, expuseram os deputados do PS a Graça Fonseca, discutindo que “é missão pública de quem tem o dever de informar promover actividades, eventos e iniciativas que se pautem pelo respeito entre todos e que combatam toda e qualquer prática discriminatória”.

Contactada pelo PÚBLICO, a Câmara de Penafiel lamenta que o PS “associe a Cavalhada e tradições seculares a questões racistas sem ter em conta o enquadramento histórico e cultural” da comemoração, alegando que “a questão colocada a Graça Fonseca sobre os Bailes do Corpo de Deus, onde se integra o Baile dos Pretos, foi feita com diversas imprecisões”.

A autarquia salienta que a Cavalhada foi alvo de uma “recriação e recuperação histórica entre 2008 e 2011”, frisando que, quanto ao Baile dos Pretos, a câmara “teve o cuidado de suprimir parte de quadras que pudessem conter alguma referência ofensiva”. O município sustenta que as quadras mencionadas no requerimento dos socialistas não fazem parte do “actual repertório do baile”, acrescentando, ainda assim, que, “em todo o caso”, já havia previamente “solicitado ao museu da cidade que avaliasse a pertinência” de se manter o Baile dos Pretos na Cavalhada.

“O enredo do Baile dos Pretos”, defende o município, “consiste na apresentação de um conjunto de escravos alforriados que, depois de libertos e acompanhados pela sua realeza, apresentam os seus cumprimentos ao concelho e à comissão de festas, enquanto cidadãos livres”. Estes executam “uma vistosa e colorida dança de fitas, que se entrelaçam num poste, celebrando-se assim a sua libertação do jugo da escravatura e a sua integração de igual direito na sociedade”.

Sugerindo que os bailes e as animações que “remetiam para as comunidades africanas” eram “muito comuns em diversos pontos do país” no século XVII, a autarquia sublinha que “Penafiel orgulha-se de ser uma terra acolhedora e integradora, com inúmeros exemplos de parcerias com países africanos com quem mantém relações de cooperação”.

Notícia actualizada às 20h22 com a resposta da Câmara de Penafiel.

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