A arquitectura elástica do atelier SO-IL reabre o MAAT
Reabertura do museu faz-se com uma grande instalação de arquitectura efémera do atelier nova-iorquino. Exposição mostra trabalho dos SO-IL nos últimos dez anos.
Com os feriados de Junho a comporem um fim-de-semana de cinco dias em Lisboa, o Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia (MAAT) escolheu o Dia de Portugal para reabrir o edifício, encerrado há seis meses, com um programa especialmente dedicado à arquitectura.
Os estragos provocados pelo mau tempo em Dezembro ditaram o fecho das portas para a realização de obras até ao final de Março, prazo que acabou por ser prolongado mais dois meses devido à pandemia que levou ao encerramento obrigatório dos museus. Por último, o fecho das fronteiras provocou atrasos na entrega de materiais têxteis necessários para terminar uma grande instalação de arquitectura concebida pelo atelier nova-iorquino SO-IL para a reabertura do MAAT.
Nesta terça-feira, já foi possível ver os tecidos especiais que cobrem a instalação de arquitectura efémera de grande escala que tem como objectivo transformar e interrogar o espaço projectado em 2016 pela arquitecta britânica Amanda Levete, ajudando a discutir o futuro do MAAT e dos museus em geral, como explicou a nova directora Beatriz Leanza na visita guiada que fez para os jornalistas. "É um edifício dentro de um edifício”, afirmou a directora italiana, que chegou a Lisboa em Setembro.
O atelier nova-iorquino, dirigido pelo casal Florian Idenburg e Jing Liu, procura encontrar “formas de expandir as fronteiras da arquitectura”, contextualizou Leanza. Talvez por isso, para a intervenção ter impacto urbano na zona de Belém, os SO-IL propuseram criar um novo acesso nas traseiras, virando o museu para a cidade que serve. Para já, devido aos constrangimentos impostos pela pandemia, esse acesso — uma porta de serviço a que foi acrescentado um pórtico desenhado pelos SO-IL — servirá apenas para os visitantes saírem.
"Uma arena cívica"
"Quanto tempo precisa a arquitectura temporária de existir para se tornar arquitectura?” — esta é uma das perguntas que os SO-IL fazem recorrentemente nas suas intervenções efémeras, contou Beatrice Leanza, sublinhando a dimensão de experimentação da prática arquitectónica daquele atelier. A intervenção agora feita no MAAT é sobre a forma de juntar pessoas, acrescentou a directora, devendo o dia de reabertura do museu marcar o início da sua activação. “Este é um espaço que tem de ser apropriado. É, essencialmente, um palco, um cenário.”
Nesse cenário que pretende “ser uma arena cívica” e que tem o seu centro na antiga Sala Oval, os visitantes vão ser convidados a discutir o futuro do museu com uma variedade de profissionais internacionais e locais, e ainda com outras instituições culturais e grupos que representem a comunidade. A ideia é propor “uma prototipagem do futuro museu”, questionando uma história da museologia baseada em grandes exposições itinerantes e na viagem de obras, numa abordagem que também está preocupada com o futuro do planeta.
“Porque é que um museu só funciona das 11h às 19h? Não é um desperdício? Neste balanço que vamos fazer da vida online das instituições culturais, não faz sentido perguntar se devemos ter conteúdos on demand, olhando para metodologias de plataformas como a Netflix, capaz de juntar ofertas tão diversas?”, questionou ainda Leanza.
Uma pele urbana
A instalação arquitectónica dos SO-IL, intitulada Beeline, é completada por uma exposição mais convencional que mostra outros 12 projectos de arquitectura efémera realizados pelo atelier nova-iorquino nos últimos dez anos, desde pavilhões a espaços públicos.
Com início às 18h, o programa paralelo de conferências prevê para o primeiro dia da nova vida do MAAT uma conversa com Florian Idenburg e Jing Liu, a partir de Nova Iorque, moderada pelo arquitecto João Belo Rodeira. Vão entrar também no debate os arquitectos Ricardo Carvalho (Lisboa), Filipe Magalhães e Ana Luís Soares (atelier Fala, Porto) e Bárbara Silva (galeria de arquitectura Note, Lisboa).
A arquitectura efémera dos So-IL que abriram o atelier em 2008, em plena crise financeira, desenha-se a partir da ideia de pele, de membrana, como mostra a instalação Beeline, mas também da ideia de embrulhar, como exemplifica a intervenção no Storefront for Art and Architecture, em Nova Iorque — aqui, uma instituição conhecida pela sua frente muito aberta ficou coberta por uma pele que se tornou uma tela urbana. Igualmente famosa é a intervenção para a primeira edição da feira de arte contemporânea Frieze em Nova Iorque, que transformou um sistema de banais pavilhões de linhas rectas numa forma sinuosa e lúdica.
Talvez o projecto que mais directamente tenha servido de ensaio para o MAAT seja Breathe, a casa do futuro apresentada na Bienal de Design de Milão em 2017. Com um sistema de construção semelhante em que se empilham as divisões de uma casa, Breathe joga igualmente com o material têxtil para criar vários níveis de translucidez.
Tal como no MAAT, as plantas também estão muito presentes, servindo em Lisboa de cenário natural para a obra sonora de Cláudia Martinho, intitulada Extinction Calls. A artista utiliza sons de arquivo para criar um percurso de encontros com aves extintas ou criticamente ameaçadas. Beatrice Leanza já aprendeu a ignorar o grasnar do albatroz: “É irritante, mas como é que podemos sobreviver como colectividade se não estivermos juntos?” A directora vai conversar com Cláudia Martinho na quinta-feira, pelas 16h, sobre activismo sonoro e crise ecológica.
Toda a programação de reabertura, detalhada no site do MAAT, marca o início do trabalho de Beatrice Leanza, mas apenas em Fevereiro de 2021 esta estará a funcionar em ambos os espaços do campus da Fundação EDP, o novo edifício e a Central.