Médicos consideram “decepcionante” Programa de Estabilização na Saúde

A maior parte das contratações serão assistentes operacionais. Estão ainda previstos 33,7 milhões de euros em pagamentos adicionais aos profissionais para recuperar cirurgias e consultas que foram adiadas.

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rui gaudêncio

Haverá 3000 novos profissionais a entrar no Serviço Nacional de Saúde (SNS) nos próximos meses, no âmbito do Programa de Estabilização Económica e Social (PEES) apresentado esta semana. O número consta do diploma aprovado no último Conselho de Ministros, que foi agora publicado em Diário da República. O Governo destina mais de 100 milhões de euros para a Saúde, incluindo um programa de recuperação de cirurgias e consultas que foram adiadas por causa da pandemia.

Na quinta-feira, quando António Costa apresentou o PEES, anunciou 2700 novas entradas no SNS, mas a resolução do Conselho de Ministros, que foi publicada neste sábado à noite, apresenta um número superior.

São 2995 os profissionais de saúde a contratar nos próximos meses, a maioria dos quais (1320) assistentes operacionais. Entre as categorias que serão mais reforçadas, seguem-se os enfermeiros (912) e os assistentes técnicos (480). 

A lista de profissionais a contratar que é incluída no diploma publicado este sábado não inclui a contratação de médicos. Noel Carrilho, da Federação Nacional dos Médicos (Fnam), “estranha” a situação: “Todas as classes profissionais fazem falta no SNS, mas não se compreende a ausência de médicos.” Os clínicos “não estão a ser estimulados para contribuir para este momento do SNS”, lamenta o dirigente sindical.

Apesar de ter aspectos “positivos”, o PEES é, “no geral, decepcionante”, avalia Carrilho. É precisamente o mesmo termo usado por Jorge Roque da Cunha, secretário-geral do Sindicato Independente do Médicos. “É uma mão cheia de nada”, afirma, acrescentando que o anúncio feito pelo Governo vai “criar expectativas na população” que o SNS “mão será capaz de cumprir”. 

Os médicos continuam a “não ver qualquer sinal de apreço pelo trabalho desenvolvido” nos últimos meses, acrescenta Roque da Cunha. O que era necessário nesta altura “era um reforço das carreiras para que houvesse capacidade de retenção dos profissionais no SNS”, concorda Guadalupe Simões, do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP).

O número de enfermeiros a contratar nos próximos meses (912) está “abaixo” do que tem vindo a ser a exigência do SEP ao longo dos últimos anos — 1000 enfermeiros por ano para compensar as saídas de profissionais. O actual contexto justificava “um aumento superior”, considera ainda a dirigente sindical.

Ao todo, o Governo estima gastar, até ao final do ano, 29 milhões de euros com estas 3000 contratações de profissionais de saúde.

O PEES prevê ainda 33,7 milhões de euros destinados a pagamentos por “produção adicional” aos profissionais que já estão no SNS, no âmbito de um plano de recuperação das cirurgias e consultas externas que foram adiadas durante o Estado de Emergência.

O programa de recuperação de listas de espera no SNS, que estava já no terreno antes da pandemia, dá um financiamento adicional às unidades de saúde para cumprir este objectivo. O dinheiro é dividido entre a instituição e as equipas de saúde, que podem receber até 55% deste valor. O PEES prevê o aumento desta percentagem até 75%, no caso das cirurgias, e 95% para as primeiras consultas.

Os pagamentos adicionais aos profissionais envolvidos nas cirurgias consomem a maior parte da verba destinada a este programa de recuperação (26 milhões de euros). A medida será aplicada “a todas as situações em que os tempos máximos de resposta garantidos se encontram ultrapassados”. Os restantes 7,7 milhões destinam-se às primeiras consultas. O foco será colocado nas “especialidades com maior espera”, lê-se no diploma.

O presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH), Alexandre Lourenço, entende que o Governo está a “subvalorizar” a quebra da actividade assistencial nos últimos três meses. As listas de espera actuais, têm que ser lidas com cautela porque, precisamente por causa da redução do número de consultas, há uma diminuição no número de doentes referenciados: “há dois ou três meses que não são incluídos novos doentes na lista”.

Por isso, a proposta feita pelo Governo “é curta”, sobretudo do ponto de vista das cirurgias, defende Lourenço. Além disso, o presidente da APAH considera que será “impossível” recuperar este atraso sem se redefinir a rede de hospitais covid-19, retomando uma “resposta gradual”, de acordo com a evolução da doença, tal como acontecia no início da pandemia.

Por seu turno, a Fnam lembra que também as consultas de seguimento foram atingidas pelas consequências da pandemia o que justificava, na opinião do sindicato, a sua inclusão também no plano agora apresentado.

Na apresentação do PEES, António Costa tinha classificado como “absolutamente prioritária” a recuperação da actividade assistencial no SNS, que foi afectada pela pandemia. O diploma agora publicado clarifica a forma como isto será feito.

O Governo também tinha anunciado a intenção de reforçar a capacidade do SNS nos cuidados intensivos, esperando atingir a média europeia de 11,5 camas de medicina intensiva por 100 mil habitantes. Actualmente, Portugal tem 7,39 camas por 100 mil habitantes. Para concretizar esse objectivo são destinados 26 milhões de euros, que implicam “investimentos infra-estruturais de ampliação de 16 serviços de medicina intensiva do SNS” e a implementação de um novo sistema de informação, sabe-se agora.

O diploma aprova um total de 105 milhões de euros adicionais destinados ao SNS, prevendo, por exemplo, maior investimento na rede laboratorial, a começar pelo Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, um reforço das redes de sistemas de informação em saúde e ainda um programa de “valorização da saúde pública”, com o qual se pretende “reforçar a vigilância epidemiológica”, modernizar o sistema de vigilância e simplificar o processo de notificação médica e laboratorial.

Notícia alterada às 18h06. Acrescenta as reacções de Fnam, SIM e SEP e esclarece a forma de funcionamento do plano de recuperação de cirurgias e consultas externas. Notícia alterada às 19h00. Acrescenta a reacção da APAH.

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