Um plano para todos os gostos e feitios
Se há um defeito no Programa de Estabilização Económica e Social, ele está na excessiva preocupação de disparar para todo o lado.
Governar em tempos de pandemia há-de ser uma tarefa difícil, mas, no caso de Portugal, há um primeiro-ministro apostado em fazer com que pareça fácil. O Programa de Estabilização Económica e Social apresentado esta quinta-feira é a prova acabada dessa capacidade, com medidas multimilionárias para acelerar o investimento público, para favorecer as empresas, para proteger os trabalhadores, para promover a digitalização da economia, para acudir à habitação, para dar um novo impulso ao Estado social ou para injectar ciência numa economia de baixa produtividade. Com tantas medidas e tanto dinheiro para distribuir, não há razões para queixas da esquerda ou da direita, da função pública ou dos trabalhadores privados, dos centros urbanos que finalmente vão ter escolas sem amianto ao mundo rural que disporá de verbas para proteger os seus espaços florestais. Se há um defeito no plano, procurem-no aí: na sua excessiva preocupação de disparar para todo o lado.
Tanta ambição na dimensão dos recursos do Estado para estabilizar a economia e a protecção social oferece um tremendo risco para o futuro das contas públicas. Mas garante também ao país mais recursos para mitigar os brutais impactes da pandemia nas condições de vida dos mais desprotegidos ou no seu tecido produtivo. Um programa assim tinha de ser caro, ambicioso, mas teria de ser tão caro e tão ambicioso? Sendo o que é, suscita dúvidas e suspeitas, entre as quais a ausência de critério; mas, reconheçamos, um programa mais enxuto e prudente, como, por exemplo, o que o PSD apresentou, poderia igualmente ser criticado por não estar à altura do desafio que o país enfrenta. A um e a outro, falta o meio-termo, onde geralmente está a razão.
Portugal não tem arsenal financeiro para ousar um programa como o que a Alemanha apresentou esta quinta-feira e, como aqui já escrevemos, António Costa e os seus ministros errariam se usassem armas convencionais para uma situação excepcional. O que importa por isso discutir é a diferença entre uma bazuca e um míssil de longo alcance. Ou, por outras palavras, de definir o que é indispensável investir agora e o que pode ser adiado para um momento mais oportuno. Proteger postos de trabalho, atacar a pobreza, aquecer a economia, chegar ao número médio europeu de camas nos cuidados intensivos do SNS ou dar computadores a estudantes são medidas que se anunciam com todo o prazer. Ambicionam bem mais do que a estabilização. Mas implicam um risco para a sustentabilidade financeira do país no futuro que é obrigatório ter em mente.