Governo quer exportações de volta aos níveis pré-covid até 2023

AICEP lança apoio à exportação através do comércio electrónico, com ferramenta de diagnóstico e recomendação. Inteligência artificial ajudará a escolher entre 3000 mercados digitais.

Foto
As exportações nacionais caíram mais do que o PIB, em percentagem, no primeiro trimestre de 2020 Nelson Garrido

As exportações portuguesas estavam numa trajectória de crescimento, valiam 44% do Produto Interno Bruto em 2019 e o objectivo era manter essa linha até chegar aos 50% do PIB. Porém, a pandemia de covid-19 baralhou as contas de todos os governos, e o de Lisboa, como disse na manhã desta terça-feira o ministro dos Negócios Estrangeiros, não perdeu essa meta de vista mas viu-se obrigado a “redesenhar o calendário”. Em vez de chegar aos 50% do PIB em meados da próxima década, o executivo quer agora recuperar os níveis de exportação pré-covid até ao final da actual legislatura.

Augusto Santos Silva falava na apresentação de uma nova ferramenta desenvolvida pela Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP) para apoiar empresas na exportação através do comércio electrónico. Disponível na plataforma Portugal Exporta, lançada há cerca de um ano, o acelerador de exportações online reúne informação sobre países, mercados geográficos físicos e digitais, potencial económico, perfis de consumo, dá acesso a consultoria, formação, diagnóstico e inclui, agora também, recomendação. Esta recomendação é totalmente digital, através de inteligência artificial (IA), indicando aos empresários que soluções de mercados digitais podem ser mais adequados para o sector e tipo de produto ou serviço que produz e vende.

“Temos investido mais tempo e mais inteligência nesta funcionalidade”, explicou João Dias, da AICEP, que apresentou o funcionamento desta “máquina cognitiva” que “tem vindo a ser treinada” para acertar nas sugestões assentes em IA. “A base de dados tem mais de 3000 marketplaces, obviamente que nem todos são relevantes, talvez 250 sejam mais relevantes para empresas portuguesas, mas a máquina está a ficar cada vez mais inteligente e a acertar nas recomendações”, descreveu o mesmo responsável da AICEP.

Para o ministro Santos Silva, o comércio digital é instrumental para a abertura da economia portuguesa ao exterior. “Alguns dizem que este tempo marcará o recuo na globalização. Creio que é um erro pensar assim. As cadeias de valor globais vão continuar a existir, o comércio internacional continuará a ser um ingrediente essencial e as consequências de reorganização da economia internacional vão acentuar a importância de abrir a economia portuguesa e de a posicionar nos segmentos mais elevados das cadeias de valor global”, começou por dizer o governante.

Depois, referiu que será preciso “redesenhar o calendário” dos “objectivos ambiciosos” que havia para as exportações. Mas defendeu que as metas continuam a ser as mesmas e que “as políticas públicas serão cada vez mais necessárias”.

“As exportações são 44% do PIB e o nosso objectivo era, na primeira metade da próxima década, chegar aos 50%. Tem de ser redesenhado o calendário por causa da crise, mas não desaparece da nossa acção, e queremos que ao longo da próxima década as exportações atinjam esse valor”, afirmou.

No curto prazo, a meta é recuperar a quebra. Ainda não há dados muito sólidos sobre a dimensão desse recuo, e o ministro não se referiu a números, mas aquilo que já se conhece augura muito trabalho a fazer: segundo o INE, as exportações portuguesas caíram 4,9% em termos homólogos no primeiro trimestre, caindo mais do que o PIB, que recuou 2,3% em termos homólogos no mesmo período.

Quanto tempo será necessário para regressar aos níveis pré-covid? Santos Silva sugeriu um calendário de “dois ou três anos”, mas tudo dependerá da elasticidade do PIB e das exportações. A nível europeu, as estimativas são sombrias: o bloco da União Europeia perderá entre 9% e 15% das exportações (bens e serviços) para outros destinos, segundo as contas da Direcção-Geral de Comércio da UE, divulgadas na semana passada. São entre 282 mil milhões e 460 mil milhões de euros de negócio perdido, que também penalizará Portugal, embora o país possa estar mais protegido destas contas, porque o mercado intracomunitário leva a maior fatia das exportações portuguesas (entre 75% e 80%). 

Até por isso, é preciso que as empresas nacionais sejam “actores cada vez mais relevantes no comércio digital”, concluiu o governante. O presidente da AICEP, Luís Castro Henriques, deu uma ideia da “dimensão muito significativa” do comércio digital mundial, dizendo que valeu 14 biliões (milhões de milhões) de dólares em 2019. É mais do que o PIB da UE, realçou ainda Santos Silva, com a vantagem de estar a crescer “muito depressa”, completou Castro Henriques, realçando então a importância do acelerador de exportações online, dado que permite “enfrentar de forma organizada e estruturada” o comércio electrónico.

A terminar, o secretário de Estado da Internacionalização, Eurico Brilhante Dias, insistiu na ideia de que o país “pode recalendarizar metas, ajustar prioridades”, mas não mudar os objectivos e manter políticas que promovam a abertura da economia ao exterior. 

“Não podemos iludir-nos, a pandemia é um marco também no comércio internacional”, avisou, enumerando o que tem sido feito nas “quatro áreas fundamentais”: liquidez e gestão de risco; canais de distribuição alternativos; reforço da promoção digital; rever estratégias de captação de investimento directo estrangeiro.

Porém, não disse uma palavra sobre o atraso do Governo na aprovação de um modelo que garanta o apoio dos seguros de crédito usados pelas empresas exportadoras. O governante garantiu que estão a ser tomadas medidas. Mas tal como o PÚBLICO tem vindo a noticiar, há dois meses que Portugal poderia ter aplicado garantias estatais aos seguros, como fazem outros países e, até agora, não há acordo com as seguradoras, o que está a comprometer exportações e a sobrevivência das empresas. 

Portugal tem cerca de 25 mil empresas exportadoras, segundo dados oficiais.

Sugerir correcção