Câmara de Loulé chumba megaprojecto da cidade lacustre de Vilamoura

A reformulação do Estudo de Impacto Ambiental sobre a cidade lacustre acabou por reduzir 1,5 hectares na área destinada a zonas verdes. O município, para licenciar mais 2400 camas, exige agora a duplicação dos lugares de estacionamento propostos.

Foto
VR Virgilio Rodrigues

O município de Loulé emitiu “parecer desfavorável” ao Estudo de Impacto Ambiental (EIA) da cidade lacustre em Vilamoura. Em causa está a construção de um megaprojecto no centro do empreendimento, com impactos ambientais de grande dimensão, não apenas devido à implantação de quatro lagos de água salgada mas, sobretudo, por causa da massa urbanística – mais 2400 camas. As obras têm um calendário de execução de dez anos, a desenvolver em duas fases. A Comissão de Avaliação de Impacto Ambiental (CAIA), liderada pela Comissão de Coordenação Regional (CCDR), reúne nesta sexta-feira para decidir o futuro da expansão do maior empreendimento turístico da região.

No passado mês de Setembro, a CAIA tomou uma atitude inédita: deliberou devolver o projecto ao promotor para fazer “ajustamentos” consentâneos com a realidade actual. Recorde-se que o megaempreendimento foi classificado como de Potencial Interesse Nacional (PIN) há 12 anos, o que lhe dá direitos adquiridos. Mas face à nova versão, que entre coisas corta 1,5 hectares à zona verde – desce de 7,2 hectares para 5,7 - a autarquia diz que os “acertos pontuais aos parâmetros urbanísticos” resultaram ainda mais penalizadores para o interesse público do que já se previa. Por conseguinte, o município decidiu passar o parecer de “favorável condicionado” para “desfavorável” porque a proposta “não dá cumprimento” às normas em vigor. Além disso, a câmara exige uma duplicação dos lugares de estacionamento público - mais 325 lugares em relação ao que é proposto. 

As organizações ambientalistas, entretanto, divulgaram as razões por que consideram o plano “uma ameaça” aos valores ambientais e à qualidade de vida. “Uma destruição para a conservação de habitats e espécies da fauna e da flora”, sintetiza Luís Brás, da associação ambientalista Almargem.

A associação diz que o projecto “terá um impacte ambiental gigantesco, que irá promover a alteração profunda da paisagem e a destruição massiva do património natural existente na zona”. De entre os valores em causa, destaca a “destruição do caniçal de Vilamoura, cuja preservação deveria há muito ter sido assumida como uma prioridade”. Algo também apontado pelo Instituto da Conservação da Natureza e Florestas (ICNF) que emitiu parecer “favorável condicionado”, fazendo exigências ao nível da conservação do caniçal que vai ser destruído. Dentro das medidas compensatórias propõe o aumento da área do parque ambiental - passando de 38 ha para 58,8 ha

A proposta urbanística apresentada no EIA prevê construir 2400 camas, mais 47 do que o número previsto pelo Plano de Urbanização de Vilamoura, aprovado em 1998. O dirigente da Almargem, Luís Brás, acha que está a ver o tempo voltar para trás: “Um projecto do passado, desajustado da realidade presente, o qual parece ignorar o futuro”.

A CAIA – que integra a CCDR/Algarve, a Agência Portuguesa do Ambiente, o ICNF, a Direcção Regional de Cultura e a Câmara de Loulé -, quando reuniu em Setembro, já deixava o alerta para os problemas relacionadas com as alterações climáticas, lembrando que “não devem ser descurados, sob pena de comprometermos a própria viabilidade do projecto”. Em resposta à advertência, os cenários agora desenhados não prevêem que o avanço do mar possa chegar às casas a construir à volta dos lagos. O desvio da ribeira de Quarteira e uma intervenção no Vale Tisnado, com recurso a obras de engenharia pesada, é uma das obras de minimização apresentadas pelo EIA, para além de construção de um dique de protecção a cheias. Os impactos negativos do projecto são considerados irrelevantes, para os promotores. “Não possui vulnerabilidade alta a qualquer evento relacionado com as alterações climáticas”, lê-se no documento.

Projecto oculta impactos

A avaliação de sustentabilidade do projecto “não tem rigor, não apresenta medidas concretas para evitar, erradicar e/ou controlar problemas e situações”, diz o movimento cívico Pelo Ribeira de Quarteira - Contra a Cidade Lacustre. No documento, assinado por Rui Amores, advogado, e Lucinda Caetano, arquitecta, são apontadas lacunas referentes aos “impactos cumulativos” do projecto, não encontrando razão para que tal aconteça. A não ser, sublinham, “a justificação, inconfessável, de esconder a verdadeira dimensão do projecto”.

No que diz respeito aos problemas relacionados com a mobilidade – tráfego, caótico, nos meses de Verão – são apresentadas propostas de “modos de transporte suaves”. Porém, a Lusotur, entidade promotora, não esconde os receios da “carga excessiva que a presença das ocupações residenciais e turísticas poderá ter sobre as praias de Vilamoura”. Nesse sentido, o projecto prevê a construção de um silo junto à praia da Falésia, ficando por esclarecer se a exploração do parque vai ser privada ou pública.

Por outro lado, o município de Loulé fez saber que este projecto classificado de PIN em 2008 - com a assinatura de um protocolo que obrigava a medidas de compensação de interesse público, sob a supervisão da CCDR - encontra-se em incumprimento. A Almargem diz existirem “razões legais para suspender projectos como este, antigos e desajustados da realidade”. Por isso, conclui, a decisão da CAIA só pode ser “a emissão de uma Declaração de Impacto Ambiental desfavorável”.

Sugerir correcção