Um quarto das camas de medicina interna estão ocupadas com utentes que tiveram alta

Presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna salientou que 54% dos chamados casos sociais — pessoas com alta hospitalar, que se mantêm nas unidades por não terem para onde ir — estão internados nos serviços de medicina interna.

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Nelson Garrido

O alerta é feito pelo presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna (SPMI): “25% das camas dos serviços de medicina interna estão em permanência ocupadas com doentes com alta clínica e ao mesmo tempo 36% do total de camas sob a responsabilidade da medicina interna estão fora dos nossos serviços.” João Araújo Correia considerou que estes dados, do mesmo dia em que foi colhida informação sobre os internamentos sociais, “têm de ser relevados” e que esta situação de camas indisponíveis por utentes já com alta clínica a leva a pior prestação de cuidados a outros doentes.

Segundo os dados da quarta edição do Barómetro de Internamentos Sociais, da Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares (APAH), no dia 18 de Fevereiro deste ano estavam internadas inapropriadamente nos hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) 1551 pessoas, o que representava 8,7% dos doentes internados daquele dia. A par destes internamentos sociais, a APAH fez ainda um retrato de internamentos inapropriados de doentes com covid positivo. A 5 de Maio, dos 810 doentes internados, 147 poderiam estar a fazer a convalescença noutro local.

“Isto tem muito reflexo na medicina interna”, salientou esta segunda-feira o presidente da SPMI, num debate sobre os dados dos internamentos sociais, lembrando que 54% destes casos estão internados nestes serviços. No mesmo dia em que os dados do barómetro foram recolhidos, a SPMI fez um estudo para saber qual o número de camas extra que a medicina interna tem fora dos seus serviços, chegando à percentagem de 36%. “E metade destas, diria cerca de 600 doentes, permanecem dias internados no serviço de urgência. As nossas camas desperdiçadas correspondem efectivamente a pior tratamento que é dado aos outros doentes”, enfatizou Araújo Correia, referindo que tiveram resposta de cerca de 75% dos serviços de medicina interna do país.

Sofia Borges Pereira, vogal do Instituto da Segurança Social, salientou que as pessoas receberam alta hospitalar “não de cuidados agudos, mas precisam de cuidados clínicos permanentes”. A responsável referiu que nos últimos três anos, “cerca de 15% de todas as referenciações” que receberam para integração de pessoas em estruturas residenciais vieram de altas dos hospitais.

“Temos procurado alargar um conjunto de actividades para dar resposta e também a atenção necessária às famílias e aos cuidadores familiares. Se tudo correr bem, no próximo mês iniciaremos as primeiras experiências piloto com os cuidadores informais”, disse Sofia Pereira, destacando ainda o aumento feito nas pensões mais baixas e o reforço dos valores dos complementos de dependência e solidário a idosos.

“Temos de partir da lógica da promoção da autonomia. Temos de trabalhar muito na reabilitação das várias doenças crónicas”, afirmou Sofia Borges Pereira, considerando por isso que deve haver um reforço da RNCCI e não tanto de estruturas residenciais como lares. “O barómetro veio mostrar que não dá a resposta social que a maior parte das pessoas está à espera”, disse, salientando que a Segurança Social triplicou a capacidade instalada na última década. Segundo a mesma, a Segurança Social tem contractualizadas “233 mil lugares de respostas sociais residenciais só para pessoas idosas” e que a oferta está praticamente toda esgotada.

Purificação Gandra, uma das coordenadoras nacional da RNCCI, sublinhou o crescimento da rede ao longo dos anos, embora reconhecendo que “a oferta se tem mostrado sempre insuficiente”. A responsável lembrou que apesar do aumento de pessoas a aguardar por uma resposta da rede, o tempo de espera diminuiu, o que considera um bom sinal e de confiança neste tipo de resposta. E lembrou que a RNCCI oferece uma intervenção para reabilitação dos utentes para a fase seguinte da sua vida, que pode passar pela colocação da pessoa numa outra estrutura. “A rede não pode ser uma resposta para toda a vida”, disse.

Questionado sobre os internamentos sociais na conferência de imprensa sobre o balanço da covid em Portugal, o secretário de Estado da Saúde admitiu que é um problema que os “preocupa há bastante tempo” e disse ser “natural que se possa ter agudizado um pouco com o surto epidémico.” António Lacerda Sales admitiu que a situação representa “um enorme desafio para o planeamento de políticas sociais” e referiu a resposta da RNCCI, reconhecendo que esta pode melhorar. “Temos neste momento uma cobertura de 64% dispersa pelas diferentes regiões, temos alargado estas respostas. Este ano foram autorizadas já cerca de 570 camas para uma meta até ao final do ano de cerca de 800 camas. Parece que é significativo e melhorará de uma forma significativa a nossa resposta”, disse.

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