Há pessoas que ficam três meses internadas nos hospitais depois de terem alta

Falta de vagas na rede de cuidados continuados e incapacidade das famílias ou falta de respostas na comunidade são os principais motivos destes internamentos “sociais”.

Foto
Idosos são os mais afectados Paulo Pimenta

São sobretudo mulheres com mais de 80 anos as pessoas que já não estão doentes mas ficam internadas nos hospitais por não terem para onde ir, nem vaga na rede de cuidados continuados ou em lares, nem familiares que as acolham.  Os resultados da terceira edição do barómetro sobre “internamentos sociais” levada a cabo pela Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares (APAH) - que desde 2017 faz uma espécie de fotografia do fenómeno, contabilizando o número de camas ocupadas por pessoas que têm alta clínica  – mostram que é cada vez mais difícil encontrar uma alternativa, sobretudo por não haver resposta na rede nacional de cuidados continuados ou por incapacidade de acolhimento dos familiares ou cuidadores.

Esta dificuldade reflecte-se no tempo de permanência no hospital, que, em média, é agora de mais de três meses (98,4 dias), quando no barómetro de 2018 era de pouco mais de dois meses (67,4 dias). Mas os dados revelam que há casos de pessoas que permanecem no hospital oito meses. Mais de 44% das pessoas em internamentos “sociais” têm mais de 80 anos, uma proporção que tem vindo a aumentar ao longo dos três barómetros.

Em 18 de Fevereiro deste ano, havia 829 camas ocupadas com internamentos "inapropriados" num total de 33 hospitais, que representam mais de dois terços das unidades do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Um número que o presidente da APAH, Alexandre Lourenço, calculou, em declarações à Lusa, poder ascender a cerca de mil por dia, considerando  todo o universo dos hospitais públicos. Os dados deste ano “vêm em linha com as duas edições anteriores do barómetro de internamentos sociais – em 2018  eram mais (960) mas, tendo em conta a proporção de doentes internados, o valor é quase igual -, demonstrando que “não houve uma evolução favorável nesta problemática”, lamenta.

A maior parte dos internamentos inapropriados (41%) registaram-se em hospitais da região de Lisboa e Vale do Tejo e do Norte (37%). As camas ocupadas com internamentos por motivos sociais correspondem a cerca de 5% do total e a despesa que representam para os hospitais é da ordem dos 83 milhões de euros por ano, podendo ascender a 100 milhões de euros (calcula-se que o custo diário de um internamento ascenda a 279 euros). “Podíamos usar esse dinheiro em respostas extra-hospitalares e a dar melhor qualidade de cuidados às pessoas”, defende Alexandre Lourenço.

Mas há uma factura que algumas destas pessoas também acabam por pagar por ficarem no hospital sem necessidade: correm o risco de complicações por causa do internamento e de infecções hospitalares. “Podíamos estar a dar melhor qualidade de cuidados fora dos hospitais, com menor risco. Mas mantemos a situação porque não há resposta da comunidade”, enfatizou o presidente da APAH. A  ocupação desnecessária de camas tem também “impacto negativo nos tempos de espera para internamentos” e nos serviços de urgência.

O barómetro de internamentos sociais é uma iniciativa da Associação dos Administradores Hospitalares com apoio da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna e de uma consultora.