Transparência e Integridade pede a Costa que divulgue critérios de apoio aos media
A associação escreveu uma carta ao primeiro-ministro a questionar os critérios usados na atribuição do pagamento antecipado de publicidade institucional e a pedir mais explicações acerca do processo. Governo já confirmou que se enganou nas contas.
O modelo de apoio do Estado ao sector da comunicação social continua a gerar polémica. Esta quinta-feira, foi a vez de a Transparência e Integridade - Associação Cívica (TIAC), filial portuguesa da rede da organização não-governamental anti-corrupção Transparency International, enviar uma carta aberta ao primeiro-ministro, na qual pede mais informação sobre o programa de compra de publicidade institucional para apoiar a comunicação social, que antecipará uma verba de 15 milhões de euros para o sector, em resposta à queda de receitas provocada pela covid-19.
Esta quarta-feira, o PÚBLICO pediu mais esclarecimentos sobre o processo ao Ministério da Cultura. As respostas chegaram esta quinta-feira, pelas 18h45. No entanto, as explicações foram dadas num formato predefinido e não esclarecem as dúvidas colocadas pelo PÚBLICO, nomeadamente a distribuição interna das verbas pelos diferentes órgãos de comunicação social de cada grupo nem se as empresas que recebem este apoio podem ou não despedir trabalhadores.
Na carta, a TIAC recomenda ao primeiro-ministro, António Costa, que torne públicos os critérios que ditaram a repartição dos montantes a investir pelos vários órgãos de comunicação social, um pedido feito já também pela Iniciativa Liberal, num conjunto de perguntas enviadas ao Ministério da Cultura, esta quarta-feira. A TI-PT fez um pedido formal para ter acesso aos critérios que ditaram a resolução do Conselho de Ministros, ao abrigo da lei de acesso à informação administrativa.
A associação diz-se “preocupada” com o facto de os critérios de distribuição das verbas não serem públicos e escrutináveis. “Esta situação é particularmente preocupante quando se verificam diferenças muito significativas nos apoios públicos atribuíveis aos diferentes detentores de órgãos de comunicação social, sem que exista correspondência perceptível na diferença em termos de dimensão empresarial e, mais importante, de alcance noticioso”, lê-se no documento a que o PÚBLICO teve acesso.
Por isso, para a organização não-governamental, é “fundamental que esse apoio seja concedido de forma totalmente transparente e fundamentado em critérios objectivos e equitativos que salvaguardem a confiança pública na manutenção da independência editorial dos beneficiários e no dever de isenção da relação do Estado com os órgãos de comunicação social”.
Na carta, a TIAC pede que sejam esclarecidos os critérios “como seria esperado e desejável num tema de natureza tão sensível como é o da subsidiação directa do Estado à comunicação social – ainda que sob a forma de publicidade institucional”.
A carta chega dois dias depois de serem conhecidos os destinatários do pagamento e depois de ter sido noticiado que o Governo se enganou numa das verbas a atribuir: em vez de 20 mil euros, como consta na resolução do Conselho de Ministros, o Observador deveria receber 90 mil euros, confirmou ao PÚBLICO fonte da administração da rádio e jornal, o que fez crescer as críticas, quer por parte do sector, quer por parte de alguns partidos.
Numa resposta à agência Lusa, o Governo assegurou que a distribuição foi feita “de acordo com critérios proporcionais e objectivos: receitas de comunicações comerciais e de circulação em período homólogo (segundo trimestre de 2019)”. Mas as explicações não convenceram o jornal Observador que irá rejeitar a verba que lhe era destinada, mesmo depois de saber te terá existido um erro. Também a administração do jornal Eco fez saber que irá rejeitar a verba de 19 mil euros por considerar o processo pouco transparente.
Governo confirma que se enganou nas contas
Em entrevista ao jornal Expresso, o secretário de Estado que tutela o sector dos media, Nuno Artur Silva, confirmou que o Governo se enganou nas contas e que estas terão de ser refeitas, sendo que os 70 mil euros vão ser retirados de outros órgãos de comunicação social. "O erro foi de cerca de 70 mil euros, o que num valor global de 11,25 milhões, distribuído por 13 grupos de comunicação social nacionais, não vai ter um impacto muito significativo. Mas vai ter de se mexer no valor dos outros”, explicou.
A organização sublinha que “a imprensa independente é um dos pilares de qualquer democracia” e reconhece que “a crise pandémica coloca necessidades especiais de apoio a este sector crítico". No entanto, ressalva que “isso também exige especiais deveres de transparência e equidade em todo o processo”. “Caso contrário, o apoio à comunicação social arrisca quebrar o laço de confiança dos cidadãos da independência editorial dos beneficiários dos apoios, empobrecendo o debate público e tornando a sociedade mais vulnerável à desinformação e à mentira”, alerta Susana Coroado, vice-presidente da direcção da TIAC.
“Sem transparência, este programa de apoio pode ter o efeito oposto ao desejado, prejudicando a bondade da medida”, conclui.