Bloco rejeita recurso aos privados e propõe um plano de recuperação do SNS

Depois de repetidamente condenar o Governo por não recorrer à requisição civil durante o estado de emergência, o BE critica a ministra da Saúde por admitir recorrer ao sector privado “com dinheiro que poderia reforçar o SNS”.

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Moisés Ferreira, do BE, diz que o recurso aos privados seria "um erro e desconsideração" Nuno Ferreira Santos

O Bloco de Esquerda (BE) entrega, esta segunda-feira, ao Governo um plano para recuperar o esforço do Serviço Nacional de Saúde no combate à pandemia covid-19, com dez medidas de reforço e investimento no sector público, como alternativa ao expectável recurso ao sector privado. Além de propor a criação de uma rede específica de resposta ao coronavírus, os bloquistas propõem a integração definitiva de todos os profissionais contratados de forma temporária, ao abrigo da legislação excepcional de combate à covid-19. E defende que as instituições mantenham a autonomia conquistada, nesta fase, para a contratação de profissionais e aquisição de bens e serviços.

Ao PÚBLICO, o deputado Moisés Ferreira nota que o esforço do SNS nesta primeira fase de combate à covid-19 foi um exemplo “sem precedentes”, mas, nem por isso, os próximos desafios serão mais fáceis. Isto porque, nos últimos meses, várias consultas, tratamentos e cirurgias não urgentes foram adiados e a sua reintegração na agenda exigirá uma capacidade de resposta superior há que existia na fase de pré-pandemia. No entanto, as declarações da ministra da Saúde sobre o “muito possível” recurso ao sector privado, para esta fase de recuperação da actividade, preocupam o BE. Seria uma opção desastrosa”, resume Moisés Ferreira.

Os bloquistas, que durante a fase do estado de emergência insistiram no recurso à requisição de serviços de saúde do sector privado, consideram que seria “um erro dar um prémio imerecido a quem, na fase mais crítica da epidemia falhou ao país” e  seria também “uma opção política que fragilizaria o SNS”. “É uma desconsideração para com o SNS e para com os seus profissionais que não falharam ao país e que merecem mais investimento”, lê-se no diploma a que o PÚBLICO teve acesso.

Como alternativa, o BE defende que, paralelamente à criação de uma rede de resposta exclusiva para o covid-19, deve ser criado um novo regime remuneratório para os profissionais que vão estar envolvidos nesta actividade extraordinária de recuperação de tudo o que foi suspenso e desprogramado nas últimas semanas.

O plano propõe que se aumente o número de profissionais para que se aumente o horário de funcionamento de alguns serviços e de blocos operatórios, o reforço de equipamentos necessários para a telemedicina, a instrução aos centros de saúde para retomarem contacto com os seus utentes, recuperando os níveis de vacinação e de vigilância (que nas últimos meses diminuíram drasticamente). O BE alerta também para a importância de manter, a longo prazo, as linhas de apoio à saúde mental de nível local e nacional, bem como de reforçar o número de psicólogos nos centros de saúde.

“Este plano de recuperação do SNS seria sempre necessário, mas pareceu-nos mais urgente quando ouvimos a ministra dar por adquirido que o Governo iria aumentar o recurso ao sector privado”, conta Moisés Ferreira. Para o deputado, quer seja “por facilitismo”, quer seja “por pressão do sector privado para gerar receitas”, o recurso ao sector “que, durante toda a fase mais dura, até agora se resguardou e não contribuiu no combate à epidemia” é “gravíssimo”, uma vez que representa sempre uma transferência do orçamento do sector público para o sector privado.

Este domingo, na conferência de imprensa diária de balanço dos números do covid-19, a ministra da Saúde alertou que não se sabe ao certo como evoluirá a pandemia e vincou que, por isso, o Governo não poderá “prescindir de quem quer que seja”. O que nos interessa em definitivo é tratar da saúde das portuguesas e dos portugueses e resolver os seus problemas de saúde, se for necessário emitir mais vales de cirurgia fá-lo-emos”, afirmou.

No entanto, Marta Temido defendeu que “a primeira resposta e a primeira obrigação” cabem ao SNS e que não deixará “a parte menos fácil para os outros”. E também aqui o BE levanta preocupações. “Isso pode levar a uma segmentação”, alerta Moisés Ferreira. O deputado acredita que o plano do Governo fará com que o SNS “fique com o que é mais complexo, de maior risco e com maiores custos”. Para o BE, essa segmentação poderá traduzir-se também na saída de profissionais do sector público para o sector privado.

"O SNS mostrou que tem capacidade de resposta e deve ser nele que deve ser feito o investimento, para que continue à altura de todos os desafios”, argumenta o deputado. Por oposição, “ainda que tivessem uma capacidade que não estava a ser utilizada, as unidades de saúde privada fecharam portas e fizeram declarações públicas sobre recorrer aos doentes com covid-19 para recuperar receitas perdidas”, contrapõe.

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