Deco preocupada com alteração de condições nas moratórias de crédito ao consumo

Banco de Portugal ainda não regulamentou a informação a prestar sobre moratórias de crédito à habitação. Há queixas de clientes “empurrados” para apenas uma modalidade.

Foto
Carlos Costa, governador do Banco de Portugal, será hoje ouvido pelos deputados LUSA/ANTÓNIO COTRIM

Milhares de famílias já tiveram acesso às moratórias do crédito à habitação e ao consumo, soluções criadas pelo Governo e pelos bancos para suspender total ou parcialmente as prestações dos empréstimos, num momento em que muitas estão a sofrer uma redução dos seus rendimentos. Mas algumas práticas bancárias deixam a associação de defesa dos consumidores Deco preocupada, como a falta de informação sobre as diferentes modalidades das moratória e o agravamento de condições em alguns empréstimos ao consumo e a falta de solução para outros.

Esta terça-feira, Carlos Costa, o governador do Banco de Portugal (BdP) será ouvido no Parlamento sobre o papel do sector bancário no apoio às famílias e à economia no contexto da pandemia de covid-19.

A audição de Carlos Costa surge na sequência do requerimento do CDS-PP para ouvir os cinco maiores bancos, o que já aconteceu na semana passada.

Uma das explicações que o governador deverá dar prende-se com o atraso na regulamentação dos deveres de informação a prestar pelos bancos sobre as diferentes moratórias do crédito, uma exigência criada pelo Decreto-Lei nº 10-J/2020 de 26 de Março e alterada pela lei 8/2020, que veio estabelecer novas regras, nomeadamente a da obrigatoriedade de os bancos informarem os clientes da solução pública, antes de formalizarem a suas próprias.

O PÚBLICO questionou o supervisor do sector bancário sobre a falta de regulamentação, mas ainda não obteve resposta.

À Deco têm chegado queixas de clientes de alguns bancos que se sentem “empurrados” para apenas uma das modalidades da moratória do Estado, a da suspensão total das prestações, e igualmente apenas uma das soluções das chamadas moratórias privadas (dos bancos), a da suspensão de capital.

Isto quando, dentro das moratórias - a do Estado e as dos bancos -, há as duas modalidades, a que permite a suspensão total das prestações do crédito à habitação (capital e juros), ou parcial (apenas capital, continuando a pagar os juros), que têm custos diferentes no futuro.

Tal como o PÚBLICO noticiou, o Santander é um dos bancos que oferece uma das modalidades no serviço online Netbanco, com fonte oficial da instituição a adiantar que os clientes que pretendem suspender apenas a amortização de capital têm de ligar para a linha de atendimento telefónico.

Para além da oferta das duas modalidades, Natália Nunes, directora do Gabinete de Protecção Financeira (GPF) da Deco defende que seria “muito importante que fosse dado aos clientes uma simulação sobre o impacto das medidas na prestação e nos encargos com juros”.

Em declarações ao PÚBLICO, Natália Nunes revela que tem chegado algumas queixas de consumidores que, quando pedem acesso às moratórias para o crédito ao consumo têm visto as condições dos mesmos agravadas, quer no que se refere a taxa de juros, quer na introdução de comissões que anteriormente não existiam, como a do pagamento das prestações. A responsável pede, por isso, uma fiscalização apertada dos bancos.

A directora do GPF considera ainda preocupante que os bancos tenham excluído o crédito concedido através dos cartões da sua moratória – a do Estado é exclusiva para o crédito à habitação – ­que tem um peso elevado em alguns clientes que, como é o caso de muitos recibos verdes, ficaram sem qualquer rendimento, na sequência da pandemia.

Para além da moratória dos bancos para o crédito ao consumo, criada no seio da Associação Portuguesa de Bancos, as sociedades de crédito especializado, grande parte dele contratado nos postos de venda ou através de cartões de crédito associados a grandes cadeias de distribuição, também criaram a sua própria moratória.

A esta moratória aderiram boa parte das entidades responsáveis por este tipo de crédito, com o Credibom ou o Cofidis, mas outras ficaram de fora, como o Wizink, que, através dos cartões de crédito, tem um peso muito significativo em muitas famílias.

Contactado pelo PÚBLICO, fonte oficial adiantou que o WiZink está, neste momento, a avaliar a proposta da ASFAC que considera “oportuna”. Adianta, no entanto, que a instituição tem estado a apresentar soluções próprias aos clientes. Trata-se, segundo avança, de “soluções personalizadas, atendendo às situações específicas de cada cliente”, e que “poderão passar pela revisão de preços, renegociação dos produtos contratados, entre outras, avaliando a natureza, estrutural ou temporária, das dificuldades expressas pelos clientes”.

Natália Nunes mostra-se ainda preocupada com as facilidades de acesso ao crédito pelos consumidores, promovido voluntariamente pelos bancos junto de muitos clientes, numa altura em que o próprio Banco de Portugal aligeirou alguns critérios na sua concessão.

Sugerir correcção