Autarcas têm autonomia política para falarem sobre os seus municípios

Perante disparidade de números, a ministra Alexandra Leitão garante que há coordenação, mas que os autarcas têm “autonomia local” e “legitimidade democrática”. Já a ANMP afirma que esse estatuto está “constitucionalmente” garantido.

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A ministra Alexandra Leitão garante que o Governo está a coordenar com as autarquias a resposta à pandemia daniel rocha

Impor regras de comunicação de informações aos presidentes de câmara, por parte do Governo, “viola a autonomia local e a própria legitimidade democrática” dos autarcas, afirmou ao PÚBLICO Alexandra Leitão, ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública, que têm a tutela do poder local, quando questionada sobre o que poderá o Governo fazer para dar aos cidadãos confiança nos dados oficiais sobre a pandemia de covid-19.

Igualmente a Associação Nacional de Municípios (ANMP) é peremptória em recusar impor regras de comunicação aos autarcas. Questionada através de um responsável, a ANMP esclareceu ao PÚBLICO que “não é tutela dos municípios” e frisou: “Os municípios têm autonomia política e administrativa constitucionalmente garantida, logo cada autarca responde pelo seu município”.

O problema é que, nos últimos dias, os cidadãos têm sido surpreendidos pela discrepância de números de mortos e infectados entre os números que são avançados pela Direcção-Geral de Saúde (DGS), no seu boletim diário, e o que vários autarcas têm afirmado sobre a situação e as consequências da pandemia de covid-19 nos seus concelhos. O que pode instalar a dúvida sobre a veracidade dos dados oficiais.

O caso mais evidente é o de Ovar, que está sob o regime de estado de calamidade pública, desde há uma semana, e cujo presidente da câmara, Salvador Malheiro, tem insistindo na ideia de que o número de contaminados por covid-19 no concelho é muito superior do que o divulgado pela DGS. Mas também o presidente da Câmara de Paços de Ferreira tem dito o mesmo.

“Trabalhado em conjunto”

A ministra Alexandra Leitão garante que tem havido coordenação entre o Governo e as autarquias. “Temos trabalhado em conjunto, os autarcas estão muito empenhados”, afirma. E, embora reconheça que “mais coordenação é sempre ideal”, considera que “a resposta geral está a ser boa”, já que Portugal vive “uma situação muito difícil, com problemas nunca imaginados”.

Alexandra Leitão explica que “a coordenação do Governo com os autarcas é feita a nível sectorial”, através dos ministérios “da Segurança Social, Administração Interna e Saúde” e, ao “nível transversal”, pelo seu ministério.

Além disso, a ministra sublinha que quer ela própria, quer o secretário de Estado da Descentralização e da Administração Local, Jorge Botelho, têm estado “em contacto directo com os autarcas” e têm “respondido a dúvidas e dificuldades, ou directamente ou através dos serviços”.

Foi para fazer face às solicitações dos autarcas que se “criou, na Direcção-Geral das Autarquias Locais, uma caixa de email, que está operacional desde segunda-feira, para que os autarcas dirijam dúvidas e questões”, adianta a ministra, garantido que “as perguntas são tratadas e as respostas dadas”.

Além disso, destaca, têm sido enviadas aos autarcas “indicações específicas nos despachos de orientações sobre as regras de trabalho na função pública, nomeadamente do teletrabalho, sobre o distanciamento social e o fecho de serviços de atendimento presencial.” Além de estarem “suspensos os prazos dos procedimentos nas autarquias locais” e também a realização de assembleias municipais ou de freguesia.

Costa garante números

Procurando esvaziar a polémica e a falta de confiança que, eventualmente, se pode instalar sobre os números da DGS, o primeiro-ministro, António Costa, esclareceu, esta quarta-feira aos jornalistas, que os números oficiais divulgados diariamente “são a agregação” dos dados que cada médico insere na plataforma central. “A DGS não produz números. Todos os números que inscrevemos aparecem mesmo lá”, garantiu, acrescentando: “É com base nessa informação, que é credível, que podemos trabalhar.”

Pouco depois foi a vez de o secretário de Estado da Saúde, António Sales, explicar que “os dados divulgados pela DGS, reportam ao dia anterior”, razão pela qual “é natural que, quando são apresentados, a realidade possa ter mudado” e que “quem está no terreno possa ter uma percepção diferente do boletim epidemiológico”.

Já a directora-geral de Saúde, Graça Freitas, garantiu que os dados oficiais “estão absolutamente certos” e que “o número de mortes é inquestionável”, pois “entram à meia-noite numa plataforma electrónica”. E sublinhou: “Se o dado não coincide com o da freguesia, é porque ainda não chegou até nós”. Admitindo que “pode haver aqui pequenos desencontros”, defendeu que “não há nenhum objectivo de enganar, mentir ou omitir”. Até porque reconheceu: “É impossível mentir numa situação destas.”

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