Como manter a saúde mental em tempos de quarentena
A tensão está no ar e é muito importante manter as emoções controladas, sob o risco da pandemia atingir também o seu casamento ou a sua relação com os seus filhos e outros familiares.
Ainda que todos estivéssemos informados sobre o que se estava a passar noutros países, a grande maioria só reconheceu a dimensão do problema com o aumento do número de casos do coronavírus em Portugal.
Este reconhecimento está a obrigar as pessoas a reajustarem-se, implicando mudanças para as quais muitas não estão preparadas. Pessoas com rituais diários na comunidade, como ir à missa, ao mercado, ao ginásio ou ao café conversar com um colega ou com quem lá estiver são agora obrigadas a outras rotinas, sem contacto presencial.
O afastamento social obriga a pessoa a deixar o seu local de trabalho e a estar em casa (a trabalhar ou não), sendo, em qualquer das hipóteses, uma fonte de stress. Aliás, a tensão está no ar e é muito importante manter as emoções controladas, sob o risco da pandemia atingir também o seu casamento ou a sua relação com os seus filhos e outros familiares.
Os seres humanos necessitam de sentir controlo e mudar rotinas de modo súbito e forçado causa uma sensação de ameaça maior do que aquela esperada numa situação normal de mudança. As mudanças requerem um tempo de readaptação que, neste momento, dadas as circunstâncias, não temos, e isso pode aumentar os níveis de medo e de ansiedade. É esperado que seja assim para qualquer pessoa.
Associado aos sentimentos esperados numa situação de alarme, encontram-se a tristeza, a angústia, a frustração, a raiva e a depressão. Qualquer pessoa que, de manhã, ouve nas notícias as actualizações do agravamento diário do número de casos positivos do coronavirus, sente um friozinho na barriga e a sensação de falta de controlo. Todos estamos mais ou menos assim, uns mais do que outros menos. A dificuldade acrescida pode surgir para quem já sofre de ansiedade, depressão ou outra perturbação do foro mental. Ou seja, é mais ansioso, mais preocupado e encara as coisas de forma mais negativa. Mas, atenção, é preciso clarificar que nem todas as pessoas que sofrem de algum problema psicológico irão, necessariamente, sentir-se pior.
Antes de mais, é preciso aceitar que não há uma forma certa ou errada de reagir emocionalmente. Cada pessoa é diferente e viveu coisas diferentes, temos de respeitar estas diferenças. Há, sim, formas de reagir que devem ser respeitadoras do espaço dos outros e isto faz a diferença. Quem compreende que está a sentir-se pior ou com mais sintomas, deve tomar medidas para tentar reduzir a incerteza e aumentar as suas capacidades para lidar com este momento difícil.
Não esqueça que esta condição de afastamento social é uma medida para que o vírus não se propague, que não irá durar para sempre, cumpri-lo é uma responsabilidade social. Lembre-se que o nosso cérebro está em constante aprendizagem, modificando-se com as nossas experiências diárias. No momento actual, o seu cérebro está a fazer ajustes para acomodar aquilo que está a viver. Em breve estará mais ajustado a esta nova rotina porque novos hábitos se vão instalar.
Como evitar o aumento de sintomatologia ansiosa e depressiva?
Uma forma de ajudar a lidar melhor com a quarentena, procurando evitar o aumento de sintomatologia ansiosa e depressiva é atribuir um significado relevante à mesma, ou seja, o que representa para si estar de quarentena ou em isolamento? Uma possibilidade é olhar para esta medida como um comportamento individual de respeito para com toda a comunidade. Ou, simplesmente, concluir que está a fazer isto pela sua família, de modo a não ser um potencial transmissor do vírus. Dar um significado ao que estamos a fazer ajuda-nos a flexibilizar e a encarar melhor os desafios.
Para lidar melhor com o momento e tentar reduzir os sintomas mais agravados e persistentes de ansiedade, construa a sua própria “caixa de ferramentas”; assim estará preparado para poder usar aquela que melhor se ajustar a cada momento, gerindo a situação e repondo a cada dia uma sensação de conforto.
É importante acreditar que irá ser capaz de lidar com este momento, usando como fonte de inspiração alguns momentos do passado em que foi capaz de enfrentar outras situações difíceis. O que fez? A quem recorreu? O que pode ir buscar ao seu comportamento do passado que pode ser útil no presente? O que é que diria aquela pessoa que foi importante na sua vida e que já não está presente? O que é que ela faria? Como é que ela o acalmaria?
Procure uma forma de expressão de emoções que possa praticar em casa, mas de modo privado. Por exemplo, desenhar, escrever, cantar uma música que expresse o que sente, dançar, praticar ioga ou meditação. Mesmo que nunca tenha feito nada disto, escolha uma forma de expressão emocional com a qual se sinta mais confortável de modo a mudar o seu estado interno, criando serenidade e confiança.
Outra ferramenta, já bastante falada, mas funcional para manter a saúde mental e a controlar as emoções negativas, é manter rotinas e organizar o dia em intervalos de trabalho/estudo, lazer e descanso. Encarar esta pausa obrigatória como férias pode ser contraproducente, sobretudo para quem não está habituado ou não tem particular gosto por estar em casa. Faça uma lista de coisas que pode fazer sozinho, com os seus filhos e em casal e inclua coisas que lhe dêem prazer, como ver aquele filme ou ler o tal livro que está há muito na prateleira.
Mantenha o contacto regular com a família e amigos, através do telefone, vídeo chamadas ou pelas redes sociais. Fale de si e dê espaço ao outro para falar sobre ele também, seja um bom ouvinte.
Se tiver filhos, ocupe-se deles, mas alterne também os cuidados com o seu companheiro, de modo a ninguém ficar sobrecarregado.
Procure ter momentos diários de relaxamento, mesmo que sejam breves.
Levante-se à hora habitual, não passe o dia de pijama e faça as refeições a horas, mantendo um regime alimentar saudável, sem cair na tentação de comer guloseimas a mais. Vai arrepender-se mais tarde.
Crie uma rotina de exercício físico e convide as outras pessoas a fazerem também.
Não veja todos os noticiários do dia, mas sim, em períodos definidos e espaçados. Tente filtrar o que ouve e evitar construções de cenários baseados em hipóteses sem sustentação. A nossa capacidade de gerir grandes quantidades de informação é limitada e podemos cair na armadilha de fazer leituras automáticas e que não são reflectidas, acreditando no que não corresponde à verdade.
Se continuar a sentir, durante muitos dias e de forma intensa, tensão, ansiedade, confusão, dificuldade em dormir ou hiperinsónia, pouca ou muita fome, incapacidade em realizar as actividades do dia-a-dia que antes fazia, ou desejo de consumir álcool e/ou drogas para amenizar a situação, procure um profissional de saúde ou ligue para a linha SNS24.