Capitão Fausto com orquestra: um “presente” para os fãs no Campo Pequeno

Um ano depois do lançamento do quarto álbum, A Invenção do Dia Claro, o quinteto de Alvalade regressa a Lisboa para um concerto que fecha um ciclo de mais de meia centena de espectáculos, com mais de cinquenta músicos em palco.

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Adriano Miranda
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No centro do Parque D. Pedro I, em Aveiro, há uma antiga casa de chá, escondida entre árvores, com janelas viradas para um lago, que tem música. De dentro de uma das salas sai o som de violinos a abrir espaço para um conjunto de flautas se intrometerem. Há uma pausa na melodia e entra uma harpa que serve de sinal para uma secção rítmica feita de contrabaixos e de um bombo subtil a marcar o tempo. Quem toca é a Orquestra Filarmonia das Beiras, que muitas vezes utiliza aquele espaço para ensaiar. Desta vez, fá-lo num trabalho distante do universo musical que habitam.

A melodia que se ouve é de uma das duas dezenas de músicas que os Capitão Fausto vão tocar este sábado no Campo Pequeno, em Lisboa (22h00), num concerto especial com uma orquestra de 43 músicos e três vozes no coro, que assinala um ano desde o lançamento do quarto álbum do quinteto de Alvalade, A Invenção do Dia Claro. O concerto, com este formato, tem data única no país.

A liderar a orquestra está Martim Sousa Tavares. O maestro responsável pelos arranjos passa as partituras de ponta a ponta; vai parando e pedindo aos músicos que voltem atrás quando é necessário; repete os compassos que estão menos oleados e discute com os músicos pormenores com abertura para aceitar sugestões dos executantes. À data, faltava pouco mais de uma semana para o concerto deste sábado, e o PÚBLICO acompanhou um dos ensaios.

Sentados num dos cantos, assistem três elementos dos Capitão Fausto: Tomás Wallenstein, Manuel Palha e Salvador Seabra. Já tinham ouvido os esboços que o maestro lhes tinha enviado, mas em formato midi. Esta é a primeira vez que ouvem os arranjos para as suas músicas tocados pela orquestra. É também a primeira vez que têm oportunidade de ver de fora parte daquilo que será um concerto da banda. Tanto nos espectáculos como nos ensaios habituais, não o conseguem fazer. Enquanto o ensaio decorre, ouvem passar a pente fino temas dos quatro álbuns, como Córazon, Sempre bem, Semana a semana, Dias contados, Boa memória, Santa Ana, Morro na praia, Maneiras más ou Alvalade

A responsabilidade é grande. Apesar de já terem recorrido a orquestrações em estúdio, é a primeira vez que os Capitão Fausto o fazem ao vivo. Mas a banda parece depositar toda a confiança em quem dirige os músicos. São poucos os reparos que fazem. Na maior parte do tempo, os três músicos deixam-se ficar de fora, apenas a apreciar o trabalho dos executantes. Salvador Seabra vai imaginando a bateria à sua frente e com umas baquetas imaginárias aplica golpes de tarola e prato de choque invisíveis; Tomás Wallenstein vai trauteando as letras, enquanto Manuel Palha acompanha Seabra que troca o air guitar por uma segunda bateria.

Só conseguimos imaginar o resultado da fusão entre banda e orquestra. Só mais perto da data do concerto é que avançariam para ensaios em conjunto. Ali, interessava apenas passar as partituras do papel ao som. E o que se ouviu deixa-nos adivinhar que as músicas ganharão uma nova cor sem que os originais caiam para segundo plano. Pelo contrário, a dinâmica dos arranjos, entre o onírico, o contemplativo e algumas vezes o experimental de uma orquestra composta por quatro dezenas de músicos, leva-nos a crer que os temas serão catapultados para um patamar mais elevado.

Sem tirar o pé do acelerador

A dada altura, o maestro diz ser necessário “tirar o pé do acelerador”. Refere-se à intensidade que a orquestra está a imprimir em determinado momento que pede menos vigor. Os instrumentistas que aguardam pelo seu momento de entrada vão-se entregando aos arranjos de Martim Sousa Tavares, entrando no espírito dos Capitão Fausto com um bater de pé ou um balançar de cabeça ao ritmo das composições.

Uma actuação sem tirar o pé do acelerador, prometem os elementos da banda, que, no último ano, depois de editarem A Invenção do Dia Claro, subiram a palco cerca de cinquenta vezes, sobretudo em auditórios, mas também nalguns festivais, como aconteceu em Paredes de Coura, com um anfiteatro inteiro a entoar em coro os seus temas. Passaram também pelo Brasil, para tocarem com os brasileiros Terno. Anos antes, tinham lá estado a trabalhar no álbum Têm os Dias Contados

O último disco deu aos Capitão Fausto muito trabalho, mas um “trabalho bom”, antes e depois do lançamento, diz Wallenstein ao PÚBLICO. Foi um álbum que “rendeu” muita estrada, com salas “muitas vezes esgotadas”. O concerto deste sábado no Campo Pequeno acaba por ser o encerrar desse ciclo, e irá dar origem a outro, no qual continuarão a caber os temas mais recentes, até porque ainda não há data para um novo registo de originais.

Totalmente concentrados neste espectáculo, dizem que será um concerto que serve de “presente” para os fãs, mas também para eles mesmos. Assim que souberam da possibilidade de tocarem no Campo Pequeno, decidiram que esta oportunidade tinha de ser assinalada de forma especial. Daí até idealizarem o concerto em formato orquestra foi um passo muito curto.

Uma vontade antiga

Os Capitão Fausto já há muito tempo pensavam trabalhar com Martim Sousa Tavares. Conhecem-se desde os tempos do liceu e, nos últimos anos, sempre que se encontravam, falavam em fazer algo em conjunto. Acontece agora, porque se proporcionaram as condições certas.

Martim Sousa Tavares, que dirige a Orquestra Sem Fronteiras, explica que a escolha da Filarmonia das Beiras se deveu a tratar-se de uma orquestra mais talhada para este tipo de trabalhos, já com uma vasta lista de participações semelhantes. No palco, com o maestro, estarão os cinco elementos da banda, 43 instrumentistas e três vozes.

O que foi composto, explica, “não é uma trilha de karaoke para o Tomás cantar por cima”. O maestro diz ter existido o cuidado de não “entupir os ouvidos” dos fãs, nem imitar o que a banda faz em estúdio. O objectivo foi “agarrar” o que estava feito e “expandir” para algo mais completo. 

No final desta primeira audição com a orquestra, Martim Sousa Tavares disse que a banda correspondeu às expectativas. Manuel Palha confessou ter-se emocionado com o primeiro impacto. Tomás Wallenstein também se mostrou comovido. Todos concordaram que trabalhar com o maestro foi muito fácil, pela forma como ele conseguiu captar a energia dos temas e por ter acertado na abordagem logo à primeira. “Foram poucas as vezes em que foram feitos acertos”, diz o vocalista e guitarrista. 

Depois de um ano com o último álbum na estrada, o alinhamento para o concerto do Campo Pequeno vai passar por grande parte da discografia da banda. Vão tocar 22 músicas durante cerca de duas horas. Mas, desta vez, os temas terão outra roupagem: “Há uma quantidade de cores que a orquestra traz, e que adoramos. Primeiro, pela sonoridade; e depois porque somos incapazes de reproduzir o mesmo enquanto banda”, acrescenta Wallenstein.

O espectáculo vai ser registado em áudio e em vídeo. A banda ainda não sabe o que fará com os registos. Mas não descarta a hipótese de um dia editar um dos formatos.

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