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Por uma melhor saúde mental em Portugal

O aumento do sofrimento mental sem acesso a cuidados de saúde adequados, perante as transformações demográficas a que assistimos na última década, é hoje amplamente reconhecido pela população portuguesa.

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Nelson Garrido

Um retrato estatístico da saúde mental em Portugal revela a existência de uma alta prevalência de perturbações mentais e uma das mais altas taxas de consumo de psicofármacos da Europa.

O Plano Nacional de Saúde Mental (criado em 2008 e baseado nas recomendações dos exemplos das organizações mundiais para a intervenção em saúde mental) prometia revolucionar o modo de intervenção, prevenção e promoção da saúde mental no contexto português. Contudo, verifica-se que não foram cumpridos os objectivos propostos por esse plano. Em 2020, verifica-se que o desenvolvimento de equipas comunitárias de saúde mental e de programas de reabilitação psicossocial (elementos-chave de um sistema moderno) ficam aquém daquilo que estava planeado, continuando a existir uma excessiva utilização de recursos nas actividades hospitalares e com pouca actividade comunitária, favorecendo modelos de cuidados há muito ultrapassados.

Devido aos cuidados de saúde primários e aos progressos alcançados na descentralização dos serviços especializados de psiquiatria, a percentagem de casos tratados no nosso país está entre os melhores da União Europeia. Contudo, continuamos ainda com problemas significativos de equidade e qualidade no acesso a cuidados de saúde mental. O aumento do sofrimento mental sem acesso a cuidados de saúde adequados, perante as transformações demográficas a que assistimos na última década, é hoje amplamente reconhecido pela população portuguesa.

Ultrapassar estes desafios exige uma mudança de paradigma, sendo que esta já tem vindo a ser concretizada na saúde mental ao nível mundial. Uma mudança que envolve a passagem de uma perspectiva centrada na exclusão do doente mental para uma perspectiva que privilegia, sobretudo, a sua integração na sociedade.

Portugal vive num sistema “hospitalocêntrico” impossível de sustentar no futuro e pouco adequado à realidade da saúde. Na saúde mental, a realidade não é diferente. É urgente uma mudança de paradigma onde os cuidados de saúde devem girar à volta do doente e da sua família — e não do hospital. Precisamos de uma revolução na forma como apoiamos a pessoa com doença mental. Necessitamos de abandonar os modelos de gestão vertical em detrimento de um modelo de gestão horizontal, circular e integrado. A passagem de um modelo de cuidados centrados no hospital para um modelo integrado de base comunitária. Um modelo que coloca uma ênfase crescente no apoio à autonomia das pessoas com doença mental e no reconhecimento do seu direito a terem uma palavra de escolha no seu próprio caminho, sem negar as suas diferenças. Um paradigma assente numa gestão integrada de casos e num modelo colaborativo entre cuidados especializados e cuidados primários, bem como uma preocupação crescente com a prevenção das doenças e a promoção da saúde.

Necessitamos, urgentemente, de uma revolução na saúde mental, enquadrada numa visão que pretende substituir o modelo biomédico estrito por uma abordagem mais abrangente, em que se tenta compreender a doença mental em função da interacção complexa dos factores biológicos, psicológicos e sociais.

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