Pedro Baptista (1948-2020): um percurso de resistência antes e depois do 25 de Abril
Antifascista, foi uma das figuras da extrema-esquerda antes e depois do 25 de Abril. Nas últimas décadas conciliou uma actividade política diversificada com a publicação de várias obras de ficção e ensaio. Era o comissário das comemorações da revolução liberal de 1820.
Pedro Baptista, antifascista, escritor e ensaísta, de 71 anos, morreu subitamente na manhã desta quinta-feira no Porto. A sua morte foi conhecida horas antes de ser inaugurada a exposição 1820. Revolução Liberal do Porto, comissariada por José Manuel Lopes Cordeiro, que deu início às comemorações da revolução, das quais era comissário geral. A Câmara do Porto decretou para esta sexta-feira um dia de luto pela morte do deputado municipal.
Terá morrido pouco depois das 9h, após ter publicado um post na sua página do Facebook – “É hoje! Até já!”, dizia, numa alusão à exposição sobre a Revolução Liberal do Porto – e saído, como era hábito, para passear a sua cadela.
Natural do Porto, Pedro Rocha Baptista era licenciado e doutorado em Filosofia pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto e deu aulas de Filosofia em várias escolas secundárias do país
Fez parte de uma geração de jovens estudantes contestatários do regime que foram muito marcados pelo Maio de 68 e que se envolveram já nas eleições de 1969, intervindo nas franjas da Comissão Democrática Eleitoral (CDE). Começa logo depois a trabalhar na criação e uma organização clandestina, que nos finais de 1971 começará a publicar o jornal comunista O Grito do Povo. Este grupo viria mais tarde a fundir-se com a organização O Comunista e a dar origem à OCMLP – Organização Comunista Marxista-Leninista Portuguesa, que Pedro Baptista liderou. Preso quando reentrava em Portugal após uma saída clandestina, é bastante torturado pela PIDE em 1973. “A polícia política prende-o como estudante refractário, por não ter cumprido o serviço militar, e não pelas actividades políticas”, diz o historiador e amigo José Manuel Lopes Cordeiro. “Na prisão tem um comportamento exemplar, apesar de ter sido muito torturado, e acaba deportado para Angola, onde ainda está no 25 de Abril”, acrescenta. A Revolução de Abril trá-lo de volta a Portugal, onde vive o PREC (Processo Revolucionário Em Curso).
Após a extinção da OCMPL, em meados dos anos 80, vai mantendo alguma actividade política. Entre 1995 e 1999 foi deputado na Assembleia da República, eleito pelo Porto nas listas do Partido Socialista. Em 2008, candidatou-se, sem êxito, à liderança da Federação Distrital do Porto do PS.
Mais tarde, deixou o PS e lançou um efémero Partido do Norte, tendo sido ainda candidato do Partido Democrático do Atlântico pelo círculo do Porto. O presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, convidou-o a integrar a sua lista de candidatos à Assembleia Municipal nas eleições de 2013 e 2017.
Regionalista convicto e ferrenho adepto do FC Porto, o seu percurso político fica marcado pelo grande contributo cívico e político ao serviço da cidade do Porto.
Como escritor, estreou-se em 1986 com o livro Ao encontro do Halley: O Homem e o Cometa (Afrontamento, 1986), um “ensaio de psicologia e antropologia”, e publicou depois vários romances e livros de contos, incluindo Sporá (1992), que foi finalista do Grande Prémio de Romance da Associação Portuguesa de Escritores, O Cavaleiro Azul (2001), Pessoas, Animais e Outros que Tais (2006) e A Queima do Cão de Palha (2008). Em 2007, inaugurara os Cadernos do Campo Alegre, editados pelo jornal O Progresso da Foz, com Centenário do Gabiru, evocação dos cem anos da publicação de Os Pobres, de Raul Brandão.
O seu interesse pelo movimento da chamada Filosofia Portuguesa, e em particular pela história e pelo projecto da primeira Faculdade de Letras do Porto, criada por Leonardo Coimbra, está reflectido em livros como A Pluralidade na Escola Portuense de Filosofia: O Pensamento Moral e Político de Newton de Macedo (2010), O Filósofo Fantasma: Lúcio Pinheiro dos Santos (2010) ou O Milagre da Quinta Amarela (2012). Deve-se-lhe ainda a organização dos três volumes da obra completa de Francisco Newton de Macedo, editados em 2014 pela Universidade Católica do Porto.
Em 2014 e 2015, lançou os dois volumes das suas memórias – Da Foz Velha a'O Grito do Povo e Da Revolução Gorada aos Desafios do Presente –, aos quais previa acrescentar um terceiro que já não teve tempo de escrever. Já muito adiantado estava um livro dedicado à China, por onde viajou muito nestes últimos anos.
Rui Moreira anunciou que Pedro Baptista será velado esta sexta-feira, possivelmente a partir das 17h, na Fundação Eugénio de Andrade, no Passeio Alegre, na Foz.