A TripApp não é mais uma aplicação para quem se prepara para viajar (pelo menos, não no sentido mais comum do verbo). Antes, a app quer ser uma ferramenta digital “de redução de riscos” e minimização de danos associados ao consumo de substâncias psicoactivas — noutras palavras, quer prevenir “bad trips” (ou más experiências).
É assim que Cristiana Vale Pires, membro da Kosmicare, a apresenta. A associação é a parceira portuguesa na construção e tradução da aplicação que assinala num mapa os programas de troca de seringas, salas de consumo assistido ou seguro, serviços de drug checking e projectos de intervenção esporádica em festivais e outros ambientes de lazer nocturno, rastreios de VHI ou de outras infecções sexualmente transmissíveis.
Estão, para já, mapeados “1200 serviços de redução de riscos localizados em 15 países europeus”, contabiliza a investigadora de pós-doutoramento na Universidade Católica do Porto. Seleccionando o Porto, por exemplo, surgem no mapa seis pins, que assinalam projectos como o SAOM - Projecto Aqui e Agora, o Arrimo - Projecto Elos e o Norte Vida.
Em Portugal, diz Cristiana, o único serviço regular, gratuito e confidencial de análise química de substâncias psicoactivas é o drop-in da Kosmicare, aberto às terças e quartas-feiras, das 16h às 21h, na Penha de França, Lisboa.
A associação descreve-o como “um espaço seguro e confidencial onde podes partilhar as tuas experiências ou colocar as tuas dúvidas relacionadas com o consumo de drogas”. Há nove meses que uma carrinha de consumo assistido pára no Beato e em Arroios, ultrapassando as duas salas que deverão abrir este ano para assistir o consumo também em Lisboa e a um primeiro equipamento no Porto.
A aplicação criada pela YODA (Youth Organizations for Drug Action), NEWNet e Help Not Harm, três organizações não-governamentais sem fins lucrativos, e co-financiada pelo programa Erasmus+.
Mas a principal vantagem da TripApp, além da partilha e centralização de informação sobre consumo seguro que outros projectos já disponibilizavam, é o sistema de alerta “sobre lotes de drogas potencialmente arriscados”. É possível receber avisos sobre substâncias alteradas ou contaminadas distribuídas na área onde o utilizador da aplicação disse estar e horas depois de serem identificados por um dos laboratórios da rede
TEDI - Trans European Drug Information Project (por razões de privacidade, e até porque há países europeus onde o consumo de drogas é totalmente ilegal, a app não recolhe a localização GPS do telemóvel).
“Nos sistemas de alertas tradicionais, pode demorar meses entre a colheita de amostras pela polícia, depois os testes, o envio dos resultados para o Ministério da Saúde ou outras agências governamentais relevantes, e depois a serem disseminadas para o público em geral. A TripApp faz isto em algumas horas”, garante Jan Stola, directora executiva da YODA, em comunicado enviado ao P3.
Os alertas também podem ser submetidos por consumidores, depois de realizarem testes colorimétricos caseiros (testes de cor com diferentes reagentes usados para determinar a presença de certa substância numa amostra). “Estes resultados são menos credíveis, devido à margem de erro dos testes” e a possíveis falhas humanas no preenchimento do relatório, atenta Cristiana.
A aplicação inclui ainda um capítulo sobre a legislação que vigora em 30 países europeus sobre a aquisição, posse e distribuição de drogas e está disponível gratuitamente na Google Play (e, em breve, na App Store) em 16 línguas.