Braga: câmara defende transformação da Confiança em residência universitária
Instalação de alojamento para cerca de 300 estudantes contempla requalificação da antiga fábrica de sabonetes e perfumes e a construção de um edifício de sete pisos num terreno adjacente, segundo um pedido de informação prévia (PIP) elaborado pela autarquia, que deve ser respeitado pelos privados.
Desde que a Confiança deixou de laborar na Rua Nova de Santa Cruz, a leste do centro histórico de Braga, no ano de 2005, já se propuseram vários usos para o edifício datado de 1921, como o de centro cultural, de incubadora de empresas tecnológicas ou o de centro Ciência Viva. A câmara municipal determinou, porém, que o espaço está destinado ao alojamento universitário, após ser vendido a privados. “Consignámos o edifício a um uso que consideramos estratégico: o de ser residência universitária. Poderão ser criadas condições de acolhimento para 300 estudantes naquele local”, esclareceu o presidente da câmara, Ricardo Rio, em conferência de imprensa realizada nos Paços do Concelho nesta quarta-feira.
Para alcançar esse objectivo, a maioria PSD-CDS/PP que lidera a autarquia elaborou um pedido de informação prévia (PIP) que enquadra as futuras intervenções nos 6.323 metros quadrados que congregam a antiga saboaria e o terreno contíguo, já aprovado e homologado pelo Conselho Nacional de Cultura – essa entidade abriu, em Novembro de 2018, o processo de classificação do edifício desenhado por José da Costa Vilaça.
Ao lado de Ricardo Rio, o responsável pela Divisão do Centro Histórico do município, Pedro Lopes, adiantou que a antiga fábrica, além de uma residência, vai também albergar um centro interpretativo ou museu da Fábrica Confiança, com 500 metros quadrados, e ainda espaços de restauração, de comércio e de apoio à residência. No terreno a norte, acrescentou, será construído um edifício com sete pisos acima do solo e dois pisos abaixo, para estacionamento (150 lugares), que vai acolher o grosso do alojamento. No espaço entre os dois edifícios, a autarquia prevê o restabelecimento da antiga Rua do Pulo, desactivada na sequência do crescimento da fábrica, durante o século XX.
O documento elaborado pela câmara indica ainda que as futuras intervenções têm de respeitar “todas as características arquitectónicas e patrimoniais existentes”, incluindo o troço da Via Romana XVII ali existente. Para Ricardo Rio, essa ideia vai além da recuperação das três fachadas e da chaminé, exigida pelo caderno de encargos apresentado em Setembro de 2018, quando a câmara aprovou a alienação da Confiança, revertendo a compra efectuada pelo município em Dezembro de 2012.
O autarca considera ainda que a residência universitária é a única opção capaz de preservar a Confiança enquanto “memória do passado industrial” de Braga, acabar com a “degradação” da zona e promover a ligação à Universidade do Minho – o campus de Gualtar dista cerca de 600 metros da antiga fábrica.
Num momento em que há “lacunas de habitação para os estudantes” e “interessados em construir residências”, acrescentou Rio, o PIP dá mais segurança aos investidores que tencionem comprar a antiga fábrica. Depois da suspensão das hastas públicas agendadas para 20 de Novembro de 2018 e 30 de Abril de 2019, o processo de alienação foi interrompido após as providências cautelares interpostas pela plataforma cívica Salvar a Fábrica Confiança, defensora de um centro cívico e cultural naquele espaço, e pelo Ministério Público, indeferidas em Junho e Julho do ano passado.
Ao condicionar o futuro uso do espaço, a câmara acabou por baixar a avaliação do imóvel de 3,87 para 3,65 milhões de euros. Essa alteração tem, contudo, de estar inscrita num novo caderno de encargos para a venda do imóvel, que terá de ser aprovado na próxima reunião do executivo municipal, segunda-feira, e na próxima reunião da assembleia municipal, dia 24 de Janeiro. A data da hasta pública só será conhecida a partir de meados de Fevereiro, admitiu Rio.
Cidadãos falam de “empreendimento de luxo”
Opositora à venda do edifício, a plataforma cívica Salvar a Fábrica Confiança considera que a decisão da autarquia possibilita aos promotores imobiliários transformarem aquele espaço num “empreendimento de luxo”, que crê inacessível para a maioria dos estudantes da Universidade do Minho. “A autarquia está a vender património municipal para que um promotor imobiliário facture milhões de euros por ano, criando a ilusão de que está a responder à procura de alojamento de estudantes”, reitera o movimento constituído por 20 associações de Braga.
Para a plataforma, o edifício de sete andares vai fazer subir os preços da habitação na cidade e, ao mesmo tempo, suprimir o último logradouro com potencial para servir de “espaço público” numa zona “intensivamente urbanizada” e conhecida por “vários negócios imobiliários questionáveis”, de São Vítor, a freguesia do concelho mais populosa (supera os 30.000 habitantes).