Cantor nacionalista e anti-sistema baralha contas nas presidenciais da Croácia
Poucos duvidavam de que a decisão final seria disputada pela actual Presidente, do centro-direita, e por um antigo primeiro-ministro do centro-esquerda. Mas a chave das eleições pode estar na candidatura de Miroslav Skoro, que pode surpreender na primeira volta deste domingo.
Há quase 20 anos que as eleições presidenciais na Croácia são decididas numa segunda volta, e a deste ano, cuja primeira fase decorre no domingo, não será diferente. Ainda assim, as sondagens indicam que pode estar em preparação uma mudança histórica: pela primeira vez, a esquerda arrisca-se a ficar sem um representante próprio na fase decisiva das eleições, e o próximo Presidente pode ser um cantor pop-folk nacionalista e anti-sistema, apoiado pela extrema-direita e tolerado por uma boa parte do centro-esquerda.
Ao contrário do que tem sido habitual desde as primeiras presidenciais na Croácia independente, em 1992, este ano há três candidatos com fortes possibilidades de passar à segunda volta, marcada para 5 de Janeiro.
A favorita nas sondagens é a actual Presidente, Kolinda Grabar-Kitarovic, do maior partido do centro-direita (União Democrática Croata, HDZ).
E é provável que a decisão final seja entre Grabar-Kitarovic e o antigo primeiro-ministro Zoran Milanovic, do maior partido croata do centro-esquerda (Partido Social Democrata, SDP).
Mas a entrada na corrida de Miroslav Skoro, de 57 anos, um famoso cantor croata que teve uma passagem curta pelo Parlamento como deputado do HDZ, em 2008, e que se apresenta agora como independente, nacionalista e anti-sistema, veio agitar a campanha e baralhar as contas.
Favorito na segunda volta?
Segundo as sondagens, o apoio a cada um dos três candidatos ronda os 25%, com Grabar-Kitarovic à frente, seguida de Milanovic e Skoro. Atrás surgem mais oito nomes, e só um deles passa a barreira dos 10%.
Nenhum candidato se aproxima dos 50% mais um voto, e é possível que as sondagens estejam a subvalorizar o peso de Miroslav Skoro. Se o candidato-cantor passar à segunda volta com a actual Presidente, por exemplo, as suas hipóteses de vitória dão um pulo. Segundo uma sondagem recente, citada pelo instituto Europe Elects, 60% dos eleitores do SDP admitem votar em Skoro se o seu candidato ficar para trás.
“A estratégia de Miroslav Skoro é conquistar os votos das pessoas que estão descontentes com o sistema político na Croácia, em particular com a liderança governamental do HDZ”, explica o jornalista croata Luka Ivan Jukic no site do Europe Elects.
“Isso deixa Grabar-Kitarovic numa posição difícil, já que ela é muito mais popular do que o seu partido, e é ainda mais popular do que as políticas do HDZ. Tal como Milanovic [do SPD], Skoro tem dito que um voto em Grabar-Kitarovic é um voto no primeiro-ministro, Andrej Plenkovic. Dito de outra forma, votar em Grabar-Kitarovic é apoiar o partido no Governo”, diz Luka Ivan Jukic.
Miroslav Skoro tem dedicado uma atenção especial à extrema-direita, o que levou a Presidente a radicalizar o seu discurso para tentar não perder apoios na ala mais à direita do seu partido. Como resultado, “nenhum dos candidatos abordou os assuntos mais quentes na Croácia de hoje em dia, da economia à emigração, do aborto aos direitos dos homossexuais”, diz a jornalista Anja Vladisavljevic, no site Balkan Insight.
“O que continua a motivar o debate é o passado – dos líderes fascistas da Croácia na II Guerra Mundial, ao papel do país na Jugoslávia socialista, à guerra da independência”, salienta a jornalista. Skoro, por exemplo, admite amnistiar o criminoso de guerra Tomislav Mercep, cuja unidade foi responsável pela tortura e assassínio de 43 civis em 1991.
O papel dos chefes de Estado na Croácia foi relegado para segundo plano numa revisão constitucional aprovada em finais de 2000, e desde o fim do sistema semipresidencialista é o primeiro-ministro o principal responsável pelas políticas do país. Mas essa mudança pode também estar em causa nas eleições deste domingo e de 5 de Janeiro. Se for eleito, Miroslav Skoro já prometeu que vai lutar “pela reestruturação de todo o sistema político”, em particular pelo reforço dos poderes presidenciais à imagem do que acontecia na época de Franjo Tudjman, o primeiro Presidente da Croácia.